Devo agradecer às organizações sindicais, promotoras desta
grande manifestação, devo agradecer ao povo brasileiro por esta demonstração
extraordinária a que assistimos emocionados, aqui nesta cidade do Rio de
Janeiro. Quero agradecer, também, aos sindicatos quem de todos os estados
mobilizaram os seus associados, dirigindo minha saudação a todos os patrícios,
neste instante mobilizados em todos os recantos do país, e ouvindo o povo
através do rádio ou da televisão. Dirijo-me a todos os brasileiros, e não
apenas aos que conseguiram adquirir instrução nas escolas. Dirijo-me também aos
milhões de irmãos nossos que dão ao Brasil mais do que recebem e que pagam em
sofrimento, pagam em miséria, pagam em privações, o direito de serem
brasileiros e o de trabalhar de sol a sol pela grandeza deste país. Presidente
de oitenta milhões de brasileiros, quero que minhas palavras sejam bem
entendidas por todos os nossos patrícios. Vou falar em linguagem (...) rude,
mas que é sincera e sem subterfúgios. É também a linguagem de esperança, de
quem quer inspirar confiança no futuro, mas de quem tem a coragem de enfrentar
sem fraquezas a dura realidade que vivemos.
Aqui estão os meus amigos trabalhadores, pensando na
campanha de terror ideológico e de sabotagem, cuidadosamente organizada para
impedir ou perturbar a realização deste memorável encontro entre povo e o seu
Presidente, na presença das lideranças populares mais representativas deste
país, que se encontram também conosco, nesta festa cívica.
Chegou-se a proclamar, trabalhadores brasileiros, que esta
concentração seria um ato atentatório ao regime democrático como se no Brasil a
reação ainda fosse dona da democracia, ou proprietária das praças e ruas.
Desgraçada democracia a que tiver de ser defendida por esses democratas.
Democracia para eles não é o regime da liberdade de reunião para o povo. O que
eles querem é uma democracia de um povo emudecido, de um povo abafado nos seus
anseios, de um povo abafado nas suas reivindicações. A democracia que eles
desejam impingir-nos é a democracia do anti-sindicato, ou seja, aquela que
melhor atenda aos seus interesses ou aos dos grupos que eles representam. A
democracia que eles pretendem é a democracia dos privilégios, a democracia da
intolerância e do ódio. A democracia que eles querem, trabalhadores, é para
liquidar com a Petrobrás, é a democracia dos monopólios, nacionais e
internacionais, a democracia que pudesse lutar contra o povo, a democracia que
levou o grande Presidente Vargas ao extremo sacrifício. Ainda ontem eu afirmava
no Arsenal de Marinha, envolvido pelo calor dos trabalhadores de lá, que a
democracia jamais poderia ser ameaçada pelo povo, quando o povo livremente vem
para as praças – as praças que são do povo. Para as ruas – que são do povo.
Democracia, trabalhadores, é o que o meu governo vem
procurando realizar, como é do meu dever. Não só para interpretar os anseios
populares, mas também para conquistá-los pelo caminho do entendimento e da paz.
Não há ameaça mais séria para a democracia do que tentar estrangular a voz do
povo, dos seus legítimos líderes populares, fazendo calar as sua
reivindicações.
Estaríamos, assim, brasileiros, ameaçando o regime se nos
mostrássemos surdos aos reclamos da Nação, desta Nação e desses reclamos que,
de Norte a Sul, de Leste a Oeste, levantam o seu grande clamor pelas reformas
de base e de estrutura, sobretudo pela reforma agrária, que será o complemento
da abolição do cativeiro para dezenas de milhões de brasileiros, que vegetam no
interior, em revoltantes condições de miséria. Ameaça à democracia, enfim, não
é vir confraternizar com o povo na rua. Ameaça à democracia é empulhar o povo
brasileiro, é explorar os seus sentimentos cristãos, na mistificação de uma
indústria do anticomunismo, insurgindo o povo até contra os grandes e
iluminados ensinamentos dos grandes e santos Papas que informam notáveis
pronunciamentos, das mais expressivas figuras do episcopado nacional. O
inolvidável Papa João XXIII é que nos ensina, povo brasileiro, que a dignidade
da pessoa humana exige normalmente, como fundamento natural para a vida, o
direito e o uso dos bens da terra, ao qual corresponde a obrigação fundamental
de conceder uma propriedade para todos. É dentro desta autêntica doutrina que o
governo brasileiro vem procurando situar sua política social, particularmente
no que diz respeito à nossa realidade agrária. O cristianismo nunca foi o
escudo para privilégios condenados para o Santo Padre, nem também, brasileiro,
os rosários podem ser levantados contra a vontade do povo e as sua aspirações
mais legítimas. Não podem ser levantados os rosários da fé contra o povo, que
tem fé numa justiça social mais humana e na dignidade das suas esperanças. Os
rosários não podem ser erguidos contra aqueles que reclamam a discriminação da
propriedade da terra, hoje ainda em mãos de tão poucos, de tão pequena maioria.
