Fica cada dia mais difícil, sinceramente, confiar na palavra
“popularidade”. O dicionário não ajuda; o que está escrito lá dentro não
combina com o que se vê aqui fora. Os institutos de pesquisa ajudam ainda menos
─ seus números informam o contrário do que mostram os fatos. As teses do PT,
enfim, não servem para nada. Garantem por exemplo, que a ladroagem, as mentiras
e a incompetência sem limites do governo só afetam uma pequena minoria que lê a
imprensa livre ─ a “direita”, os “inconformados” etc. Quando Dilma fica brava,
como agora, fingem ignorar o que está na cara de todos: que a ira popular vem
da acumulação dos desastres noticiados por essa mesmíssima imprensa.
É simples. A presidente da Republica, que continua sendo
apresentada como a governante mais popular que o Brasil jamais teve, não pode
colocar os pés num campo de futebol em Brasília. Ia fazer isso como previa o
programa oficial no jogo de abertura da Copa das Confederações no dia 15 de
junho. Desistiu ao ouvir a robusta vaia que o público lhe socou em cima logo ao
aparecer no estádio ─ e teve de ficar trancada no cercadinho das autoridades,
seu habitat protegido de sempre. Para não receber uma vaia ainda pior, também
desistiu de fazer o discurso solene escrito para a ocasião. Pergunta: se a
presidente Dilma Rousseff não pode aparecer nem falar em público, onde foi
parar aquela popularidade toda?
O problema, no caso, é que se tratava de público de verdade
─ e não desses blocos que o PT monta para fazer o papel de povo, transporta em
ônibus fretados com dinheiro público e premia com lanche grátis, em troca de
palmas para a presidente. Dilma tentou chegar perto do povo brasileiro que
existe na vida real: foi um fiasco, e ela terá de lidar agora com o pânico dos
magos da “comunicação” e “imagem” que fabricam diariamente a sua popularidade.
Há alguma coisa muito errada nisso tudo. Para que servem todas as pesquisas de
aprovação popular e a fortuna que o governo gasta em propaganda se a rua
demonstra que não está aprovando nada, nem acreditando no que a publicidade
oficial sobre o Brasil Carinhoso lhe conta?
A primeira explicação do Palácio foi uma piada: as vaias
foram dadas pela “classe média alta” que estava no estádio no dia do jogo
inicial. Mas exatamente naquela mesma hora, do lado de fora, a polícia estava
baixando o sarrafo numa multidão irada que protestava contra os gastos cada vez
mais absurdos, a inépcia e a roubalheira frenética nas obras da Copa de 2014 ─
que o ex-presidente Lula, Dilma e o PT consideram a suprema criação de seus dez
anos de governo. A essa altura, no mundo real. a casa já tinha caído. O Brasil
Carinhoso que existe nas fantasias do governo havia cedido lugar, desde a
semana anterior ao Brasil Nervoso que existe na realidade ─ nervoso,
enraivecido, violento, destrutivo, irracional e exasperado contra tudo o que
acontece de ruim no seu cotidiano.
Sua revolta começou contra um aumento de 20 centavos nas
passagens de ônibus de São Paulo, decidido pela estrela ascendente do PT o
prefeito Fernando Haddad. Abriu espaço, como sempre, para marginais ─ gente que
quebra tudo, incendeia e rouba TVs de tela plana de lojas saqueadas. Vazou
rapidamente para outras trinta grandes cidades e continuou durante toda a
semana passada, já envolvendo um universo de 250.000 pessoas, ou mais, e
colocando à luz do sol uma revolta que ia muito além de protestos contra
tarifas de transporte e atos criminais. Seu recado foi claro: o rei está nu.
O povo está dizendo que este rei — o governo de farsa
montado por Lula há mais de dez anos — rouba, mente, desperdiça, não trabalha,
trapaceia, vai para a cama com empreiteiros de obras, entrega-se a escroques,
cobra cada vez mais imposto e fornece serviços públicos que são um insulto ao
país. Acha que pode comprar o povo com fornos de micro-ondas e outros
badulaques de marquetagem. É covarde e hipócrita: depois de provar por A + B
que o aumento das passagens era indispensável, a prefeitura paulistana,
apavorada provou por A + B que não era, e cedeu a quem chamava de
“baderneiros”.
Dilma por sua vez, elogiou a todos, dos manifestantes à
polícia, e correu para pedir instruções a Lula — mas não admitiu que seu
governo tenha a mais remota culpa por qualquer das desgraças que levaram o povo
às ruas. Espera que a revolta se desfaça sozinha como em geral acontece com
movimentos que não têm objetivos claros, liderança e disciplina — e volte à sua
sagrada popularidade. Pode ser mais difícil, desta vez.