Leandro Colon
Auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) obtida pelo Estado aponta uma série de irregularidades, inclusive uso de documento falso e favorecimento, na licitação da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), do governo federal, que contratou por R$ 6,2 milhões a Tecnet Comércio e Serviços Ltda. Cláudio Martins, filho do ex-ministro da Comunicação Social Franklin Martins, é funcionário da empresa. Segundo o TCU, a Tecnet não poderia disputar a licitação, nem a EBC deveria ter aceito a sua participação.
A auditoria foi concluída no dia 20 de janeiro deste ano pela Secretaria de Fiscalização de Tecnologia da Informação (Sefti) do TCU. O Estado revelou no dia 22 de setembro de 2010 que a Tecnet havia sido contratada no dia 31 de dezembro de 2009 para cuidar do sistema de arquivos digitais da TV Brasil, administrada pela EBC, num processo de licitação com indícios de fraude.
A auditoria do TCU, aliás, menciona a reportagem e confirma, por exemplo, que a empresa Media Portal, única adversária da Tecnet na concorrência, auxiliou a EBC a preparar o edital público do pregão 85/2009.
Atestado falso. O resultado da auditoria, elaborado após a EBC ser ouvida, aponta que a Tecnet falsificou um atestado para comprovar que atendia aos requisitos da concorrência. “A declaração apresentada pela empresa Tecnet acerca do integral atendimento de seu sistema aos requisitos especificados no termo de referência do Pregão 85/2009 é falsa”, diz o relatório. “Esse fato é de extrema gravidade”, ressalta trecho do documento.
A investigação do tribunal afirma ainda que “a empresa Tecnet Comércio e Serviços Ltda. não possui nos dias atuais, tampouco possuía à época da licitação, o sistema de gestão de ativos digitais em consonância com as especificações do instrumento convocatório”. E continua: “A Empresa Brasil de Comunicação S.A. aceitou sistema de gestão de ativos digitais em desconformidade com os requisitos especificados no termo de referência do Pregão 85/2009, potencialmente lesando direitos de terceiros”.
Segundo o relatório, não há, nos autos, “quaisquer documentos evidenciando a conferência dos requisitos exigidos”.
Negação. Na época da publicação da reportagem do Estado, Franklin Martins defendeu os procedimentos da EBC e negou influência do filho Cláudio Martins, funcionário da Tecnet há mais de dois anos, na contratação. “Não houve qualquer irregularidade na licitação, que foi conduzida com transparência e obedeceu a todas as normas legais”, disse. E-mails internos mostram que Franklin pediu “prioridade zero” para o caso.
A auditoria do TCU destaca essa rapidez por parte da EBC, que realizou o pregão, às pressas, no dia 30 de dezembro de 2009. O relatório afirma que a contratação da Tecnet, fechada no dia seguinte, “prescindiu de planejamento prévio adequado, não se encontrando em seus autos estudos técnicos preliminares, cuja elaboração é mandatória” segundo a Lei 8.666/93 (de licitações).
Os auditores contestam atestado de capacidade técnica da Tecnet fornecido pela Rede TV!. O TCU lembra que o sócio majoritário da emissora, Amilcare Dallevo Júnior, é também dono da Tecnet. “Esse vínculo, o qual dificilmente passaria despercebido em uma empresa de comunicação, por si só, põe sob suspeita o atestado de capacidade técnica emitido pela empresa Rede TV!”, destaca a auditoria. A Tecnet é fornecedora da RedeTV!.
Preço. A análise do TCU derruba ainda um dos argumentos da EBC de que a Tecnet venceu porque ofereceu o menor preço, de R$ 6,2 milhões, bem abaixo dos R$ 16 milhões estimados pelo governo. Segundo o tribunal, não costuma existir, numa licitação, uma diferença tão grande entre valores estimado e finalizado.
Para os técnicos, a proposta da Tecnet é inviável ou a EBC errou na estimativa: “O valor ofertado pela empresa vencedora é indício da existência de uma de duas situações: proposta inexequível ou estimativa de preços incorreta”. “Pode-se concluir que a estimativa de preço elaborada pela EBC encontrava-se com valor acima do preço realmente praticado no mercado”, enfatizam técnicos do TCU.
Os auditores também encontraram pagamentos indevidos à Tecnet. “A empresa Tecnet Comércio e Serviços Ltda. tem realizado serviços não previstos no âmbito do contrato.” Os valores repassados pela EBC à empresa estão, alerta a auditoria, “em desarmonia com o preconizado” na Lei de Licitações. O contrato da Tecnet já foi prorrogado duas vezes e, agora, está com vigência até o próximo dia 31.
PARA LEMBRAR
TV estatal foi prioridade do governo Lula
A Empresa Brasil de Comunicação (EBC) foi criada em outubro de 2007 como um grande projeto do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva para criar uma TV Pública. Surgiu assim a TV Brasil.
Ministro da Comunicação Social à época, Franklin Martins comandou o setor até o fim do governo Lula, quando deixou o cargo. A EBC é presidida pela jornalista Tereza Cruvinel. Ex-diretora da empresa, Helena Chagas assumiu o ministério no lugar de Franklin no governo da presidente Dilma Rousseff.
A EBC tem planos de crescimento também no exterior. No ano passado, foi lançada, inclusive, a TV Brasil Internacional, um canal para os brasileiros que vivem fora do País, com operações iniciais em países africanos.