Àqueles que reclamam do Presidente da República uma palavra
tranqüila para a Nação, àqueles que em todo o Brasil nos ouvem nesta oportunidade,
o que eu posso dizer é que só conquistaremos a paz social através da justiça
social. Perdem seu tempo, também, os que temem que o governo passe a empreender
uma ação subversiva na defesa de interesses políticos ou pessoais, como perdem
também seu tempo os que esperam deste governo uma ação repressiva dirigida
contra o povo, contra os seus direitos ou contra as suas reivindicações. Ação
repressiva, trabalhadores, é a que o governo está praticando e vai ampliar cada
vez mais e mais implacavelmente, aqui na Guanabara e em outros Estados, contra
aqueles que especulam, contra as dificuldades do povo, contra os que exploram o
povo, que sonegam gêneros alimentícios ou que jogam com seus preços. Ainda
ontem, dentro de associações de cúpula de classes conservadoras, ibadianos de
ontem levantaram a voz contra o Presidente pelo crime de defender o povo contra
os que o exploram na rua e em seus lares, através da exploração e da ganância.
Mas não tiram o sono as manifestações de protestos dos
gananciosos, mascaradas de frases patrióticas, mas que, na realidade, traduzem
suas esperanças e seus propósitos de restabelecer impunidade para suas
atividades antipopulares e anti-sociais. Por outro lado, não receio ser chamado
de subversivo pelo fato de proclamar – e tenho proclamado e continuarei
proclamando nos recantos da Pátria – a necessidade da revisão da Constituição.
Há necessidade, trabalhadores, da revisão da Constituição da nossa República,
que não atende mais aos anseios do povo e aos anseios do desenvolvimento desta
Nação. A Constituição atual, trabalhadores, é uma Constituição antiquada,
porque legaliza uma estrutura sócio-econômica já superada, uma estrutura
injusta e desumana. O povo quer que se amplie a democracia, quer que se ponha
fim aos privilégios de uma minoria; quer que a propriedade da terra seja
acessível a todos; que a todos seja facilitado participar da vida política do
país, através do voto, podendo votar e ser votado; que se impeça a intervenção
do poder econômico nos pleitos eleitorais e que seja assegurada à representação
de todas as correntes políticas, sem quaisquer discriminações, ideológicas ou
religiosas.
Todos, todos os brasileiros, todos têm o direito à liberdade
de opinião, de manifestar também sem temor seu pensamento. É um princípio
fundamental dos direitos do homem, contido na própria Carta das Nações Unidas,
e que temos o dever de assegurar a todos os brasileiros. Está nisso,
trabalhadores, está nisso, povo brasileiro, o sentido profundo desta grande e
incalculável multidão que presta, neste instante, sua manifestação ao
Presidente, que vem também lhe prestar conta de seus problemas, mas também de
suas atitudes e de sua convicções nas lutas que vem enfrentando, luta contra
forças poderosas, mas confiando sempre na unidade do povo e das classes
trabalhadoras, unidade que há de encurtar o caminho da nossa emancipação. É
apenas de se lamentar que parcelas ainda ponderáveis que tiveram acesso à
instrução superior continuem insensíveis, de olhos e ouvidos fechados à
realidade nacional. São, certamente, trabalhadores, os piores surdos e os
piores cegos, porque poderão com tanta surdez e com tanta cegueira, ser,
amanhã, responsáveis, perante a História, pelo sangue brasileiro que possa ser
derramado, ao pretenderem levantar obstáculos à caminhada do Brasil e à
emancipação do povo brasileiro.
