quinta-feira, 17 de setembro de 2015

Roberto Campos: Petrossauro (1999)

Quando for escrita a história econômica do Brasil nos últimos 50 anos, várias coisas estranhas acontecerão. A política de autonomia tecnológica em informática, dos anos 70 e 80, aparecerá como uma solene estupidez, pois significou uma taxação da inteligência e uma subvenção à burrice dos nacionalistas e à safadeza de empresários cartoriais. Campanhas econômico-ideológicas como a do “o petróleo é nosso” deixarão de ser descritas como uma marcha de patriotas esclarecidos, para ser vistas como uma procissão de fetichistas anti-higiênicos, capazes de transformar um líquido fedorento num ungüento sagrado. Foi uma “passeata da anti-razão” que criou sérias deformações culturais, inclusive a propensão funesta às “reservas de mercado” .

A criação do monopólio estatal de 1953 foi um pecado contra a lógica econômica. Precisamente nesse momento, o ministro da Fazenda, Oswaldo Aranha, mendigava um empréstimo de US$ 300 milhões ao Eximbank, para cobertura de importações correntes (inclusive de petróleo). A ironia da situação era flagrante: de um lado, o país mendigava capitais de empréstimos que agravariam sua insolvência, de outro, pela proclamação do monopólio estatal, rejeitava capitais voluntários de risco. Ao invés de sócios complacentes (cuja fortuna dependeria do êxito do país), preferíamos credores implacáveis (que exigiriam pagamento, independentemente das crises internas). Esse absurdo ilogismo levou Eugene Black, presidente do Banco Mundial, a interromper financiamentos ao Brasil durante cerca de dez anos (com exceção do projeto hidrelétrico de Furnas, financiado em 1958). Houve outros subprodutos desfavoráveis.

Criou-se uma cultura de “reserva de mercado”, hostil ao capitalismo competitivo. Surgiu uma poderosa burguesia estatal que, protegida da crítica e imune à concorrência, acumulou privilégios abusivos em termos de salários e aposentadorias.

Criou-se uma falsa identificação entre interesse da empresa e interesse nacional, de sorte que a crítica de gestão e a busca de alternativas passaram a ser vistas como traição ou impatriotismo.

Vistos em retrospecto, os monopólios estatais de petróleo, que se expandiram no Terceiro Mundo nas décadas de 60 e 70, longe de representarem um ativo estratégico, tornaram-se um cacoete de países subdesenvolvidos na América Latina, África e Médio Oriente. Nenhum país rico ou estrategicamente importante, nem do Grupo dos 7 nem da OCDE, mantém hoje monopólios estatais, o que significa que os monopólios não são necessários nem para a riqueza nem para a segurança estratégica.

Essas considerações me vêm à mente ao perlustrar os últimos relatórios da Petrossauro. Ao contrário de suas congêneres terceiro-mundistas, que são vacas-leiteiras dos respectivos Tesouros, a Petrossauro sempre foi mesquinha no tratamento do acionista majoritário. Tradicionalmente, a remuneração média anual do Tesouro, sob a forma de dividendos líquidos, não chegou a 1% sobre o capital aplicado. Após a extinção de jure do monopólio, em 1995 (ele continua de facto), e em virtude da crítica de gestão e da pressão do Tesouro falido, os dividendos melhoraram um pouco, ma non troppo.

Muito mais generoso é o tratamento dado pela Petrossauro à Fundação Petros, que representa patrimônio privado dos funcionários.

A empresa é dessarte muito mais um instituto de previdência, que trabalha para os funcionários, do que uma indústria lucrativa, que trabalha para os acionistas. Aliás, é duvidoso que a Petrossauro seja uma empresa lucrativa. Lucro é o resultado gerado em condições competitivas. No caso de monopólios, é melhor falar em resultados.Quanto à Petrossauro, se fosse obrigada a pagar os variados tributos que pagam as multinacionais aos países hospedeiros-bônus de assinatura, royalties polpudos, participação na produção, Imposto de Renda e importação-teria que registrar prejuízos constantes, pois é alto seu custo de produção e baixa sua eficiência, quer medida em barris/dia por empregado, quer em venda anual por empregado.

Examinados os balanços de 1995 a 1998, verifica-se que o somatório dos dividendos ao Tesouro (pagos ou propostos) alcançam R$ 1,606 bilhão enquanto que as doações à Petros atingiram 2,054 bilhões.

