O Superior Tribunal de Justiça, que se autointitulou “tribunal
da cidadania”, foi uma criação da Constituição de 1988. É formado por 33
ministros. O STJ recebe pouca atenção do grande público. O Supremo Tribunal
Federal acaba ocupando todos os espaços. Uma designação de um ministro para o
STJ passa geralmente em branco; já o mesmo não ocorre com o STF.
Em 2011 e 2013, examinei os gastos do STJ e fiquei
estarrecido. Os artigos que publiquei, neste mesmo espaço, até hoje circulam
pela internet (“Triste Judiciário” e “Eles estão de brincadeira”). Resolvi
voltar ao tema, certo — e é a mais pura verdade, acreditem — de que algo teria
mudado. Contudo, constatei que a situação não melhorou. Pelo contrário, piorou
— e muito.
O curioso é que todos os dados aqui apresentados estão
disponíveis no site do STJ, mais especificamente no Portal da Transparência. O
último relatório de gestão anual disponibilizado é de 2013. Os dados são
estarrecedores. O orçamento foi de R$ 1.040.063.433,00! Somente para o
pagamento de aposentadorias e pensionistas foram despendidos R$ 236.793.466,87,
cerca de um quarto do orçamento. Para os vencimentos de pessoal, foi gasta a
incrível quantia de R$ 442.321.408,00. Ou seja, para o pagamento de pessoal e
das pensões e aposentadorias, o STJ reservou dois terços do seu orçamento.
Setembro é considerado o mês das flores. Mas no STJ é o mês
do Papai Noel. O bom velhinho, três meses antes do Natal, em 2014, chegou com
seu trenó recheado de reais. Somente a dois ministros aposentados pagou quase 1
milhão de reais. Arnaldo Esteves Lima ganhou R$ 474.850,56 e Aldir Passarinho,
R$ 428.148,16 — os dois somados receberam o correspondente ao valor da
aposentadoria de 1.247 brasileiros. A ministra Assusete Dumont Reis Magalhães
embolsou de rendimentos R$ 446.833,87, o ministro Francisco Cândido de Melo
Falcão de Neto foi aquinhoado com R$ 422.899,18, mas sortudo mesmo foi o
ministro Benedito Gonçalves, que abocanhou a módica quantia de R$ 594.379,97.
Também em setembro, o ministro Luiz Alberto Gurgel de Faria recebeu R$
446.590,41. Em novembro do mesmo ano, a ministra Nancy Andrighi foi contemplada
no seu contracheque com R$ 674.927,55, à época correspondentes a 932
salários-mínimos, o que — incluindo o décimo terceiro salário — um trabalhador
levaria para receber 71 anos de labuta contínua.
Nos dados disponibilizados na rede, é impossível encontrar
um mês, somente um mês, em que ministros ou servidores — não exemplifiquei
casos de funcionários, e são vários, para não cansar (ou indignar?) ainda mais
os leitores — não receberam acima do teto constitucional. São inexplicáveis
estes recebimentos. Claro que a artimanha, recheada de legalismo oportunista
(não é salário, é “rendimento”), é de que tudo é legal. Deve ser, presumo. Mas
é inegável que é imoral.
Em maio de 2015, o quantitativo de cargos efetivos era de
2.930 (eram 2.737 em 2014). Destes, 1.817 exerciam cargos em comissão ou
funções de confiança (eram 1.406 em 2014). Dos trabalhadores terceirizados, o
STJ tem no campo da segurança um verdadeiro exército privado: 249 vigilantes.
De motoristas são 120. Chama a atenção a dedicação à boa alimentação dos
ministros e servidores. São quatro cozinheiras, 29 garçons, cinco garçonetes e
54 copeiros. Isto pode agravar a obesidade, especialmente porque as escadas devem
ser muito pouco usadas, tendo em vista que o STJ tem 32 ascensoristas. Na longa
lista — são 1.573 nomes em 99 páginas — temos pedagogas, médicos, encanadores,
bombeiros, repórteres fotográficos, recepcionistas, borracheiros, engenheiros,
auxiliares de educação infantil, marceneiros, jardineiros, lustradores e até
jauzeiros (que eu não sei o que é).
Para assistência médica, incluindo familiares, foram gastos,
em apenas um ano, 63 milhões de reais e quatro milhões para assistência
pré-escolar. Pela quantia dispendida em auxílio-alimentação — quase 25 milhões
— creio ser necessário um programa de emagrecimento de ministros e servidores.
Mas os absurdos não param por aí. Somente para comunicação e divulgação
institucional foram reservados mais de sete milhões de reais. E não será por
falta de veículos que o STJ vai deixar de exercer sua atribuição
constitucional. Segundo dados de 31 de janeiro de 2015, a frota é formada por
57 GM/Omega, 13 Renault/Fluence e 7 GM/Vectra, além de 68 veículos de serviço,
perfazendo um total de 146. E como são 33 ministros, cada excelência tem, em
média, à sua disposição, quatro veículos.
Como foi exposto, há 2.840 efetivos e mais 1.573 servidores
que são terceirizados, perfazendo um total de 4.413, que já é um número absurdo
para um simples tribunal, apenas um. Ah, leitor, não se irrite. Ainda tem mais
gente. Segundo o relatório anual de 2013 (volto a lembrar que é o último
disponibilizado) há mais 523 estagiários. Sendo assim, o número total alcança
4.936 funcionários!
É raro uma Corte superior no mundo com os gastos e número de
funcionários do STJ. Contudo este não é o retrato da Justiça brasileira. Onde a
demanda é maior — como na primeira instância — faltam funcionários, o juiz não
tem a mínima estrutura para trabalhar e está sobrecarregado com centenas de
processos, além de — e são tantos casos — sofrer ameaças de morte por colocar a
Justiça acima dos interesses dos poderosos. No conjunto não faltam recursos
financeiros ao Judiciário. A tarefa é enfrentar, combater privilégios e
estabelecer uma eficaz alocação orçamentária. Este dever não pode ser reservado
somente aos membros do Poder Judiciário. Ele interessa a toda a sociedade.