De minha parte, à frente do Poder Executivo, tudo
continuarei fazendo para que o processo democrático siga o caminho pacífico,
para que sejam derrubadas as barreiras que impedem a conquista de novas etapas
e do progresso. E podeis estar certos, trabalhadores, de que juntos, governo e
povo, operários, camponeses, militares, estudantes, intelectuais e patrões
brasileiros que colocam os interesses da Pátria acima de seus interesses,
haveremos de prosseguir, e prosseguir de cabeça erguida, a caminhada da
emancipação social do país. O nosso lema, trabalhadores do Brasil, é progresso
com justiça, e desenvolvimento com igualdade. A maioria dos brasileiros já não
se conforma com a ordem social imperfeita, injusta e desumana. Os milhões que
nada têm se impacientam com a demora, já agora quase insuportável, em receber
os dividendos de um progresso tão duramente construído também com o esforço dos
trabalhadores e o sacrifício dos humildes. Vamos continuar lutando pela construção
de novas usinas, pela abertura de novas estradas, pela implantação de mais
fábricas, de novas escolas, de hospitais para o povo sofredor; mas sabemos,
trabalhadores, que nada disso terá sentido profundo se ao homem não for
assegurado o sagrado direito ao trabalho e a uma justa participação no
desenvolvimento nacional.
Não, trabalhadores; não, brasileiros: sabemos muito bem que
de nada vale ordenar a miséria neste país. Nada adianta dar-lhe aquela
aparência bem comportada com que alguns pretendem iludir e enganar o povo
brasileiro. Meus patrícios, a hora é a hora da reforma, brasileiros, reforma de
estrutura, reforma de métodos, reforma de estilo de trabalho e reforma de
objetivo para o povo brasileiro. Já sabemos que não é mais possível produzir
sem reformar, que não é mais possível admitir que esta estrutura ultrapassada
possa realizar o milagre da salvação nacional, para milhões e milhões de
brasileiros, da portentosa civilização industrial, porque dela conhecem apenas
a vida cara, as desilusões, o sofrimento e as ilusões passadas. O caminho das
reformas é o caminho do progresso e da paz social. Reformar, trabalhadores, é
solucionar pacificamente as contradições de uma ordem econômica e jurídica
superada, inteiramente superada pela realidade dos momentos em que vivemos.
Trabalhadores, acabei de assinar o decreto da Supra.
Assinei-o, meus patrícios, com o pensamento voltado para a tragédia do irmão
brasileiro que sofre no interior de nossa Pátria. Ainda não é aquela reforma
agrária pela qual lutamos. Ainda não é a reformulação do nosso panorama rural
empobrecido. Ainda não é a carta de alforria do camponês abandonado. Mas é o
primeiro passo: uma porta que se abre à solução definitiva do problema agrário
brasileiro.
O que se pretende com o decreto que considera de interesse
social, para efeito de desapropriação, as terras que ladeiam eixos rodoviários,
leitos de ferrovias, açudes públicos federais, e terras beneficiadas por obras
de saneamento da União, é tornar produtivas áreas inexploradas ou subtilizadas,
ainda submetidas a um comércio especulativo, odioso e intolerável.
Não é justo que o benefício de uma estrada, de um açude ou
de uma obra de saneamento vá servir aos interesses dos especuladores de terra,
que se apoderam das margens das estradas e dos açudes. A Rio-Bahia, por
exemplo, que custou setenta bilhões de dinheiro do povo, não deve beneficiar os
latifundiários, pela multiplicação do valor de suas propriedades, mas sim do
povo.
Não o podemos fazer, por enquanto, trabalhadores, como é de
prática corrente em todos os países do mundo civilizado: pagar a desapropriação
de terras abandonadas em títulos da dívida pública e a longo prazo.
Reforma Agrária com pagamento prévio do latifúndio
improdutivo, à vista e em dinheiro, não é reforma agrária. Reforma agrária,
como consagrado na Constituição, com pagamento prévio e a dinheiro é negócio
agrário, que interessa apenas ao latifundiário, radicalmente oposto aos
interesses do povo brasileiro. Por isso de decreto da Supra não é a reforma
agrária.
Sem reforma constitucional, trabalhadores, não há reforma
agrária autêntica. Sem emendar a Constituição, que tem acima dela o povo,
poderemos ter leis agrárias honestas e bem intencionadas, mas nenhuma delas
capaz de modificações estruturais profundas.