Considerando que o Tesouro representa 160 milhões de habitantes e vários milhões de contribuintes, enquanto que a burguesia do Estado da Petrossauro é inferior a 40 mil pessoas, verifica-se que é o contribuinte que está a serviço da estatal e não vice- versa.

Nota-se hoje no Governo uma perigosa tendência de postergação das privatizações seja na área de petróleo, seja na área financeira, seja na eletricidade. É um erro grave, que põe em dúvida nosso sentido de urgência na solução da crise e nossa percepção dos remédios necessários. A privatização não é uma opção acidental nem coisa postergável, como pensam políticos irrealistas e burocratas corporativistas. É uma imposição do realismo financeiro. Há duas tarefas de saneamento imprescindíveis. A primeira consiste em deter-se o “fluxo” do endividamento (o objeto mínimo seria estabilizar-se a relação endividamento/PIB). Essa é a tarefa a ser cumprida pelo ajuste “fiscal”.

A segunda consiste em reduzir-se o estoque da dívida. Esse o objetivo da reforma “patrimonial”, ou seja, a “privatização”.

Não se deve subestimar a contribuição potencial da reforma patrimonial para a solução de nosso impasse financeiro.

Tomemos um exemplo simplificado.

Apesar da crise das Bolsas, a venda do complexo Petrossauro-BR Distribuidora poderia gerar uma receita estimada em R$ 20 bilhões.

Considerando-se que a rolagem da dívida está custando ao Tesouro 40% ao ano, uma redução do estoque em R$ 20 bilhões, representaria uma economia a curto prazo de R$ 8 bilhões. Isso equivale a aproximadamente 20 anos dos dividendos pagos ao Tesouro pela Petrossauro na média do período 1995-1998 (a média anual foi de R$ 401,7 milhões).

Se aplicarmos o mesmo raciocínio à privatização de bancos estatais e empresas de eletricidade, verificaremos que a solvência brasileira dificilmente será restaurada pela simples reforma fiscal. Terá que ser complementada pela reforma patrimonial.

É perigosa complacência a atitude governamental de que a reforma fiscal é urgente e a reforma patrimonial postergável. É dessas complacências e meias medidas que se compõe nossa lamentável, repetitiva e humilhante crise existencial.

domingo, 13 de setembro de 2015

Rodrigo Constantino: A crise é algo deliberado por parte da esquerda revolucionária golpista?

Alguns leitores meus começaram a alegar que faço parte do time dos ingênuos que ainda não compreendeu que toda essa crise era prevista e faz parte de uma estratégia da esquerda revolucionária golpista. Ou seja, não seria resultado de incompetência, e sim parte dos planos diabólicos dessa esquerda global para a sua perpetuação no poder e a destruição da civilização ocidental. Como o número de leitores que pensam assim não é tão insignificante, creio que mereçam uma resposta aqui.

Essa ala da direita adora teorias conspiratórias, enxerga comunista em todo lugar e adota o pensamento dialético, mesma arma usada ironicamente pela esquerda que combate. O raciocínio dialético é útil pois pode estar sempre certo, vale em todas as ocasiões. Se a esquerda golpista governa numa fase de bonança, distribuindo esmolas estatais e crédito farto, então isso é parte de sua estratégia de poder; se a economia vira, a crise se instaura e caímos na estagflação, tudo também é parte da mesma estratégia de poder. Cara eu ganho, coroa você perde.

Torna-se impossível refutar um raciocínio dialético desses, pois qualquer coisa que ocorra faz parte dos planos maquiavélicos do inimigo. Se ele vai para um lado, isso prova que ele pertence àquele lado; mas se ele vai para o outro, isso apenas prova que ele usa essa falsa migração para fortalecer aquele primeiro lado. A tal esquerda globalizante está por toda parte, e tudo foi milimetricamente ensaiado por ela na dança do poder.

Entra nessa visão de mundo o papel do PSDB, por exemplo, que seria apenas um instrumento na estratégia das tesouras da mesma esquerda global, talvez com George Soros dando as cartas lá de cima. O tucanato deixa de ser pusilânime, uma “oposição” acovardada por ter algum grau de simpatia pela trajetória petista e por ser também de esquerda, e passa a ser conivente propositalmente com os planos da esquerda global. Se alguns tucanos intensificarem o tom e a reação ao PT, não adianta: tudo foi ensaiado antes e é parte da conspiração.

