Agora é possível entender as razões da sua liderança de
tentar, por todos os meios, impedir a realização do julgamento. Não queriam a
publicização das práticas criminosas, das reuniões clandestinas, algumas delas
ocorridas no interior do próprio Palácio do Planalto, caso único na história
brasileira.
Muito distante das pesquisas acadêmicas ─ instrumentalizadas
por petistas ─ e, portanto, mais próximos da realidade, os ministros do STF
acertaram na mosca ao definir a liderança petista, em 2005, como uma
sofisticada organização criminosa e que, no entender do ministro Joaquim
Barbosa, tinha como chefe José Dirceu, ex-presidente do PT e ministro da Casa
Civil de Lula.
Segundo o ministro Celso de Mello: “Este processo criminal
revela a face sombria daqueles que, no controle do aparelho de Estado,
transformaram a cultura da transgressão em prática ordinária e desonesta de
poder.” E concluiu: “É macrodelinquência governamental.” O presidente Ayres Brito
foi direto: “É continuísmo governamental. É golpe.”
O julgamento do mensalão desnudou o PT, daí o ódio dos seus
fanáticos militantes com a Suprema Corte e, principalmente, contra o que eles
consideram os “ministros traidores”, isto é, aqueles que julgaram segundo os
autos do processo e não de acordo com as determinações emanadas da direção
partidária.
Como estão acostumados a lotear as funções públicas, até
hoje não entenderam o significado da existência de três poderes independentes
e, mais ainda, o que é ser ministro do STF.
Para eles, especialmente Lula, ministro da Suprema Corte é
cargo de confiança, como os milhares criados pelo partido desde 2003. Daí que
já começaram a fazer campanha para que os próximos nomeados, a começar do
substituto de Ayres Brito, sejam somente aqueles de absoluta confiança do PT,
uma espécie de ministro companheiro. E assim, sucessivamente, até conseguirem
ter um STF absolutamente sob controle partidário.
A recepção da liderança às condenações demonstra como os
petistas têm uma enorme dificuldade de conviver com a democracia.
Primeiramente, logo após a eclosão do escândalo, Lula pediu
desculpas em pronunciamento por rede nacional. No final do governo mudou de
opinião: iria investigar o que aconteceu, sem explicar como e com quais
instrumentos, pois seria um ex-presidente.
Em 2011 apresentou uma terceira explicação: tudo era uma
farsa, não tinha existido o mensalão. Agora apresentou uma quarta versão: disse
que foi absolvido pelas urnas ─ um ato falho, registre-se, pois não eram um dos
réus do processo. Ao associar uma simples eleição com um julgamento demonstrou
mais uma vez o seu desconhecimento do funcionamento das instituições ─
registre-se que, em todas estas versões, Lula sempre contou com o beneplácito
dos intelectuais chapas-brancas para ecoar sua fala.
As lideranças condenadas pelo STF insistem em dizer que o
partido tem que manter seu projeto estratégico. Qual? O socialismo foi
abandonado e faz muito tempo. A retórica anticapitalista é reservada para os
bate-papos nostálgicos de suas velhas lideranças, assim como fazem parte do
passado o uso das indefectíveis bolsas de couro, as sandálias, as roupas
desalinhadas e a barba por fazer.
A única revolução petista foi na aparência das suas
lideranças. O look guevarista foi abandonado. Ficou reservado somente à base
partidária. A direção, como eles próprios diriam em 1980, “se aburguesou”.
Vestem roupas caras, fizeram plásticas, aplicam botox a três por quatro. Só
frequentam restaurantes caros e a cachaça foi substituída pelo uísque e o
vinho, sempre importados, claro.
O único projeto da aristocracia petista ─ conservadora,
oportunista e reacionária ─ é de se perpetuar no poder. Para isso precisa
contar com uma sociedade civil amorfa, invertebrada. Não é acidental que
passaram a falar em controle social da imprensa e… do Judiciário. Sabem que a
imprensa e o Judiciário acabaram se tornando, mesmo sem o querer, nos maiores
obstáculos à ditadura de novo tipo que almejam criar, dada ausência de uma
oposição político-partidária.
A estratégia petista conta com o apoio do que há de pior no
Brasil. É uma associação entre políticos corruptos, empresários inescrupulosos
e oportunistas de todos os tipos. O que os une é o desejo de saquear o Estado.
O PT acabou virando o instrumento de uma burguesia
predatória, que sobrevive graças às benesses do Estado. De uma burguesia
corrupta que, no fundo, odeia o capitalismo e a concorrência. E que encontrou
no partido ─ depois de um século de desencontros, namorando os militares e
setores políticos ultraconservadores ─ o melhor instrumento para a manutenção e
expansão dos seus interesses. Não deram nenhum passo atrás na defesa dos seus
interesses de classe. Ficaram onde sempre estiveram. Quem se movimentou em
direção a eles foi o PT.
Vivemos uma quadra muito difícil. Remar contra a corrente
não é tarefa das mais fáceis. As hordas governistas estão sempre prontas para
calar seus adversários.
Mas as decisões do STF dão um alento, uma esperança, de que
é possível imaginar uma república em que os valores predominantes não sejam o
da malandragem e da corrupção, onde o desrespeito à coisa pública não se torne
uma espécie de lema governamental e a mala recheada de dinheiro roubado do
Erário não se tenha transformado em símbolo nacional.