sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

Ruy Castro: Gente Fina

Uma das benesses do poder é a de refinar seus ocupantes. Por mais agrestes de origem, são obrigados a aprender a usar garfo e faca, não palitar os dentes e evitar coçar partes íntimas na presença de senhoras. Lula, por exemplo, saltou das assembleias de sindicatos para as noites de gala em Brasília, Washington e Caracas. Mas se deu bem porque teve um belo estágio intermediário: as reuniões que a burguesia paulistana lhe oferecia nos anos 80.

Foi numa delas que Lula aprendeu sobre o Romanée-Conti, o tinto francês de que só se produzem 6.000 garrafas por ano, e que, depois, ele foi visto mais de uma vez tomando num restaurante do Rio. Seus charutos vêm de Havana, de uma reserva especial destinada ao comandante Fidel. E só se pode especular sobre a reforma de R$ 700 mil que a ex-primeira-dama, dona Marisa Letícia, ia fazer no triplex de praia do casal no Guarujá –o apartamento teve de ser abandonado às pressas.

Esse refinamento é contagioso. O dinheiro subitamente disponível permite até aos segundos escalões adquirir novos gostos, sob os quais passam a se reger. A Operação Lava Jato tem revelado um frenesi de mimos de empreiteiros para atuais e ex-ministros do governo na forma de lenços e gravatas Hermès, conhaques Hennessy Paradis e vinhos como o Haut-Brion, o Lafitte-Rothschild e o Latour. Os lulopetistas também usam black-tie, qual é o problema?

Delcídio do Amaral, ex-líder do governo no Senado e ardente militante do nouveau-richisme, habituou-se a comemorar os aniversários da família com festas para 500 convidados em Ibiza, em Punta del Este e no Copacabana Palace. A exemplo de José Dirceu e Henrique Pizzolato, ele aprendeu a valorizar as coisas boas da vida.

Mas onde esses heróis do povo brasileiro capricham mesmo é na escolha de seus advogados. Só aceitam os mais caros do país.


quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

Nima Gholam Ali Pour: Um smorgasbord de antissemitismo sueco

Nima Gholam Ali Pour é membro do Conselho de Educação na cidade sueca de Malmö e participa de diversos institutos interdisciplinares de estudos relacionados com o Oriente Médio. Gholam Ali Pour também é editor do Website social conservador Situation Malmö.
Publicado no site do The Gatestone Institute.
Tradução: Joseph Skilnik

Uma turba de árabes em Malmö arremessa garrafas, ovos e bombas de fumaça contra uma manifestação pacífica de judeus, em janeiro de 2009. A polícia ordenou aos judeus, que tinham permissão para a realização do comício, que se dirigissem para uma viela.

Uma manifestação contra o racismo estava marcada para o dia 9 de novembro na cidade de Umeå, Suécia, para lembrar a Noite dos Cristais (a noite de 1938 em que 400 judeus foram assassinados na Alemanha e 30.000 judeus do sexo masculino foram enviados a campos de concentração). Só que havia um pequeno detalhe: os judeus da Umeå não foram convidados para a manifestação. A razão disto, de acordo com Jan Hägglund, um dos organizadores do evento, é que a manifestação poderia causar "mal estar ou provocar uma situação de insegurança para eles".

O caminho para este cenário surrealista, em que uma manifestação contra o racismo na Suécia para lembrar a Noite dos Cristais poderia ser entendida pelos judeus como uma ameaça, vem tomando forma há muito tempo. A manifestação tinha certa importância. As pessoas por trás dela não eram extremistas. Quatro dos oito partidos do parlamento sueco participaram da organização do evento.

Essa manifestação anti-racista e os estranhos incidentes que ocorreram em volta dela são frutos de um processo que, lamentavelmente, estão se avolumando há muito tempo na Suécia. Um novo tipo de antissemitismo sueco está ganhando força e a cidade de Malmö é o carro-chefe.