Teorias conspiratórias seduzem pelo simplismo com o qual “explicam” o mundo complexo. Tudo se encaixa nesse modelo binário, maniqueísta, e toda a complexidade do mundo é deixada de lado. Umberto Eco tem escrito ótimos livros sobre o assunto, como O cemitério de Praga, que citei nesse texto sobre o encanto das teorias conspiratórias. Os “judeus” para os nazistas são os “comunistas” para essa direita, e tudo é imputado a eles. E se você discordar de uma vírgula, cuidado, pois você também se tornará um “agente de desinformação” do lado inimigo!

Vejam bem: acredito numa esquerda global, mas que seria muito menos organizada do que essa ala da direita imagina. Sei da existência do Foro de São Paulo, que simboliza mais essa união de bolivarianos latino-americanos do que efetivamente um palco de decisões golpistas arquitetadas às escuras. Similis símili gaudet: os semelhantes regozijam-se entre si. A escória é atraída pela escória. Irã se junta a Putin que se une aos caudilhos bolivarianos. O mundo sempre foi assim.

O que não compro é a tese de que todos os acontecimentos derivam dessas conversas conspiratórias e secretas. O mundo, como já disse, é bem mais complexo que isso. E a crise, se pode por um lado ser usada pela própria esquerda para avançar mais sobre nossas liberdades, também pode representar um enorme risco no projeto de permanência no poder dessa esquerda. Que, aliás, não custa lembrar, é formada por indivíduos com seus próprios interesses, muitas vezes conflitantes. Vide as delações premiadas de membros da quadrilha.

Logo, a crise ameaça o projeto de poder desses esquerdistas, e serve como oportunidade para movimentos de oposição. O próprio crescimento da nova direita brasileira é prova disso. Seria tudo orquestrado pela esquerda global? Sério? Quem estaria por trás disso tudo então? Pois se Dirceu, Lula e companhia têm alguma representatividade na célula brasileira, fica claro que não estão felizes com os acontecimentos. Lula anda desesperado, com medo de ser preso, e Dirceu já está no xilindró. Quem, então, usaria até esses líderes da esquerda nacional como simples peões sacrificáveis para seus grandiosos e ultra-secretos projetos?

Não, meus caros, a crise não era desejada pela esquerda revolucionária golpista. Ela pode, ao contrário, sepultar seu projeto ambicioso de poder. Ela pode colocar seus líderes atrás das grades. Ela pode destruir o PT, sem que isso represente crescimento expressivo para o PSOL, sua “linha auxiliar”. Ela tem permitido o avanço de um Ronaldo Caiado da vida, com discurso mais liberal. Ela tem impulsionado vários movimentos liberais e conservadores, para o pânico da esquerda. E isso tudo seria algo deliberado, parte esperada de um plano mirabolante qualquer?

Hoje mesmo há uma reportagem no GLOBO questionando qual o futuro do PT, e mostrando que o partido deve minguar, perder capilaridade e sair bem menor das próximas eleições. Podem acreditar: não era isso que os petistas queriam, tampouco a esquerda em geral, mesmo a “globalista”. A turma é golpista sim, mas é também incompetente, e seus equívocos ideológicos, assim como sua obstinação asinina, causaram esse caos econômico que coloca em xeque sua permanência no poder. Seu único projeto era ficar no poder, e a crise pode destruir esse sonho.

Portanto, menos simplismo na análise, menos teoria conspiratória, e menos dialética que serve para justificar tudo como parte de uma engrenagem maior voltada justamente para seus objetivos finais. A realidade é mais complexa, e também mais prosaica muitas vezes. A crise não foi produzida de propósito por revolucionários golpistas numa sala no Palácio da Injustiça; ela é resultado de muita roubalheira, de muita incompetência, e será a pá de cal do projeto totalitário petista.


PS: Sei que muitos dessa ala da direita são seguidores de Olavo de Carvalho, e esse tipo de mentalidade sempre foi uma das maiores críticas que fazia (e faço) ao filósofo. Continuo com meu projeto de união da direita toda (e de parte da esquerda civilizada também) contra um inimigo maior, e essa estratégia está simbolizada na minha campanha do Panaceia, meu primeiro livro de ficção em que há essa união tática contra o inimigo maior. Mas não posso deixar de expressar o que penso sobre o assunto, até porque julgo que essa teoria conspiratória em nada ajuda na luta contra o PT.

quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Reinaldo Azevedo: Depois de ajudar a quebrar o Brasil, Lula quer espalhar suas jumentices América Latina afora!

