O Brasil é mais impressionista do que um quadro de Monet.
Está sempre dando a impressão de uma coisa, quando é outra. Como escreveu
Merval Pereira ontem, citando o ministro Joaquim Barbosa, é o nosso jeito de “não
fazer as coisas fingindo que está fazendo”. É o país do faz de conta. Em certas
áreas então, como na Justiça, a realidade é uma ilusão de ótica mais que
enganadora. O nosso Código Penal, por exemplo, não permite que o “cumprimento
das penas privativas de liberdade” seja superior a 30 anos, mas isso não impede
que as pessoas sejam condenadas a 50, 100 anos de prisão e até mais. O
resultado na prática é que, além da clássica forma de impunidade, existe outra,
essa original: condena-se com rigor excessivo, mas se pune com tolerância
máxima, quando se pune. O nosso mais famoso bandido, Fernandinho Beira-Mar, foi
condenado recentemente a 80 anos, e suas penas somadas chegam a 200 anos de
reclusão. Mas ele vai cumprir quanto do que deve? Com certeza, nem 10%,
considerando-se os benefícios que em geral são concedidos.
O caso mais recente é o do júri do Massacre de Carandiru:
dos 26 policiais julgados, 23 receberam sentenças de 156 anos de prisão pela
morte de 13 dos 111 detentos daquela penitenciária de triste memória. A pena
impressionou os jornais estrangeiros. Que país rigoroso! Até a Anistia
Internacional celebrou o resultado, recebendo-o como um sinal de que no Brasil
a “Justiça não irá admitir abusos cometidos pela Estado contra a População
carcerária”.
Claro que a condenação foi um dado positivo, inclusive
porque contraria o pensamento bárbaro de parte da população, para quem “bandido
bom é bandido morto”. Mas não se pode esquecer que depois de aguardarem o
julgamento em liberdade por 20 anos, esses 23 réus ainda vão permanecer livres
por muito tempo. Há quem acredite que nem presos eles serão, pois haverá
apelações e recursos a instâncias superiores. “Só para chegar ao Supremo”,
calcula o diretor da ONG Conectas, Marcos Puchs, “esse caso levará dez anos”.
Sem falar que a demora pode levar à prescrição dos crimes. Moral da história:
em certos casos, a presunção de inocência funciona em favor da impunidade até
quando as provas já condenaram.
O governo já fez passar na Câmara, faltando o Senado, um
projeto que seria para evitar a proliferação de partidos. De fato os temos
demais - de aluguel, de venda, de fachada. Mas, fazendo de conta que é para
moralizar a política, tudo indica que o expediente tem um alvo certo: Marina
Silva. Sua pré-candidatura, segundo as pesquisas, é a que mais ameaça a de
Dilma.