Em janeiro de 2009, uma demonstração pró-Israel em Malmö foi atacada por árabes que gritavam "f****-se judeus". Os policiais não foram capazes de proteger os manifestantes pró-Israel dos ovos e garrafas arremessados contra eles. O evento teve que ser temporariamente interrompido quando os árabes começaram a lançar fogos de artifício contra os manifestantes pró-Israel.

Em 2010, foi a primeira vez, mas não a última, que a sinagoga de Malmö foi atacada. Naquele mesmo ano o Centro Simon Wiesenthal alertava os judeus a não visitarem a cidade de Malmö, "devido a hostilidade contra os cidadãos judeus.

Hoje Malmö é uma cidade conhecida pelo seu antissemitismo e caracterizada por ele. Os judeus de Malmö não podem mostrar publicamente que são judeus sem que sejam molestados. Muitas famílias que lá residiam há séculos, abandonaram a cidade. Em outubro de 2015 dois membros do parlamento sueco participaram de uma manifestação pró-palestina em Malmö, onde as pessoas gritavam palavras de ordem antissemitas e enalteciam os ataques com facas perpetrados pelos palestinos contra judeus israelenses.

A razão pela qual um país como a Suécia ter, de repente, sido assolada por um antissemitismo extremo é em grande parte graças à imigração do Oriente Médio. O mundo árabe e muçulmano e, desde 1979 também a República Islâmica do Irã, que vem ameaçando repetidamente os judeus com genocídio, continua a demonizá-los na mídia estatal. O mundo árabe e muçulmano querem provavelmente, em parte, justificar seu conflito com Israel. E também em parte porque muitos membros do establishment e cidadãos desses países provavelmente acreditam nessas teorias da conspiração antissemitas, calunias repetidas todo santo dia na mídia e nas mesquitas.

Muitos dos recém-chegados continuam mantendo seu background do Oriente Médio mesmo depois de terem estabelecido residência na Suécia. Muitos, principalmente aqueles que se estabeleceram em regiões predominantemente de imigrantes como Rosengård em Malmö, assistem com frequência a mídia árabe, que transmite ininterruptamente mensagens antissemitas.

Ao mesmo tempo, membros dessa população são convidados a votarem nas eleições suecas, de modo que os partidos suecos dão atenção ao voto árabe. Essa mesura é meramente uma questão de logística. Há menos de 20.000 judeus na Suécia, mais de 20.000 sírios receberam o status de asilados somente em 2014.

Fora isso, não é nem necessário ser cidadão sueco para votar nas importantes eleições municipais da Suécia. É por conta dessa peculiaridade que tão poucos suecos se aventuram a falar sobre antissemitismo árabe, apesar das diversas denúncias e documentários que mostram que o crescimento do antissemitismo foi, em grande medida, importado do Oriente Médio.

É também por essa razão que a maioria das organizações antiracistas na Suécia prefere falar de "islamofobia". Praticamente todas as organizações antiracistas da Suécia são financiadas pelos contribuintes ou de alguma forma ligadas a partidos políticos, indicando que há um "entendimento" de compadrio entre partidos políticos e organizações antirracistas. A maioria dos partidos políticos não veem exatamente com bons olhos organizações antirracistas que falam de antissemitismo árabe. Essas organizações terão problemas em angariar fundos ou perderão financiamento ou então verão membros do conselho administrativo renunciarem.

Apesar de mais muçulmanos estarem ingressando e mais judeus estarem saindo da Suécia, ou justamente por esta razão, a maioria dos ativistas antiracismo na Suécia considera a "islamofobia" o problema mais sério. A influente organização anti-racismo Expo confeccionou uma série de mapeamentos da "islamofobia", mas apesar do preconceito, não fez um único mapeamento do antissemitismo.

Se for confeccionado um mapeamento do antissemitismo na Suécia, então também será necessário falar sobre a imigração do Oriente Médio. Não há muitas pessoas na Suécia dispostas a falar sobre isso: aqueles que falam sobre o antissemitismo árabe são chamados de racistas.