Ou: O cafetão dos pobres

É incrível! Não bastou a Lula ser o mentor intelectual — santo Deus! como essas palavras não combinam associadas a esse ogro da ética! — de um modelo que quebrou a economia brasileira. Não bastou a Lula ter transformado em consumo e em cocô, em seu próprio país, uma janela de oportunidades que poderia ter sido, de fato, o passaporte de milhões para a uma vida melhor; não bastou a Lula ter feito de suas jumentices, em terras nativas, uma categoria de pensamento, com o anuência de setores do empresariado movidos ou por cupidez específica ou por burrice genérica. Ele quer levar adiante o seu legado. Agora ele sai dando conselhos energúmenos América Latina afora.

No Brasil, ninguém mais quer ouvir um dos principais beneficiários de sistema tão iluminado. Sim, o modo que Lula descobriu de governar criou o desenvolvimento sustentado e a riqueza de longuíssimo prazo para os Lula da Silva, por exemplo. Ele próprio, só em palestras, faturou R$ 27 milhões em quatro anos. Isso é que é crescimento de patrimônio sem precedentes! E notem que não me apego a informações não confirmadas sobre sinais exteriores de riqueza dele próprio e da família. Fico com o que está declarado. Por aqui, Lula é carta fora do baralho, é página virada, é morto que anda, é zumbi.

Mas, ora vejam!, o homem está participando ativamente da campanha eleitoral na Argentina. Empresta seu apoio a Daniel Scioli, o candidato de Cristina Kirchner à sua sucessão. Não por acaso, também a Beiçola de Buenos Aires empurra a economia de seu país para a inviabilidade, mobiliza milícias truculentas contra a imprensa, está atolada em escândalos, enriqueceu notavelmente no poder…

Fosse pouco, seu governo tem nas costas uma suspeita bastante verossímil de assassinato. Refiro-me, claro!, ao promotor Alberto Nisman, que investigava a participação do governo no esforço de esconder as evidências de que o Irã estava por trás do atentado contra a sede da Associação Mutual Israelita Argentina (Amia), em 1994, quando uma explosão deixou 85 mortos e provocou danos estruturais em outros 9 edifícios no bairro Once. Adiante.

Lula foi falar porcaria também no Paraguai. Durante um evento, nesta terça, naquele país, comemorando os 10 anos do programa Tekoporã, que distribui subsídios a 600 mil pessoas por meio de um cartão, afirmou que o combate à pobreza deve ter prioridade sobre os investimentos em infraestrutura. Jogou ao vento, entre outras teorias relinchantes, o que segue:

“É verdade que eu poderia fazer uma ponte, uma estrada, mas entre cuidar de 54 milhões de pessoas que estão passando fome e fazer uma estrada, a estrada pode esperar que essas pessoas comam, fiquem fortes e ajudem a construí-la. Se fizesse a estrada, essas pessoas morreriam de fome antes de vê-la terminada. É muito difícil encontrar alguém no setor de Fazenda ou Tesouro que esteja disposto a dar essa contribuição aos que estão abaixo. Não é uma política de esmola, de compensação, é um direito”.

Disse mais: “Antes de eu chegar à Presidência, os pobres eram tratados como se fossem problemas. E hoje eu digo que cuidar bem dos pobres é a solução para acabar com a miséria na nossa América do Sul”.

É uma soma formidável de mentira com estupidez. Em primeiro lugar, não havia 54 milhões de famintos no Brasil quando ele chegou à Presidência. A fome já era um problema residual — como é ainda hoje, nos grotões. Em segundo lugar, programas sociais do governo Fernando Henrique Cardozo, que Lula tomou para si, atendiam cinco milhões de famílias. Em terceiro lugar, o seu pensamento é a expressão do lixo intelectual que inviabiliza países mundo afora, conduzidos por esquerdistas ou populistas.

