O cérebro de um corrupto já nasce com essa tendência ou isso é adquirido em decorrência de interações sociais e ambientais? Neurocientistas ainda procuram uma resposta definitiva, mas começam a levantar as primeiras hipóteses - com auxílio de estudos de imagem do órgão em funcionamento - para explicar a corrupção e talvez um dia desenvolver ferramentas e estratégias para combater esse tipo de comportamento. Num momento em que se discutem a aplicação da Lei da Ficha Limpa e a montagem de dossiês, o tema foi um dos destaques no 6 Congresso Brasileiro de Cérebro, Comportamento e Emoções, em Gramado, no Rio Grande do Sul. (Leia também: Curiosidades da nossa mente)
O que se sabe é que os humanos têm um sentido natural e fisiológico de justiça que permeia as ações sociais. Quando esse sistema é violado, ocorrem reações e emoções de segunda classe, como o nojo, e quando ele é respeitado nos sentimos bem. Mas em casos de sociopatias, que afetam cerca de 4% da população mundial, o indivíduo se sente gratificado com o ilícito, sem culpa ou remorso no que faz, diz o neurocientista Jaderson Costa da Costa, diretor do Instituto do Cérebro da PUC-RS. E isso talvez possa ser aplicado ao comportamento corrupto.
- As transgressões sem punição vão ampliando as fronteiras no cérebro, deixam a periferia e acabam se incorporando a ele. E isso pode até ser comparado a uma dependência química - afirma o pesquisador. - Essas fronteiras começam a se abrir desde a infância. Depois que o cérebro aprende que ser corrupto é normal, fica muito difícil mudar.
Permissividade social é um elo
Claro que é preciso levar em conta questões culturais, acrescenta Jaderson. Em sociedades em que os limites são estreitos, rígidos, fica mais claro para um indivíduo o que é um ato ilícito. Em outras, pode existir uma permissividade social para aceitar determinadas atitudes, como subornar uma autoridade ou empregar parentes sem concurso no serviço público.
- O cérebro vai se condicionando. Ele recebe a informação de que um crime foi praticado e nada aconteceu ao criminoso e passa aceitar esse ato como normal - avalia o cientista.
Outros estudos mostram que alterações funcionais no cérebro, especialmente no lobo frontal, levam a comportamentos psicopatas. Esses indivíduos têm prejuízo da crítica social, ou seja, para eles é natural, normal cometer um ato ilícito, que pode ser desde suborno a um crime violento.
- A pessoa com esse tipo de disfunção não pensa duas vezes, e tem certo prazer em enganar a outra, se acha mais esperta. Ela não sofre com o dilema moral - explica Jaderson.
Antoine Bechara, neuropsicologista da Universidade do Sul da Califórnia, diz que apesar de não existirem estudos precisos sobre a neurobiologia da corrupção, algumas avaliações têm ajudado a entender uma possível relação. Pesquisadores observaram que pessoas com danos na área pré-frontal do cérebro faziam escolhas erradas em testes mesmo sabendo o que era certo ou errado, sem qualquer medo de uma punição. Elas se arriscavam, apesar de um possível dano.
- Dá para afirmar que indivíduos com certos danos no lobo frontal julgam comportamentos que para pessoas normais é antissocial, incluindo a corrupção e até assassinato, como moralmente permissíveis. Há ainda uma percentagem de pessoas sem lesões aparentes nessa parte do cérebro que age de forma semelhante. É quase certo que elas apresentam anormalidades subjacentes, e isso pode ser causado por defeito genético, condições ambientais, uso de drogas e estresse. Muitas pessoas têm ideia de que psicopatas são essencialmente assassinos e violentos, mas eles podem ser políticos, empresários, qualquer um que tente enriquecer por meio de corrupção - diz.
Jaderson, porém, alerta que não se pode generalizar, como na perigosa afirmação de que todo político é corrupto, pois isso leva à falsa ideia de que não há solução para o problema. A principal questão é a impunidade.
- Daí a importância de estudarmos como o cérebro participa dessas decisões. Hoje essa análises são usadas na propaganda, num campo que se chama neuromarketing. Publicitários e cientistas investigam quais as áreas do cérebro são ativadas na hora de escolher um produto ou o rejeitar. É um caminho para entender porque o cérebro de algumas pessoas se corrompe e o de outras não. Será que algum dia poderemos intervir precocemente para evitar isso? Não acredito que possamos criar uma pílula para acabar com o comportamento corrupto, mas teremos mais dados para agir de forma preventiva - considera.
Corrupto age como um sociopata
Já o neurocientista André Palmini, também da PUC-RS e que falou sobre o tema no Congresso, diz que a neurociência está descobrindo pistas importantes. Ele citou pesquisa realizada num período de 20 anos nas Ilhas Maurício, com crianças a partir de 3 anos e jovens até 23 anos. O grupo que na infância apresentou reduzida capacidade de sentimentos e ignorava o medo tomou mais decisões inadequadas, tornou-se agressivo e mostrou tendência para cometer crimes. Uma das equipes que se dedica a estudar profundamente esse assunto é a do cientista Jorge Moll, da UFRJ, conta Palmini:
- Eles mostraram que quando se estudam sentimentos como compaixão, culpa, indignação, constrangimento, entre outras, o cérebro ativa determinadas emoções morais. Sentimos desgosto ou tristeza mesmo quando só imaginamos alguém numa situação difícil. Já o corrupto não, assim como um sociopata.