Graças à colaboração patriótica e técnica das nossas
gloriosas Forças Armadas, em convênios realizados com a Supra, graças a essa
colaboração, meus patrícios, espero que dentro de menos de sessenta dias já
comecem a ser divididos os latifúndios das beiras das estradas, os latifúndios
ao lado das ferrovias e dos açudes construídos com o dinheiro do povo, ao lado
das obras de saneamento realizadas com o sacrifício da Nação. E, feito isto, os
trabalhadores do campo já poderão, então, ver concretizada, embora em parte, a
sua mais sentida e justa reivindicação, aquela que lhes dará um pedaço de terra
para cultivar. Aí, então, o trabalhador e sua família irão trabalhar para si
próprios, porque até aqui eles trabalharam para o dono da terra, a quem
entregam, como aluguel, metade de sua produção. E não se diga, trabalhadores,
que há meio de se fazer à reforma sem mexer a fundo na Constituição. Em todos
os países civilizados do mundo já foi suprido do texto constitucional aquela
parte que obriga a desapropriação por interesse social, a pagamento prévio, a
pagamento em dinheiro.
No Japão de pós-guerra, há vinte anos, ainda ocupado pelas
forças aliadas vitoriosas, sob o patrocínio do comando vencedor, foram
distribuídos dois milhões e meio de hectares das melhores terras do país, com
indenizações pagas em bônus com vinte e quatro anos de prazo, juros de 3,65% ao
ano. E quem é que se lembrou de chamar o Gen. Macarthur de subversivo ou
extremista?
Na Itália, ocidental e democrática, foram distribuídos um
milhão de hectares, em números redondos, na primeira fase de uma reforma
agrária cristã e pacífica iniciada há quinze anos. Cento e cinqüenta mil
famílias foram beneficiadas.
No México, durante os anos de 1932 a 1945, foram
distribuídas trinta milhões de hectares, com pagamento das indenizações em
títulos da dívida pública, vinte anos de prazo, juros de 5% ao ano, e
desapropriação dos latifúndios com base no valor fiscal.
Na Índia foram promulgadas leis que determinam a abolição da
grande propriedade mal aproveitada, transferindo as terras para os camponeses.
Essas leis abrangem cerca de sessenta e oito milhões de hectares, ou seja, a
metade da área cultivada da Índia.
Portanto, não existe argumento capaz de poder afirmar que no
Brasil, uma nação jovem, que se projeta para o futuro, não se possa também
fazer a reforma da Constituição para a reforma agrária autêntica e verdadeira.
A reforma agrária não é capricho de um governo ou programa
de um partido. É produto da inadiável necessidade de todos os povos do mundo.
Aqui, no Brasil, constitui a legenda mais viva da esperança do nosso povo,
sobretudo daqueles que labutam no campo. A reforma agrária é também uma
imposição progressista do mercado interno, que necessita aumentar a sua
produção para sobreviver.
Os tecidos e os sapatos sobram nas prateleiras das lojas e
as nossas fábricas estão produzindo muito abaixo de sua capacidade. Ao mesmo
tempo em que isso acontece, as nossas populações mais pobres vestem farrapos e
andam descalças, porque não têm dinheiro para comprar.
Assim, a reforma agrária é indispensável, não só para
aumentar o nível de vida do homem do campo, mas, também, para dar mais trabalho
às indústrias e melhor remuneração ao trabalhador urbano.
Interessa, por isso, também a todos os industriais e aos
comerciantes. A reforma agrária é necessária, enfim, à nossa vida social e
econômica, para que o país possa progredir, em sua indústria, e no bem-estar do
seu povo.
Como garantir o direito de propriedade autêntica quando, dos
quinze milhões de brasileiros que trabalham a terra, no Brasil, apenas dois
milhões e meio são proprietários?
O que estamos pretendendo fazer no Brasil, pelo caminho da
reforma agrária, não é diferente, pois, do que se fez em todos os países
desenvolvidos do mundo. É uma etapa de progresso que precisamos conquistar e
haveremos de conquistar.
Esta manifestação deslumbrante que presenciamos é um
testemunho vivo de que a reforma agrária será conquistada para o povo
brasileiro. O próprio custo da produção, trabalhadores, o próprio custo dos
gêneros alimentícios está diretamente subordinado às relações entre o homem e a
terra. Num país em que se paga aluguéis da terra que sobem a mais de 50% da
produção obtida daquela terra, não pode haver gêneros baratos, não pode haver
tranqüilidade social. No meu Estado, por exemplo, o Estado do Dep. Leonel
Brizola, 65% da produção de arroz é obtida em terras alugadas e o arrendamento
ascende a mais de 55% do valor da produção. O que ocorre no Rio Grande é que um
arrendatário de terras para o plantio de arroz paga, em cada ano, o valor total
da terra que ele trabalhou para o proprietário. Esse inquilino rural desumano e
medieval é o grande responsável pela produção insuficiente e cara que torna
insuportável o custo de vida para as classes populares em nosso país.
