Recorrer a instância internacional de condenações no
mensalão é um desrespeito à Justiça brasileira e nivela o país a ditaduras em
que o poder é exercido de forma vertical
Aceitamos qualquer veredicto da Justiça, contanto que seja a
nosso favor — de forma bastante direta, este é o significado da iniciativa do
mensaleiro Valdemar Costa Neto (PR-SP), já condenado pelo Supremo, e do
advogado Marcio Thomaz Bastos, de anunciarem a ida à Corte Interamericana de
Direitos Humanos, da Organização dos Estados Americanos (OEA), contra
veredictos da mais alta instância da Justiça brasileira.
Thomaz Bastos, ex-ministro da Justiça, de histórica ligação
com o PT lulista, defendeu, sem sucesso, o réu José Roberto Salgado, ex-diretor
do Banco Rural, instituição considerada pelo STF peça essencial da máquina de
lavagem de dinheiro montada a fim de tentar legalizar o dinheiro público
desviado para abastecer o esquema do mensalão.
Bastos e outros advogados de defesa consideram que os réus
sem foro privilegiado — a grande maioria — são prejudicados por não terem como
apelar a alguma instância superior, pois o STF é a última. Podem apenas, por
meio de embargos, pedir esclarecimentos sobre sentenças ou reivindicar revisão
do julgamento, caso tenham obtido no mínimo quatro votos no Pleno. A valer a
crítica, toda autoridade com foro privilegiado teria seus direitos de defesa
desrespeitados.
Reclamam — e levantariam a questão na OEA — que o julgamento
do caso em bloco os prejudicou. O pedido de desmembramento do processo foi
encaminhado diversas vezes ao STF, inclusive na primeira sessão do julgamento,
reivindicação sempre rejeitada pelos ministros. E com razão, pois fragmentar o
processo inviabilizaria o julgamento de de forma organizada de crimes
cometidos. Só numa avaliação do conjunto da denúncia do Ministério Público
Federal seria possível cada juiz votar com o máximo conhecimento dos fatos.
Sem considerar que transferir a maioria dos réus para a
primeira instância significaria inocentá-los, a priori, dada a conhecida
lerdeza dos tribunais. Não seria feita justiça, ao contrário. E desmembrar ou
não processos é prerrogativa da Corte. No caso, o STF decidiu mantê-lo
unificado.
Os advogados também não podem dizer que não tiverem o mais
amplo direito de defesa. Durante cinco anos, por exemplo, testemunhas foram
ouvidas em todo o país, com a ajuda dos tribunais regionais, e sempre em dias e
horários diferentes, para permitir o acesso de qualquer advogado dos réus aos
depoimentos.
Querer recorrer de decisões tomadas no processo do mensalão
a instâncias internacionais é desrespeitar a Justiça e, em particular, o
Supremo Tribunal Federal, equiparando-o a uma Corte chavista, sem qualquer
independência, e ainda nivelar o Brasil a uma dessas ditaduras africanas onde o
poder é unitário e vertical. A advocacia precisa se acostumar com um Judiciário
de fato independente, como estabelece a Constituição.