Não há contradição nenhuma entre investir em infraestrutura e combater a fome. Por que o Bolsa Família seria incompatível com um programa decente de concessões e privatizações na infraestrutura? Inferir que o aporte de recursos para esse setor serve apenas para enriquecer empresários e não tem efeitos sociais é de um cretinismo avassalador.

Em 2014, o Bolsa Família custou R$ 26,6 bilhões aos cofres públicos. Um ponto percentual de elevação de juros custa R$ 15 bilhões. Vejam a que altura o genial modelo de gastos públicos sem limite — sem pensar muito na infraestrutura, né, Lula? — levou a Selic no país. E não! Não foi para satisfazer a sanha dos banqueiros — não que eles fiquem infelizes, claro… Esse é o resultado das escolhas feitas pelo petismo.

Não há contradição entre investimento em infraestrutura e combate à pobreza. Até porque, vamos convir, não é mesmo?, o petrolão não foi criado em razão dos programas sociais levados adiante pelo petismo. O mesmo lulismo que expandiu o Bolsa Família foi ainda mais generoso com o Bolsa Empreiteiro, o Bolsa BNDES e, em algumas circunstâncias, o Bolsa Banqueiro.

Aí está, aliás, um dos enganos que se podem cometer sobre o PT, já escrevi centenas de vezes. Do socialismo, herdou as taras autoritárias e a tentação de se estabelecer como partido único. E só. No mais, usou o razoável controle que tinha, e tem, de movimentos sociais e a capacidade de seu demiurgo de se comunicar com as massas para regalar alguns potentados da economia nativa. Enquanto Lula distribuía Bolsa Família, ajudava alguns eleitos a arrecadar alguns bilhões em Banânia. O petismo é o escarro do populismo de extrema direita.

O PT só cobrava o valor da corretagem. O sistema de que Lula fala, no fim das contas, é aquele que faz de seu partido o cafetão dos pobres. Não por acaso, o país se transformou num bordel de bandoleiros que cobram e pagam propina.

Eis o modelo que Lula quer vender à América do Sul.


Por Reinaldo Azevedo

quinta-feira, 3 de setembro de 2015

Esquerdopatas vagabundos arrasaram a Educação - Lucas G.: Greve in Rio

Veja como os radicais de esquerda infiltrados nas universidades impedem o avanço educacional brasileiro

Rodrigo Constantino: Recebi a mensagem abaixo de Lucas G., um estudante da UFRJ, que resolveu encarar a votação da permanência ou não da greve em curso, que completará cem dias. Ele relata o verdadeiro calvário que foi enfrentar os obstáculos criados deliberadamente pelos radicais de esquerda, sempre organizados para impedir uma verdadeira democracia. O que se segue é o retrato da falência de nosso sistema educacional, dominado por essa minoria barulhenta e extremamente ideológica. Afinal, o que esperar quando o próprio reitor da universidade veste literalmente o boné do MST? Vejam:

Lucas G.: Greve in Rio
A longa marcha da vaca para o brejo deu passos largos na Assembleia Estudantil da UFRJ de ontem.

Cheguei à Assembleia em um horário próximo do que estava previsto em seu evento do Facebook, mas ela contou com nada menos que 1h30 de atraso. Com todas as óbvias ressalvas, os momentos iniciais do episódio de ontem tinha certo quê Rock in Rio. Eu arriscaria um “Greve in Rio” como apelido.

Da mesma maneira que o popular festival de rock, os entusiastas mais apaixonados, os grevistas no caso, chegaram logo na frente para “pegar a tal da grade” e acompanhar os acontecimentos mais de perto. Os simpáticos vendedores de água e cerveja, sempre atentos ao início de grandes aglomerações, já marcaram presença na entrada do prédio da Reitoria.

Iniciada a cerimônia, dedicaram os primeiros trinta minutos da mesma a um histórico das ações promovidas pelos alunos nesse período de três meses de paralisação. Ocupações, marchas, petições e invasão ao MEC foram citadas. O formato ideal de resistência grevista, que deveria ser seguido pelas demais universidades, era o da tal UFBA, a Universidade de Brasília, segundo um dos falantes que se dedicaram à exposição desse histórico.

Logo em seguida, a mesa iniciou uma discussão a respeito da metodologia da Assembleia. Já vendo que o negócio iria demorar muito, fiz o mesmo que muitos e encostei-me sentado a uma das pilastras do térreo. Eu e uns amigos que tinham ido comigo, talvez imbuídos de um espírito de “estudante farofeiro”, levamos umas bolachas (ou biscoitos) de casa para sobreviver até o final da votação.

