O sonho acabou. Sonho ingênuo, registre-se. Durante quase
dois anos, a oposição -quase toda ela- tentou transformar Dilma Rousseff em uma
estadista, como se vivêssemos em uma república. Ela seria mais
"institucional" que Lula. Desejava ter autonomia e se afastar do PT.
E até poderia, no limite, romper politicamente com seu criador.
Mas os fatos, sempre os fatos, atrapalharam a fantasia
construída pela oposição -e não por Dilma, a bem da verdade. Nunca na história
republicana um sucessor conversou tanto com seu antecessor. E foram muito mais
que conversas. A presidente não se encontrou com Lula para simplesmente ouvir
sugestões. Não, foi receber ordens, que a boa educação chamou de conselhos.
Para dar um ar "republicano", a maioria das
reuniões não ocorreu em Brasília. Foi em São Paulo ou em São Bernardo do Campo
que a presidente recebeu as determinações do seu criador. Os últimos
acontecimentos, estreitamente vinculados à campanha municipal, reforçaram essa
anomalia criada pelo PT, a dupla presidência.
Dilma transformou seu governo em instrumento
político-eleitoral. Cada ato está relacionado diretamente à pequena política.
Nos últimos meses, a eleição municipal acabou pautado suas ações.
Demitiu ministro para ajeitar a eleição em São Paulo. Em
rede nacional de rádio e televisão, aproveitou o Dia da Independência para
fazer propaganda eleitoral e atacar a oposição. Um telespectador desavisado
poderia achar que estava assistindo um programa eleitoral da campanha de 2010.
Mas não, quem estava na TV era a presidente do Brasil.
É o velho problema: o PT não consegue separar Estado, governo
e partido. Tudo, absolutamente tudo, tem de seguir a lógica partidária. As
instituições não passam de mera correia de transmissão do partido. Dilma chegou
a responder em nota oficial a um simples artigo de jornal que a elogiava,
tecendo amenas considerações críticas ao seu antecessor. Como uma criatura
disciplinada, retrucou, defendendo e exaltando seu criador.
O governo é ruim. O crescimento é pífio, a qualidade da
gestão dos ministros é sofrível. Os programas "estruturantes" estão
atrasados. O modelo econômico se esgotou. Edita pacotes e mais pacotes a cada
quinzena, sinal que não tem um consistente programa. E o que faz a presidente?
Cercada de auxiliares subservientes e incapazes, de Lobões, Idelis e Cardozos,
grita. Como se os gritos ocultassem os fracassos.
O Brasil que ainda cresce é aquele sem relação direta com as
ações governamentais. É graças a essa eficiência empresarial que não estamos em
uma situação ainda pior. Mas também isso tem limite. O crescimento brasileiro
do último trimestre, comparativamente com os dos outros países dos Brics
(Rússia, Índia e China) ou do Mist (México, Indonésia, Coreia do Sul e
Turquia), é decepcionante. E o governo não sabe o que fazer.
Acredita que elevar ou baixar a taxa de juros ou suspender
momentaneamente alguns impostos tem algum significado duradouro. Sem
originalidade, muito menos ousadia, não consegue pensar no novo. Somente
manteve, com um ou outro aperfeiçoamento, o que foi organizado no final do
século passado. E a oposição? Sussurra algumas críticas, quase pedindo
desculpas.
Ela tem no escândalo do mensalão um excelente instrumento
eleitoral para desgastar o governo, mas pouco faz. Não quer fazer política.
Optou por esperar que algo sobrenatural aconteça, que o governo se desmanche
sem ser combatido. Ao renunciar à política, abdica do Brasil.