Em vez de falar sobre o novo antissemitismo sueco, o que se vê são artigos que entorpecem a mente com a mensagem de que as pessoas deviam falar menos sobre o Holocausto nas escolas suecas, para não ofenderem os adolescentes árabes. Ao desaprovar uma proposta do governo para combater o antissemitismo aprofundando a educação sobre o Holocausto, Helena Mechlaoui, uma professora de história, religião e filosofia do ensino médio assinalou:

"Se falamos sobre estudantes do Oriente Médio, pode ser que falamos porque muitos deles passaram por experiências traumáticas relacionadas com as políticas de Israel ou dos Estados Unidos. Não é raro ver os dois países como um só, o que não está totalmente errado. Eles podem ter perdido um ou mais irmãos, primos, pais ou colegas em um bombardeio israelense ou americano. Uma grande proporção deles está aqui na Suécia porque foi obrigada a deixar seus lares por causa da ocupação, guerra ou miséria em algum campo de refugiados. Seus pais podem estar feridos e não terem como enfrentar a vida, eles ainda podem ter familiares nas áreas de conflito. É bem provável que eles tenham encontrado hostilidade na Suécia. Nesse contexto talvez seja melhor não falar sobre o Holocausto".

A imigração dos países árabes afetou profundamente a maneira pela qual a maioria dos suecos vê o antissemitismo. O antissemitismo não é mais algo que a sociedade sueca condena. Várias celebridades suecas fizeram declarações antissemitas sem que isso afetasse negativamente um tiquinho sequer da carreira deles. Dani M, artista sueco do rapdissemina teorias da conspiração antissemitas tanto nas redes sociais quanto em suas músicas. Depois que diversos veículos de mídia suecos, no final de 2014 e início de 2015, descreveram detalhadamente como Dani M dissemina teorias da conspiração antissemitas, ele apareceu em um reality show em setembro, em um dos maiores e mais consagrados canais de TV da Suécia, a TV4. Quando a TV4 foi criticada, o produtor executivo do programa Christer Andersson respondeu o seguinte:

"Os valores fundamentais da TV4 são Zero Racismo e sempre foi assim, desde que eu me entendo por gente, mas não podemos tolher as pessoas que não pensam assim. A TV4 é um portal onde se apresentam pessoas com as mais variadas opiniões e nós temos que ter uma ampla gama de aceitação".

Aqui temos um dos veículos de mídia mais importantes da Suécia descrevendo o antissemitismo simplesmente como uma "diferença de opinião". Nessa mesma época, uma funcionária da TV4 fez uso da "palavra N" em um clip do YouTube e foi demitida dois meses depois. Quer dizer, antissemitismo é aceitável, mas racismo contra afro-suecos não.

Em um outro exemplo, a celebridade da TV sueca Gina Dirawi de origem palestina, publicou em seu blog em 2010 que as ações de Israel podem ser comparadas às ações de Hitler. Depois em 2012 ela aconselhou as pessoas, novamente em seu blog, a lerem um livro que questionava a existência do Holocausto. A mensagem do livro era a de que quando os nazistas perseguiam os judeus eles agiam em legítima defesa. Estas foram apenas duas das muitas declarações antissemitas feitas por ela em seu blog. Hoje Gina Dirawi apresenta vários programas na SVT, a emissora pública de rádio e televisão da Suécia, inclusive ela apresentou o programa de Natal da SVT em 2015. Isso causou certa surpresa considerando-se que Dirawi é muçulmana. Ela também irá apresentar o concurso de música sueco Melodifestivalen de 2016, um dos mais consagrados eventos musicais da Suécia.

Infelizmente não deixa nenhuma margem de dúvida o fato de que na Suécia o antissemitismo não é algo que vá prejudicar a carreira de alguém. A mídia sueca, assim como o governo sueco, também não estão tão interessados em relação aos problemas da Suécia com o antissemitismo. Quando o instituto interdisciplinar de estudos Perspektiv På Israel apresentou evidências em maio de 2015 que o diretor do Islamic Relief na Suécia estava disseminando posts antissemitas no Facebook, ninguém se interessou em escrever sobre esse assunto, não obstante o fato do Islamic Relief receber apoio da Sida, a agência governamental sueca responsável pela ajuda oficial da Suécia aos países em desenvolvimento.