A reforma agrária só prejudica uma minoria de insensíveis,
que deseja manter o povo escravo e a Nação submetida a um miserável padrão de
vida.
E é claro, trabalhadores, que só se pode iniciar uma reforma
agrária em terras economicamente aproveitáveis. É claro que não poderíamos
começar a reforma agrária, para atender os anseios do povo, nos Estados do
Amazonas ou do Pará. A reforma agrária deve ser iniciada nas terras mais
valorizadas e ao lado dos grandes centros de consumo, com transporte fácil para
o seu escoamento.
Governo nenhum, trabalhadores, povo nenhum, por maior que
seja o seu esforço, e até mesmo o seu sacrifício, poderá enfrentar o monstro
inflacionário que devora os salários, que inquieta o povo assalariado, se não
forem efetuadas as reformas de estrutura e de base exigidas pelo povo e
reclamada pela Nação.
Tenho autoridade para lutar pela reforma da atual
Constituição, porque esta reforma é indispensável e porque o seu objetivo único
e exclusivo é abrir o caminho para a solução harmônica dos problemas que
afligem o nosso povo. Não me animam, trabalhadores - e é bom que a Nação me
ouça –, quaisquer propósitos de ordem pessoal. Os grandes beneficiários das
reformas serão, acima de todos, o povo brasileiro e os governos que me
sucederão. A eles, trabalhadores, desejo entregar uma Nação engrandecida,
emancipada e cada vez mais orgulhosa de si mesma, por ter resolvido mais uma
vez, e pacificamente, os graves problemas que a História nos legou.
Dentro de 48 horas vou entregar à consideração do Congresso
Nacional à mensagem presidencial deste ano. Nela, estão claramente expressas as
intenções e os objetivos deste governo. Espero que os senhores congressistas,
em seu patriotismo, compreendam o sentido social da ação governamental, que tem
por finalidade acelerar o progresso deste país e assegurar aos brasileiros
melhores condições de vida e trabalho, pelo caminho da paz e do entendimento,
isto é, pelo caminho reformista, pacífico e democrático.
Mas estaria faltando ao meu dever se não transmitisse,
também, em nome do povo brasileiro, em nome destas cento e cinqüenta ou
duzentas mil pessoas que aqui estão, caloroso apelo ao Congresso Nacional para
que venha ao encontro das reivindicações populares, para que, em seu
patriotismo, sinta os anseios da Nação, que quer abrir caminho, pacífica e
democraticamente, para melhores dias. Mas também, trabalhadores, quero
referir-me a um outro ato que acabo de assinar, interpretando os sentimentos
nacionalistas deste país. Acabei de assinar, antes de dirigir-me para esta
grande festa cívica, o decreto de encampação de todas as refinarias
particulares.
A partir de hoje, trabalhadores brasileiros, a partir deste
instante, as refinarias de Capuava, Ipiranga, Manguinhos, Amazonas e Destilaria
Rio-Grandense passam a pertencer ao povo, passam a pertencer ao patrimônio
nacional.
Procurei, trabalhadores, depois de estudos cuidados
elaborados por órgãos técnicos, depois de estudos profundos, procurei ser fiel
ao espírito da lei que foi inspirada nos ideais patrióticos e imortais de um
brasileiro que também continua imortal em nossa alma e nosso espírito.
Ao anunciar, à frente do povo reunido em praça pública, o
decreto de encampação de todas as refinarias de petróleo particulares, desejo
prestar homenagem de respeito àquele que sempre esteve presente nos sentimentos
do nosso povo, o grande e imortal Presidente Getúlio Vargas.
O imortal e grande patriota tombou, mas o povo continua a
caminhada, guiado pelos seus ideais. E eu, particularmente, vivo hoje momento
de profunda emoção ao poder dizer que, com este ato, soube interpretar o sentimento
do povo brasileiro.
Alegra-me ver, também, o povo reunido para prestigiar
medidas como esta, da maior significação para o desenvolvimento do país e que
habilita o Brasil a aproveitar melhor as suas riquezas minerais, especialmente
as riquezas criadas pelo monopólio do petróleo. O povo estará sempre presente
nas ruas e nas praças públicas, para prestigiar um governo que pratica atos
como estes, e também para mostrar às forças reacionárias que há de continuar a
sua caminhada, no rumo da emancipação nacional.
