A criminalidade permeia a sociedade desde seus primórdios, a partir do momento em que o homem se organizou e passou a viver em coletividade. Seria necessário estabelecer regras de convivência para uma vida sem perturbações, dentro de um contexto harmônico, e isso é algo que a sociedade moderna busca a todo tempo.
Ainda na Antiguidade, a sociedade em geral passou pela fase da vingança, onde os delitos eram punidos pela forma privada. Cada um que se sentisse ofendido tinha a possibilidade de defender seus direitos, numa total demonstração de ausência da intervenção estatal. O mundo, ainda, não estava preparado para um controle efetivo do Estado.
Mais adiante, os eventos naturais não eram dominados, e os estudos recentes não explicavam os acontecimentos, fazendo com que as punições fossem efetivadas para agradar aos deuses e qualquer divindade que servisse de adoração para os povos espalhados pelos quatro cantos do planeta, até o período moderno onde o homem delinquente passou a ser punido pelo Estado.
Os direitos do homem
Com o passar dos anos, a partir do século XVIII, surgiram as escolas penais, com uma maior visibilidade para o pensamento filosófico iluminista, orientada pelos pensamentos do Marquês de Beccaria. Na sua obra mais conhecida, “Dos delitos e das penas”, o membro da nobreza italiana se insurgiu contra a barbárie, a maneira pela qual os prisioneiros eram tratados, e o arbítrio do Estado precisava ser enfrentado pela sociedade como um todo. Começa, então, a ser fomentada a idéia de que o Estado deveria ser limitado em seu poder e o cidadão deveria ser merecedor de direitos individuais, bem como garantias que respeitassem a dignidade de cada um.
Sob o impacto da Revolução Francesa, que trazia para a coletividade os ideais de Liberdade, Igualdade e Fraternidade, as leis penais passaram a se preocupar com a presunção de inocência, o contraditório e a ampla defesa, dignidade do preso, violação do domicílio, tortura, provas ilícitas e tudo o que elevasse a auto-estima daqueles que burlaram as regras de convivência e de conduta, numa prova inequívoca de que o período da vingança, e por que não dizer, período das trevas na aplicação da lei penal, começava a ceder espaço para a reinserção social.
Crime transnacional
É certo que a sociedade como um todo buscou a sua evolução na aplicação da lei penal, e os resultados poderão ser vistos numa diversificada legislação que o direito brasileiro possui. Não se pode esconder que em muitos casos a lei é colocada em vigência, mas a sua eficácia é duvidosa e causa desconfiança em boa parte da população, perdendo, então, o que os doutrinadores chamam de segurança jurídica.
Quanto mais a população se informa ou se prepara para combater o crime organizado, mais se tem a certeza de que as organizações criminosas estão envolvidas em todo tipo de delito que se possa imaginar: da boca de fumo na esquina às megaoperações de lavagem de dinheiro. Segundo estudos do Banco Mundial, algo em torno de 20% a 25% da economia global passam pelos cofres de organizações criminosas – aproximadamente US$ 12,5 trilhões. Dinheiro esse que circula em todos os países do mundo, e com os avanços tecnológicos, se torna mais difícil o seu controle por conta do chamado capital transnacional. A atividade criminosa ultrapassou as fronteiras e deixou de ser algo amador.
Tudo vira lucro
É muito dinheiro, movimentado por uma variedade quase incalculável de contravenções. Extorsão, chantagem e contrabando são as clássicas, operadas pelas máfias desde os seus primeiros passos, na Sicília do século XIX. Mas tem também o bilionário negócio do tráfico de drogas que tomou proporções assustadoras desde a década de 1960. E as atividades ilegais mais recentes, típicas destes tempos do mundo globalizado e ausência de fronteiras econômicas: tráfico de armas (inclusive nucleares) e seres humanos, fraudes eletrônicas, biopirataria, imigrações clandestina. A lista de delitos parece não ter fim. Até lixo tóxico vira lucro nas mãos dos mafiosos, tornando a vida da população mundial insuportável.
As pessoas, os cidadãos de bem, depositam enorme esperança nas ações dos governantes para que o combate ao crime organizado seja efetivo, pleno e alcance os resultados esperados; porém, quando existe a falta de uma legislação bem elaborada, controle do capital criminoso que entra e sai do país e pessoas do mais alto escalão do poder envolvidas com as organizações criminosas, ou até mesmo chefiando essas organizações, a situação poderá tornar-se irreversível.