A mídia sueca nem ao menos permitiu que um editorial do Perspektiv På Israel sobre o assunto fosse publicado. Nyheter24, um dos veículos de mídia sueca que não publicou a matéria do Perspektiv På Israel sobre esse escândalo, enviou um email para o Perspektiv På Israel dizendo que seus "leitores não estão interessados nesse assunto em particular, isso para dizer o mínimo".

Como colunista do jornal Samtiden, eu mencionei as declarações racistas do Islamic Relief em um artigo opinativo e as informações também foram publicadas no The Jewish Press. A mídia sueca não demonstrou nenhum interesse, muito embora houvesse evidências que uma organização que recebia fundos pagos com impostos suecos estivesse publicando matérias antissemitas nas redes sociais.

É importante salientar que todos esses incidentes ocorreram em um país onde o uso do termo "imigração em massa" normalmente é censurado simplesmente por soar racista. Somente o antissemitismo não é criticado na Suécia. Todas as outras formas de racismo, até mesmo aquelas que alguns dizem poderiam ser consideradas racistas, são criticadas e de maneira implacável.

Muito embora o novo antissemitismo na Suécia tenha suas origens no antissemitismo árabe ou muçulmano, acreditar que o antissemitismo de hoje na Suécia é puramente oriundo do Oriente Médio é ser simplista demais. O antissemitismo na Suécia virou um smorgasbord composto por uma série de fatores que se reforçam mutuamente. Alguns desses fatores são os seguintes:

imigração em larga escala de países onde o antissemitismo faz parte do cotidiano.
engajamento fortemente pró-palestino entre os políticos suecos que teve como consequência um debate totalmente surrealista em relação à questão israelense-palestina, na qual Israel é injustamente demonizado.
o desejo dos partidos políticos suecos de conquistarem os votos dos imigrantes.
o multiculturalismo sueco é tão sem reservas em relação às culturas estrangeiras que não é capaz de diferenciar cultura de racismo.
medo de parecer contrário à imigração.
importantes instituições suecas, como a Igreja da Suécia que legitima o antissemitismo ao endossar o documento Kairos da Palestina.
A conjunção desses fatores cria um ambiente no qual o antissemitismo tem condições de crescer sem encontrar nenhuma resistência ou crítica. O que vem a seguir aconteceu em Komvux, em um programa educacional para adultos na Suécia, na cidade de Helsingborg: um professor substituto estava sustentando fatos sobre o Holocausto durante uma aula depois que um estudante perguntou se o Holocausto realmente aconteceu. A administração da escola desaprovou a conduta do professor substituto com os seguintes argumentos: "o que é história para nós não é a história de outros. ... Quando temos outros estudantes que estudaram em outros livros de história, não há razão para discutirmos fatos contra fatos".

Isso aconteceu em fevereiro de 2015, em uma importante cidade sueca. Isso poderia ter acontecido em qualquer cidade sueca onde o novo antissemitismo sueco está avançando. Uma escola sueca já não sabe mais se o fato do Holocausto ter realmente ocorrido é um fato que vale a pena defender. O smorgasbord antissemita torna aceitável o antissemitismo na Suécia.

Quando foi noticiado em meados de novembro que a Ministra das Relações Exteriores da Suécia Margot Wallström, disse: "os judeus estão fazendo uma campanha contra mim", isso não se tornou uma notícia importante na Suécia. Esta não foi a primeira vez que uma figura política de destaque na Suécia fez declarações antissemitas e não deu em nada e também não será a última.

Voltemos então ao dia 9 de novembro de 2015 em Umeå e à manifestação contra o racismo para lembrar a Noite dos Cristais para a qual os judeus não foram convidados, e para a apresentadora muçulmana do Natal deste ano que diversas vezes expressou pontos de vista antissemitas, e para as escolas que não têm certeza se devem ou não dizer que o Holocausto realmente aconteceu, e para um país onde passou a fazer parte da rotina do dia-a-dia não convidar judeus.

A mídia não faz reportagens sobre isso. Os políticos não dão a mínima. E todo mundo sabe que na Suécia os antissemitas se safam de tudo.