Os cientistas acham que o comportamento corrupto pode ser causado por uma interação entre oportunidade, vulnerabilidade causada por características anatômicas e/ou funcionais do cérebro ainda misteriosas, e impunidade. E querem investigar até que ponto cérebros com alguma diferença agem de forma diversa em certas situações.
O que se sabe é que os humanos têm um sentido natural e fisiológico de justiça que permeia as ações sociais. Quando esse sistema é violado, ocorrem reações e emoções de segunda classe, como o nojo, e quando ele é respeitado nos sentimos bem. Mas em casos de sociopatias, que afetam cerca de 4% da população mundial, o indivíduo se sente gratificado com o ilícito, sem culpa ou remorso no que faz, diz o neurocientista Jaderson Costa da Costa, diretor do Instituto do Cérebro da PUC-RS. E isso talvez possa ser aplicado ao comportamento corrupto.
- As transgressões sem punição vão ampliando as fronteiras no cérebro, deixam a periferia e acabam se incorporando a ele. E isso pode até ser comparado a uma dependência química - afirma o pesquisador. - Essas fronteiras começam a se abrir desde a infância. Depois que o cérebro aprende que ser corrupto é normal, fica muito difícil mudar.
Permissividade social é um elo
Claro que é preciso levar em conta questões culturais, acrescenta Jaderson. Em sociedades em que os limites são estreitos, rígidos, fica mais claro para um indivíduo o que é um ato ilícito. Em outras, pode existir uma permissividade social para aceitar determinadas atitudes, como subornar uma autoridade ou empregar parentes sem concurso no serviço público.
- O cérebro vai se condicionando. Ele recebe a informação de que um crime foi praticado e nada aconteceu ao criminoso e passa aceitar esse ato como normal - avalia o cientista.
Outros estudos mostram que alterações funcionais no cérebro, especialmente no lobo frontal, levam a comportamentos psicopatas. Esses indivíduos têm prejuízo da crítica social, ou seja, para eles é natural, normal cometer um ato ilícito, que pode ser desde suborno a um crime violento.
- A pessoa com esse tipo de disfunção não pensa duas vezes, e tem certo prazer em enganar a outra, se acha mais esperta. Ela não sofre com o dilema moral - explica Jaderson.
Antoine Bechara, neuropsicologista da Universidade do Sul da Califórnia, diz que apesar de não existirem estudos precisos sobre a neurobiologia da corrupção, algumas avaliações têm ajudado a entender uma possível relação. Pesquisadores observaram que pessoas com danos na área pré-frontal do cérebro faziam escolhas erradas em testes mesmo sabendo o que era certo ou errado, sem qualquer medo de uma punição. Elas se arriscavam, apesar de um possível dano.
- Dá para afirmar que indivíduos com certos danos no lobo frontal julgam comportamentos que para pessoas normais é antissocial, incluindo a corrupção e até assassinato, como moralmente permissíveis. Há ainda uma percentagem de pessoas sem lesões aparentes nessa parte do cérebro que age de forma semelhante. É quase certo que elas apresentam anormalidades subjacentes, e isso pode ser causado por defeito genético, condições ambientais, uso de drogas e estresse. Muitas pessoas têm ideia de que psicopatas são essencialmente assassinos e violentos, mas eles podem ser políticos, empresários, qualquer um que tente enriquecer por meio de corrupção - diz.
Jaderson, porém, alerta que não se pode generalizar, como na perigosa afirmação de que todo político é corrupto, pois isso leva à falsa ideia de que não há solução para o problema. A principal questão é a impunidade.
- Daí a importância de estudarmos como o cérebro participa dessas decisões. Hoje essa análises são usadas na propaganda, num campo que se chama neuromarketing. Publicitários e cientistas investigam quais as áreas do cérebro são ativadas na hora de escolher um produto ou o rejeitar. É um caminho para entender porque o cérebro de algumas pessoas se corrompe e o de outras não. Será que algum dia poderemos intervir precocemente para evitar isso? Não acredito que possamos criar uma pílula para acabar com o comportamento corrupto, mas teremos mais dados para agir de forma preventiva - considera.
Corrupto age como um sociopata
Já o neurocientista André Palmini, também da PUC-RS e que falou sobre o tema no Congresso, diz que a neurociência está descobrindo pistas importantes. Ele citou pesquisa realizada num período de 20 anos nas Ilhas Maurício, com crianças a partir de 3 anos e jovens até 23 anos. O grupo que na infância apresentou reduzida capacidade de sentimentos e ignorava o medo tomou mais decisões inadequadas, tornou-se agressivo e mostrou tendência para cometer crimes. Uma das equipes que se dedica a estudar profundamente esse assunto é a do cientista Jorge Moll, da UFRJ, conta Palmini:
- Eles mostraram que quando se estudam sentimentos como compaixão, culpa, indignação, constrangimento, entre outras, o cérebro ativa determinadas emoções morais. Sentimos desgosto ou tristeza mesmo quando só imaginamos alguém numa situação difícil. Já o corrupto não, assim como um sociopata.
Os cientistas acham que o comportamento corrupto pode ser causado por uma interação entre oportunidade, vulnerabilidade causada por características anatômicas e/ou funcionais do cérebro ainda misteriosas, e impunidade. E querem investigar até que ponto cérebros com alguma diferença agem de forma diversa em certas situações.