Na mensagem que enviei à consideração do Congresso Nacional
estão igualmente consignadas duas outras reformas que o povo brasileiro
reclama, porque é exigência do nosso desenvolvimento e da nossa democracia.
Refiro-me à reforma eleitoral, à reforma ampla que permita a todos os
brasileiros maiores de 18 anos ajudar a decidir dos seus destinos, que permita
a todos os brasileiros que lutam pelo engrandecimento do país a influir nos
destinos gloriosos do Brasil. Nesta reforma, pugnamos pelo princípio democrático,
princípio democrático fundamental, de que todo alistável deve ser também
elegível.
Também está consignada na mensagem ao Congresso a reforma
universitária, reclamada pelos estudantes brasileiros, pelos universitários de
classe que sempre tem estado corajosamente na vanguarda de todos os movimentos
populares e nacionalistas.
Ao lado dessas medidas e desses decretos, o governo continua
examinando outras providências de fundamental importância para a defesa do
povo, especialmente das classes populares.
Dentro de poucas horas, outro decreto será dado ao
conhecimento da Nação. É o que vai regulamentar o preço extorsivo dos
apartamentos e residências desocupados, preços que chegam a afrontar o povo e o
Brasil, oferecidos até mediante o pagamento em dólares. Apartamento, no Brasil,
só pode e só deve ser alugado em cruzeiros, que é dinheiro do povo e a moeda
deste país. Estejam tranqüilos que dentro em breve esse decreto será uma
realidade.
E realidade há de ser também a rigorosa e implacável
fiscalização para que seja cumprido. O governo, apesar dos ataques que tem
sofrido, apesar dos insultos, não recuará um centímetro sequer na fiscalização
que vem exercendo contra a exploração do povo. E faço um apelo ao povo para que
ajude o governo na fiscalização dos exploradores do povo, que são também
exploradores do Brasil. Aqueles que desrespeitam a lei, explorando o povo – não
interessa o tamanho de sua fortuna, nem de seu poder, esteja ele em Olaria ou
na rua do Acre – hão de responder perante a lei pelo seu crime.
Aos servidores públicos da Nação, aos médicos, aos
engenheiros do serviço público, que também não me têm faltado com seu apoio e o
calor de sua solidariedade, posso afirmar que suas reivindicações justas estão
sendo objeto de estudo final e que em breve serão atendidas. Atendidas porque o
governo deseja cumprir o seu dever com aqueles que permanentemente cumprem o
seu para com o país.
Ao encerrar, trabalhadores, quero dizer que me sinto
reconfortado e retemperado para enfrentar a luta que tanto maior será contra
nós quanto mais perto estivermos do cumprimento do nosso dever. À medida que
esta luta apertar, sei que o povo também apertará sua vontade contra aqueles
que não reconhecem os direitos populares, contra aqueles que exploram o povo e
a Nação.
Sei das reações que nos esperam, mas estou tranqüilo, acima
de tudo porque sei que o povo brasileiro já está amadurecido, já tem
consciência da sua força e da sua unidade, e não faltará com seu apoio às
medidas de sentido popular e nacionalista.
Quero agradecer, mais uma vez, esta extraordinária
manifestação em que os nossos mais significativos líderes populares vieram
dialogar com o povo brasileiro, especialmente com o bravo povo carioca, a
respeito dos problemas que preocupam a Nação e afligem todos os nossos
patrícios.
Nenhuma força será capaz de impedir que o governo continue a
assegurar absoluta liberdade ao povo brasileiro. E, para isto, podemos
declarar, com orgulho, que contamos com a compreensão e o patriotismo das
bravas e gloriosas Forças Armadas da Nação.
Hoje, com o alto testemunho da Nação e com a solidariedade
do povo, reunido na praça que só ao povo pertence, o governo, que é também o
povo e que também só ao povo pertence, reafirma os seus propósitos inabaláveis
de lutar com todas as suas forças pela reforma da sociedade brasileira. Não
apenas pela reforma agrária, mas pela reforma tributária, pela reforma
eleitoral ampla, e pelo voto do analfabeto, pela elegibilidade de todos os
brasileiros, pela pureza da vida democrática, pela emancipação econômica, pela
justiça social e pelo progresso do Brasil.
Fonte: SILVA, Hélio. 1964: golpe ou contragolpe? Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 1975.