Organizado, só o crime
No Brasil, o Código Penal Brasileiro, que teve a sua origem na década de 1940 tentou coibir a atividade delitiva implementada por grupos, bando ou quadrilhas através do art. 288 do referido diploma legal, o que na verdade não surtiu efeitos significativos até mesmo pelo que foi exposto até o momento, temos tais grupos em constante evolução e modernização. O combate ao crime organizado necessitava, como até hoje necessita, de instrumentos céleres, como polícia bem preparada e que usa a inteligência em suas investigações, mecanismos de controle do capital que entre e sai do país e um corpo de leis adequadas à realidade brasileira.
O crime organizado, mesmo presente em todos os continentes do mundo, não é tratado pelos governantes brasileiros, bem como pela União, de forma adequada e sistematizada, onde algumas leis são introduzidas no ordenamento jurídico pátrio sem que provoquem efeitos positivos ou até mesmo que as organizações sofram baixas consideráveis; ao reverso, o crescimento dessas instituições criminosas se apresenta em escala geométrica, ao passo que as investidas do Estado se apresentam em escala aritmética.
Dentro do poder
Embora possa parecer lúdico ou até mesmo fazer parte dos contos de ficção policial, no Brasil fica claro que as organizações criminosas estão realmente entranhadas nas mais diversas esferas do poder, quer seja no Executivo, Legislativo ou Judiciário. São escândalos de mensalões dos partidos políticos no Congresso Nacional e Distrito Federal, vendas de sentenças nos Tribunais de Justiça dos Estados, desvios de dinheiro através de ONG’s, Vereadores que recebem contribuições mensais de Prefeitos para votações, lobistas circulando por todos os gabinetes ou palácios de chefes do executivo, sem falar nas milícias formadas por bandidos e policiais que criaram no Rio de Janeiro um Estado dentro do próprio Estado. Isso é o que podemos chamar de Crime Organizado, mas legislação eficaz para o combate dessa prática delitiva não existe no corpo de leis vigente no Brasil.
Para a população restou o medo, a desconfiança nas instituições, mortes e revolta. Quem poderia dar um alento ao povo, ascendeu ao poder e tomou de assalto a esperança de todos, pois nunca antes na história desse país se viram tantos homicídios, tráfico de drogas em todos os lugares, políticos corruptos, o Secretário Nacional de Justiça passeando com contrabandista em missão oficial e até assassino estrangeiro sendo tratado como ativista político.
Luciano Pontes Bandeira - é advogado criminalista (OAB/BA 22.291) e professor de Direito Penal e Direito Processual
Ainda na Antiguidade, a sociedade em geral passou pela fase da vingança, onde os delitos eram punidos pela forma privada. Cada um que se sentisse ofendido tinha a possibilidade de defender seus direitos, numa total demonstração de ausência da intervenção estatal. O mundo, ainda, não estava preparado para um controle efetivo do Estado.
Mais adiante, os eventos naturais não eram dominados, e os estudos recentes não explicavam os acontecimentos, fazendo com que as punições fossem efetivadas para agradar aos deuses e qualquer divindade que servisse de adoração para os povos espalhados pelos quatro cantos do planeta, até o período moderno onde o homem delinquente passou a ser punido pelo Estado.
Os direitos do homem
Com o passar dos anos, a partir do século XVIII, surgiram as escolas penais, com uma maior visibilidade para o pensamento filosófico iluminista, orientada pelos pensamentos do Marquês de Beccaria. Na sua obra mais conhecida, “Dos delitos e das penas”, o membro da nobreza italiana se insurgiu contra a barbárie, a maneira pela qual os prisioneiros eram tratados, e o arbítrio do Estado precisava ser enfrentado pela sociedade como um todo. Começa, então, a ser fomentada a idéia de que o Estado deveria ser limitado em seu poder e o cidadão deveria ser merecedor de direitos individuais, bem como garantias que respeitassem a dignidade de cada um.
Sob o impacto da Revolução Francesa, que trazia para a coletividade os ideais de Liberdade, Igualdade e Fraternidade, as leis penais passaram a se preocupar com a presunção de inocência, o contraditório e a ampla defesa, dignidade do preso, violação do domicílio, tortura, provas ilícitas e tudo o que elevasse a auto-estima daqueles que burlaram as regras de convivência e de conduta, numa prova inequívoca de que o período da vingança, e por que não dizer, período das trevas na aplicação da lei penal, começava a ceder espaço para a reinserção social.
Crime transnacional
É certo que a sociedade como um todo buscou a sua evolução na aplicação da lei penal, e os resultados poderão ser vistos numa diversificada legislação que o direito brasileiro possui. Não se pode esconder que em muitos casos a lei é colocada em vigência, mas a sua eficácia é duvidosa e causa desconfiança em boa parte da população, perdendo, então, o que os doutrinadores chamam de segurança jurídica.
