Durante décadas ouvimos e lemos sobre os anos de chumbo, quando o Estado de São Paulo altaneiramente enfrentou a censura.
Ouvimos diatribes sobre a mão de ferro do regime. Hoje há uma lista de pessoas, dos quais os mais flagrantes são Carlos Heitor Cony, Ziraldo e Jaguar, pensionistas do atual governo, que alegadamente teriam tido suas carreiras cerceadas pelo regime de exceção, que se calam ante o ataque à liberdade de expressão nestes três meses em que se aplica um zíper à boca do Estadão.
Vemos intelectuais do mundo inteiro e do Brasil deblaterar contra uma CPI que avalie as agressões à liberdade realizadas pelo MST.
Vemos pessoas indubitavelmente capazes de raciocínio que nunca hesitaram em criticar Fernando Henrique Cardoso mas agora permanecem silenciosos ante os desmandos no Brasil, ante a derrocada das liberdades na Venezuela, ante o visível extermínio da capacidade de produzir alimentos daquele país, ante atos pueris como a nacionalização de um hotel, em um ato que nada contribui para o seu progresso (aliás, talvez essas vozes silenciosas estejam se regozijando ante os futuros convites para estadias gratuitas naquele estabelecimento, sem lembrar que de Cuba à antiga União Soviética, os estados comunistas nunca conseguiram manter a qualidade da hotelaria – passa a ser uma atividade subserviente, destinada aos quadros mais incompetentes do partido).
Repito tudo isto, sobre o Brasil e sobre os países vizinho, lembrando que há muito mais, que já está sendo dito em muitos blogs e newsletters, para declarar categoricamente. Hoje está muito claro. Os batalhadores contra o regime de 1964 o faziam por vaidade. Acirravam os ânimos, causaram a longevidade do regime militar para sentirem-se bravos batalhadores. Raros dentre os sobreviventes tiveram perdas reais. Nenhum deles soube recusar uma “compensação de guerra”, mesmo os mais prósperos dentre eles. Me desculpem os poucos, que tenho certeza existem, que altaneiramente recusaram alguma compensação por perdas decorrentes de posições tomadas naqueles vinte e poucos anos. Estes fizeram o que acreditavam ser seu dever, e o fizeram no mesmo espírito em que aos dezoito anos de idade cumpriam o dever do serviço militar. Viam uma obrigação nisto. Mas a maioria encara o atual momento com o espírito cartaginês. “VaeVicti”, ai dos vencidos. Não vêem espaço nom obrigação de preservarem posições morais ou éticas.
Hoje, decorridos outros 23 anos, ou seja, período igual ou maior ao do regime militar, com uma constituição em vigor, cuja elaboração os líderes do atual governo menosprezaram, apesar de terem disputado eleições para serem membros da constituinte, mas que em última instância devia nortear as liberdades no país, vemos o direito à expressão, o direito à propriedade, o direito à segurança, o direito à saúde serem preteridos.
Quero saber se um dia veremos um manifesto assinado pelas vozes das décadas de sessenta e setenta levantadas contra a bagunça que aí está. Não precisam abandonar seus ideais. Apenas precisam ser corretos e leais. Durante vinte anos protestaram os “casuísmos” que enxergaram no regime. E agora, prósperos, homenageados, paparicados, recusam-se a reconhecer as injustiças, roubos, assassinatos e malversações de seus camaradas.
Houve um tempo em que se podia esperar que as pessoas de sessenta ou setenta anos tinham algo a demonstrar aos mais jovens em termo de bom senso, experiência e até coragem moral. A maioria dos velhos combatentes dos anos mil novecentos e sessenta e setenta está nessa faixa etária. Mas nos desaponta. Não lembram em nada aqueles velhos combatentes franceses que em 1939 vestiam suas fardas das batalhas do Somme e de Verdun em 1914-18 e vinham instar com o exército que os aceitasse de volta à fileiras.
São frouxos, aproveitadores, indivíduos indignos de qualquer consideração.