Meu artigo sobre o fanatismo religioso, inspirado em Voltaire, despertou passionais reações, como era de se esperar. Seguidores do filósofo Olavo de Carvalho, em uma comunidade do Orkut, preferiram me xingar de adjetivos tão chulos que não vem ao caso repeti-los. Nivaldo Cordeiro escreveu um artigo também me atacando, como o título deixa claro: “O Bestialógico do Constantino”. Mas não atacou meus argumentos. Após algum tempo só de agressões na comunidade do Olavo, resolveram chamar o próprio “mestre”, e foi quando ele entrou também me agredindo, e apelando à autoridade o tempo todo, apenas repetindo que era impossível debater com um ignorante como eu. Agora, resolveu responder através de um artigo no seu site, o qual pretendo comentar brevemente aqui.
Antes disso, entretanto, creio ser útil para o leitor ter uma noção melhor do tipo de reação de Olavo, que garantiu não ter reagido de forma emocional, citando algumas de suas frases direcionadas à minha pessoa: “Pare de blefar, moleque idiota”; “Não dá para discutir com o ignorante completo”; “Será bom para mostrar aos demais que tipo de lixo falante é esse pirralho desprezível”; “É esse o merda que quer me ensinar a debater?”; “Não odeio uma casca de banana quando escorrego nela, nem um bostinha metido a intelectual quando o mando de volta para a escolinha maternal”. Esta é a postura adequada de um filósofo? Enquanto isso, Olavo diz que Karl Popper não é referência séria para a filosofia. Faz sentido. E não custa lembrar que fui colunista do Mídia Sem Máscara por muito tempo, site de Olavo. Estranho ele oferecer tanto espaço para um “bostinha”. Mas eis o efeito na mudança de opinião que a religião pode gerar.
Olavo disse que responderia aos absurdos históricos levantados por Voltaire, mas não o fez. Em seu lugar, preferiu desqualificar o autor, afirmando que sua obra é considerada por muitos um embuste. As citações de Voltaire, abordadas em meu artigo, permanecem sem resposta. Por exemplo: é ou não é questionável se Moisés de fato existiu? O que falam sobre ele não parece pura fantasia? Não existiam histórias similares na Arábia, que podem ter influenciado a dos judeus? Davi não cometeu mesmo os crimes citados? Não existe um Evangelho que poderia levar a crer que Jesus era filho de Mirja numa relação adúltera? É falso que consta um milagre atribuído a Cristo de expulsar os demônios para porcos numa região onde não existiam porcos? É mentira que os Evangelhos hoje considerados apócrifos eram citados pelos primeiros padres? Seria mentira que os exorcizados eram pessoas mais ignorantes e humildes, como ocorre hoje na Igreja Universal? Voltaire mente ao falar sobre o período de Diocleciano, onde os cristãos não foram perseguidos, ao menos no começo, e ainda criaram uma rica igreja? Constantino matou ou não sua própria mulher? Consta ou não nos relatos da Igreja como foi feita a escolha dos Evangelhos aceitos no Concílio de Nicéia? Enfim, quais das citações históricas de Voltaire são absurdas? Olavo não diz. Apenas desqualifica a obra inteira, sem especificar onde residem os erros.
Olavo discorda veementemente da minha afirmação de que a ciência pede para ser desafiada e refutada, como justamente ensina Popper, enquanto a religião costuma mandar aceitar com fé sem muitos questionamentos. Ele diz: “Desde os seus primórdios, a religião cristã sempre se abriu à discussão, como o evidenciam os escritos dos primeiros padres, quase todos eles compostos em resposta aos críticos da nova fé ou a divergências internas quanto ao seu significado”. Alguém consegue mesmo sustentar que é absurda a afirmação de que a ciência, mesmo com seus erros, é mais aberta às críticas que a religião? Alguém consegue imaginar cientistas em geral agindo da mesma forma que os crentes religiosos? É mesmo preciso responder essa inversão “olaviana” de que a religião é que pede críticas e questionamentos enquanto a ciência exige fé e boca calada?
Olavo não chega a defender a Inquisição, mas luta com afinco para justificá-la e reduzir suas atrocidades, afirmando que era normal ter um índice de livros proibidos (não vejo isso na ciência) e que heresia “significa uma doutrina não católica ou anticatólica pregada dentro da Igreja por alguém que continua a intitular-se membro dela e a desfrutar da sua proteção”. Ou seja, nada demais! Alguém consegue imaginar um cientista indo para a fogueira por questionar a teoria do “Big Bang”? Olavo diz: “Em termos quantitativos, a perseguição religiosa no Ocidente cristão não tem comparação possível com a sangueira desmedida inaugurada pela Revolução Francesa”. Ora, eu condeno ambos! Os jacobinos não têm qualquer semelhança com os verdadeiros liberais. Seus crimes inocentam os da Igreja? Notei que os aliados de Olavo insistiam o tempo todo em atrelar o ateísmo ao comunismo, e sempre que as barbaridades da Igreja vinham à tona, bastava acusar os ateus de crimes mais bárbaros ainda. Não creio que uma coisa justifique a outra, tampouco é razoável alguém associar todos os ateus aos comunistas. Os comunistas foram bárbaros porque eram comunistas, não por serem ateus. Essa falácia é tão absurda quanto condenar toda a fé religiosa por causa de Bin Laden. Dois pesos, duas medidas.