Quanto mais a população se informa ou se prepara para combater o crime organizado, mais se tem a certeza de que as organizações criminosas estão envolvidas em todo tipo de delito que se possa imaginar: da boca de fumo na esquina às megaoperações de lavagem de dinheiro. Segundo estudos do Banco Mundial, algo em torno de 20% a 25% da economia global passam pelos cofres de organizações criminosas – aproximadamente US$ 12,5 trilhões. Dinheiro esse que circula em todos os países do mundo, e com os avanços tecnológicos, se torna mais difícil o seu controle por conta do chamado capital transnacional. A atividade criminosa ultrapassou as fronteiras e deixou de ser algo amador.
Tudo vira lucro
É muito dinheiro, movimentado por uma variedade quase incalculável de contravenções. Extorsão, chantagem e contrabando são as clássicas, operadas pelas máfias desde os seus primeiros passos, na Sicília do século XIX. Mas tem também o bilionário negócio do tráfico de drogas que tomou proporções assustadoras desde a década de 1960. E as atividades ilegais mais recentes, típicas destes tempos do mundo globalizado e ausência de fronteiras econômicas: tráfico de armas (inclusive nucleares) e seres humanos, fraudes eletrônicas, biopirataria, imigrações clandestina. A lista de delitos parece não ter fim. Até lixo tóxico vira lucro nas mãos dos mafiosos, tornando a vida da população mundial insuportável.
As pessoas, os cidadãos de bem, depositam enorme esperança nas ações dos governantes para que o combate ao crime organizado seja efetivo, pleno e alcance os resultados esperados; porém, quando existe a falta de uma legislação bem elaborada, controle do capital criminoso que entra e sai do país e pessoas do mais alto escalão do poder envolvidas com as organizações criminosas, ou até mesmo chefiando essas organizações, a situação poderá tornar-se irreversível.
Organizado, só o crime
No Brasil, o Código Penal Brasileiro, que teve a sua origem na década de 1940 tentou coibir a atividade delitiva implementada por grupos, bando ou quadrilhas através do art. 288 do referido diploma legal, o que na verdade não surtiu efeitos significativos até mesmo pelo que foi exposto até o momento, temos tais grupos em constante evolução e modernização. O combate ao crime organizado necessitava, como até hoje necessita, de instrumentos céleres, como polícia bem preparada e que usa a inteligência em suas investigações, mecanismos de controle do capital que entre e sai do país e um corpo de leis adequadas à realidade brasileira.
O crime organizado, mesmo presente em todos os continentes do mundo, não é tratado pelos governantes brasileiros, bem como pela União, de forma adequada e sistematizada, onde algumas leis são introduzidas no ordenamento jurídico pátrio sem que provoquem efeitos positivos ou até mesmo que as organizações sofram baixas consideráveis; ao reverso, o crescimento dessas instituições criminosas se apresenta em escala geométrica, ao passo que as investidas do Estado se apresentam em escala aritmética.
Dentro do poder
Embora possa parecer lúdico ou até mesmo fazer parte dos contos de ficção policial, no Brasil fica claro que as organizações criminosas estão realmente entranhadas nas mais diversas esferas do poder, quer seja no Executivo, Legislativo ou Judiciário. São escândalos de mensalões dos partidos políticos no Congresso Nacional e Distrito Federal, vendas de sentenças nos Tribunais de Justiça dos Estados, desvios de dinheiro através de ONG’s, Vereadores que recebem contribuições mensais de Prefeitos para votações, lobistas circulando por todos os gabinetes ou palácios de chefes do executivo, sem falar nas milícias formadas por bandidos e policiais que criaram no Rio de Janeiro um Estado dentro do próprio Estado. Isso é o que podemos chamar de Crime Organizado, mas legislação eficaz para o combate dessa prática delitiva não existe no corpo de leis vigente no Brasil.
Para a população restou o medo, a desconfiança nas instituições, mortes e revolta. Quem poderia dar um alento ao povo, ascendeu ao poder e tomou de assalto a esperança de todos, pois nunca antes na história desse país se viram tantos homicídios, tráfico de drogas em todos os lugares, políticos corruptos, o Secretário Nacional de Justiça passeando com contrabandista em missão oficial e até assassino estrangeiro sendo tratado como ativista político.
Luciano Pontes Bandeira - é advogado criminalista (OAB/BA 22.291) e professor de Direito Penal e Direito Processual