Quantas falas teria o tal debate, afinal? Vi que muita gente queria pular direto para o momento em que votaríamos, mas me dei conta de que a peleja seria inevitável. Propuseram inicialmente cerca de 20 ou 25 falas de 2 minutos cada. Já outra garota sugeriu aumentar o número para 35.

Sim! Ouvimos às 19h30 a brilhante ideia de conceder 35 falas de 2 a 3 minutos para os presentes. A essa altura eu já estava me arrependendo de não ter uma barraca de camping para situações desse tipo. Eis que vejo um ser iluminado se levantar e propor um número mais reduzido 15 falas, visto que todo mundo já estava ciente da situação da faculdade, do Brasil, do capitalismo, do imperialismo norte-americano e do que quer que fossem falar futuramente. O bom senso prevaleceu nesse ponto e optamos por essa última proposta.

Entre o intervalo de tempo anterior ao início do debate e o fim do mesmo, muita gente aproveitou para ir ao restaurante universitário. Percebendo que as discussões não teriam muito futuro, aproveitei para matar a fome também, só retornando na metade do debate. Infelizmente perdi a parte em que falaram coisas como a “escravação (sic) dos funcionários terceirizados” e que deveríamos derrotar o “Aécio e a direita”.

Finalmente o debate se aproximava de seu fim, havendo destinado mais de uma hora para ouvir pessoas carregadas do velho vocabulário revolucionário e ouvir também aqueles que pediam pelo fim da greve estudantil ao mesmo tempo em que fosse assegurado o direito de defesa das reivindicações dos alunos..

Conseguíamos identificar facilmente que a maioria, senão a totalidade, da mesa de ontem era composta por membros favoráveis à manutenção de tal greve. Cabia a eles, segundo a metodologia elaborada pela própria mesa, definir os encaminhamentos (que foram identificadas pelos próprios) a serem votados em seguida.

“Voici monsieur!” O relógio já estava quase marcando 9 da noite quando surgiu uma lista com 12 encaminhamentos a serem votados em ordem. Preciso perguntar qual seria o último dos itens da lista a ser votado? Isso mesmo! O fim da greve estudantil da UFRJ.

A maioria dos encaminhamentos era perfeitamente viável sem a aprovação por parte da Assembleia. Exigiam, por exemplo, a criação de um Dia Nacional da Luta e a organização de uma passeata contra o Ajuste Fiscal. Ótimo! Somos livres para fazê-los independentemente do consenso dos amigos da universidade. Também somos livres para nos posicionar contra a ocupação da Cisjordânia, defender o fim da Guerra da Síria e apoiar o movimento de libertação do Tibete. Se deixar por conta dos alunos, a greve estudantil só acaba quando tudo isso for atendido.

Ademais, alguns grevistas levantaram a possibilidade de adiar a votação sobre a manutenção da greve para a semana seguinte. Foi aí que indignação com o sistema da Assembleia eclodiu de vez. Os gritos em uníssono clamavam por uma votação o mais rápido possível. Muitos compareceram apenas para votar pelo fim da greve, mas a estratégia dos grevistas da esquerda era manter a votação para o mais tarde possível. Alunos que queriam votar pelo fim da paralisação estudantil e moravam na Baixada Fluminense ou em regiões mais distantes ficariam sem ônibus. Vários destes foram embora, enquanto outros seguiam protestando.

Contados os votos, venceu a parte que defendia a manutenção da greve. Muitos dos que moravam longe e eram contrários à mesma tiveram de sair antes da votação, que se encerrou depois do incrível horário de 22h30. Assim, continuamos um semestre maculado com uma greve que já dura três meses. O próprio reitor afirmou que as aulas retornarão apenas quando funcionários, alunos e docentes finalizarem suas respectivas greves.


Enquanto o radicalismo ideológico permanecer como a força motriz da política educacional brasileira, seguiremos tomando de goleada nos rankings internacionais de excelência acadêmica. Há reivindicações legítimas no meio disso tudo. Não há como negar. Mas dada a atual conjuntura econômica brasileira, é necessário deixar a ideologia de lado, retomar o semestre letivo e partir para um pragmatismo responsável, tendo consciência do que é viável de ser feito agora e o que não é.