Por fim, Olavo diz que é possível debater o assunto religião somente com a mesma erudição dele, e profundo conhecimento. Pergunto então: por que tantos crentes são ignorantes? Esses sabem das coisas e podem debater o assunto? Na verdade, não importa o grau de leitura, certas perguntas podem e devem ser feitas por qualquer leigo, e merecem resposta. Se estas não existem, então o melhor é admitir a ignorância, mesmo com tanta erudição. Por exemplo: Jesus foi mesmo Deus em pessoa? Ora, como esperam provar isso? Se era o Messias, por que não podemos levar suas palavras ao pé da letra? Deus iria desejar confusão entre os homens, já que a ambigüidade de suas mensagens geraram tantas fações distintas de sua seita? Se existem diferentes interpretações para a Bíblia, então não é apenas a razão humana que irá determinar o correto? Como explicar as contradições do “livro sagrado” sem usar o livre-arbítrio humano? É crível que uma virgem realmente deu a luz a um filho de Espírito Santo? Fazer este tipo de questionamento não exige doutorado de teologia, apenas bom senso. E parece muita presunção assumir que a resposta é conhecida. Eis a postura de fanáticos. Os muçulmanos fundamentalistas também têm certeza de que encontraram a única verdade sobre o assunto. E ai de quem discordar...
Meu único interesse com o tema religioso é mantê-lo no seu devido lugar, ou seja, na esfera pessoal, no foro íntimo de cada um. Pois fé é algo subjetivo. E o perigo começa justamente quando alguns pensam que é algo objetivo, e que basta umas leituras para resolver de uma vez por todas as questões que atormentam a humanidade desde os primórdios. É uma perigosa arrogância. Como disse Mises, o Liberalismo limita sua preocupação exclusivamente com objetos desse mundo, enquanto o reino da religião é de outro mundo. Liberalismo e religião podem conviver lado a lado, pois o liberal proclama tolerância para qualquer crença religiosa. Isso leva à paz, que fica ameaçada justamente quando os crentes começam a tratar um tema tão subjetivo assim com presunçosa objetividade, alegando que apenas os ignorantes não enxergam as roupas do imperador. A reação passional de muitos admiradores de Olavo, e do próprio, apenas corrobora com isso. Foi uma grande decepção. Ainda que esperada, de certa forma. Como muitos sabem, Olavo já foi comunista. Pelo que me parece, ele trocou o deus, mas não mudou o fanatismo.
Antes disso, entretanto, creio ser útil para o leitor ter uma noção melhor do tipo de reação de Olavo, que garantiu não ter reagido de forma emocional, citando algumas de suas frases direcionadas à minha pessoa: “Pare de blefar, moleque idiota”; “Não dá para discutir com o ignorante completo”; “Será bom para mostrar aos demais que tipo de lixo falante é esse pirralho desprezível”; “É esse o merda que quer me ensinar a debater?”; “Não odeio uma casca de banana quando escorrego nela, nem um bostinha metido a intelectual quando o mando de volta para a escolinha maternal”. Esta é a postura adequada de um filósofo? Enquanto isso, Olavo diz que Karl Popper não é referência séria para a filosofia. Faz sentido. E não custa lembrar que fui colunista do Mídia Sem Máscara por muito tempo, site de Olavo. Estranho ele oferecer tanto espaço para um “bostinha”. Mas eis o efeito na mudança de opinião que a religião pode gerar.
Olavo disse que responderia aos absurdos históricos levantados por Voltaire, mas não o fez. Em seu lugar, preferiu desqualificar o autor, afirmando que sua obra é considerada por muitos um embuste. As citações de Voltaire, abordadas em meu artigo, permanecem sem resposta. Por exemplo: é ou não é questionável se Moisés de fato existiu? O que falam sobre ele não parece pura fantasia? Não existiam histórias similares na Arábia, que podem ter influenciado a dos judeus? Davi não cometeu mesmo os crimes citados? Não existe um Evangelho que poderia levar a crer que Jesus era filho de Mirja numa relação adúltera? É falso que consta um milagre atribuído a Cristo de expulsar os demônios para porcos numa região onde não existiam porcos? É mentira que os Evangelhos hoje considerados apócrifos eram citados pelos primeiros padres? Seria mentira que os exorcizados eram pessoas mais ignorantes e humildes, como ocorre hoje na Igreja Universal? Voltaire mente ao falar sobre o período de Diocleciano, onde os cristãos não foram perseguidos, ao menos no começo, e ainda criaram uma rica igreja? Constantino matou ou não sua própria mulher? Consta ou não nos relatos da Igreja como foi feita a escolha dos Evangelhos aceitos no Concílio de Nicéia? Enfim, quais das citações históricas de Voltaire são absurdas? Olavo não diz. Apenas desqualifica a obra inteira, sem especificar onde residem os erros.
Olavo discorda veementemente da minha afirmação de que a ciência pede para ser desafiada e refutada, como justamente ensina Popper, enquanto a religião costuma mandar aceitar com fé sem muitos questionamentos. Ele diz: “Desde os seus primórdios, a religião cristã sempre se abriu à discussão, como o evidenciam os escritos dos primeiros padres, quase todos eles compostos em resposta aos críticos da nova fé ou a divergências internas quanto ao seu significado”. Alguém consegue mesmo sustentar que é absurda a afirmação de que a ciência, mesmo com seus erros, é mais aberta às críticas que a religião? Alguém consegue imaginar cientistas em geral agindo da mesma forma que os crentes religiosos? É mesmo preciso responder essa inversão “olaviana” de que a religião é que pede críticas e questionamentos enquanto a ciência exige fé e boca calada?
Olavo não chega a defender a Inquisição, mas luta com afinco para justificá-la e reduzir suas atrocidades, afirmando que era normal ter um índice de livros proibidos (não vejo isso na ciência) e que heresia “significa uma doutrina não católica ou anticatólica pregada dentro da Igreja por alguém que continua a intitular-se membro dela e a desfrutar da sua proteção”. Ou seja, nada demais! Alguém consegue imaginar um cientista indo para a fogueira por questionar a teoria do “Big Bang”? Olavo diz: “Em termos quantitativos, a perseguição religiosa no Ocidente cristão não tem comparação possível com a sangueira desmedida inaugurada pela Revolução Francesa”. Ora, eu condeno ambos! Os jacobinos não têm qualquer semelhança com os verdadeiros liberais. Seus crimes inocentam os da Igreja? Notei que os aliados de Olavo insistiam o tempo todo em atrelar o ateísmo ao comunismo, e sempre que as barbaridades da Igreja vinham à tona, bastava acusar os ateus de crimes mais bárbaros ainda. Não creio que uma coisa justifique a outra, tampouco é razoável alguém associar todos os ateus aos comunistas. Os comunistas foram bárbaros porque eram comunistas, não por serem ateus. Essa falácia é tão absurda quanto condenar toda a fé religiosa por causa de Bin Laden. Dois pesos, duas medidas.
Por fim, Olavo diz que é possível debater o assunto religião somente com a mesma erudição dele, e profundo conhecimento. Pergunto então: por que tantos crentes são ignorantes? Esses sabem das coisas e podem debater o assunto? Na verdade, não importa o grau de leitura, certas perguntas podem e devem ser feitas por qualquer leigo, e merecem resposta. Se estas não existem, então o melhor é admitir a ignorância, mesmo com tanta erudição. Por exemplo: Jesus foi mesmo Deus em pessoa? Ora, como esperam provar isso? Se era o Messias, por que não podemos levar suas palavras ao pé da letra? Deus iria desejar confusão entre os homens, já que a ambigüidade de suas mensagens geraram tantas fações distintas de sua seita? Se existem diferentes interpretações para a Bíblia, então não é apenas a razão humana que irá determinar o correto? Como explicar as contradições do “livro sagrado” sem usar o livre-arbítrio humano? É crível que uma virgem realmente deu a luz a um filho de Espírito Santo? Fazer este tipo de questionamento não exige doutorado de teologia, apenas bom senso. E parece muita presunção assumir que a resposta é conhecida. Eis a postura de fanáticos. Os muçulmanos fundamentalistas também têm certeza de que encontraram a única verdade sobre o assunto. E ai de quem discordar...
Meu único interesse com o tema religioso é mantê-lo no seu devido lugar, ou seja, na esfera pessoal, no foro íntimo de cada um. Pois fé é algo subjetivo. E o perigo começa justamente quando alguns pensam que é algo objetivo, e que basta umas leituras para resolver de uma vez por todas as questões que atormentam a humanidade desde os primórdios. É uma perigosa arrogância. Como disse Mises, o Liberalismo limita sua preocupação exclusivamente com objetos desse mundo, enquanto o reino da religião é de outro mundo. Liberalismo e religião podem conviver lado a lado, pois o liberal proclama tolerância para qualquer crença religiosa. Isso leva à paz, que fica ameaçada justamente quando os crentes começam a tratar um tema tão subjetivo assim com presunçosa objetividade, alegando que apenas os ignorantes não enxergam as roupas do imperador. A reação passional de muitos admiradores de Olavo, e do próprio, apenas corrobora com isso. Foi uma grande decepção. Ainda que esperada, de certa forma. Como muitos sabem, Olavo já foi comunista. Pelo que me parece, ele trocou o deus, mas não mudou o fanatismo.