A presidente Dilma Rousseff definitivamente rebaixou o
Brasil à condição de cúmplice de regimes autoritários na América Latina. Não
bastasse a reverência (e o vasto financiamento) à ditadura cubana, Dilma agora
manobra para que os atos criminosos do governo de Nicolás Maduro contra seus
opositores na Venezuela ganhem verniz de legitimidade política.
Em vez de honrar as tradições do Itamaraty e cobrar do
regime chavista respeito aos direitos humanos e às instituições democráticas, a
presidente desidratou a única iniciativa capaz de denunciar, em um importante
fórum internacional, a sangrenta repressão na Venezuela, que já matou duas
dezenas de pessoas. Mandou o representante do Brasil na Organização dos Estados
Americanos (OEA) votar contra o envio de uma missão de observadores à Venezuela
e impediu que a entidade reunisse seus chanceleres para discutir a crise.
Como todos os líderes populistas da região, Dilma considera
que a OEA é quintal dos Estados Unidos. O falecido caudilho Hugo Chávez
costumava referir-se à organização como "instrumento do
imperialismo", entre outros nomes menos simpáticos. Para o governo
petista, contaminado pelos ares bolivarianos, uma decisão da OEA sobre a
Venezuela poderia ser considerada inoportuna e com potencial para acirrar as
tensões. Assim, a título de não melindrar Maduro, premiam-se a brutalidade e a
indisposição para o verdadeiro diálogo democrático.
Manietada pelo Brasil e por seus parceiros bolivarianos, a
OEA limitou-se a emitir uma nota cuja anodinia mal disfarça a tentação de
apoiar Maduro. O comunicado manifesta "solidariedade" ao presidente e
dá "pleno respaldo (...) às iniciativas e aos esforços do governo
democraticamente eleito da Venezuela" no "processo de diálogo
nacional" - como se fosse autêntica a pantomima a que os chavistas chamam
de "Conferência de Paz". Estados Unidos, Canadá e Panamá votaram
contra essa nota, pela razão óbvia de ela não refletir os compromissos da OEA
com a democracia e os direitos humanos.
O passo seguinte da manobra, este ainda mais escandaloso,
foi convocar uma reunião de chanceleres da União de Nações Sul-Americanas
(Unasul) para acertar o envio de um grupo de "mediadores" para a
Venezuela. A Unasul, como se sabe, é instrumento dos governos bolivarianos -
desimportante, ela hoje só existe para dar reconhecimento a governos claramente
antidemocráticos, em nome de uma certa "integração latino-americana".
Assim, os tais "mediadores" da Unasul não farão
nada além do que deles se espera, isto é, fazer vista grossa às ações violentas
de Maduro. Ao anunciar a iniciativa, Dilma explicou, em seu linguajar peculiar,
que a ideia é "fazer a interlocução pela construção de um ambiente de
acordo, consenso, estabilidade, lá na Venezuela". Ora, que
"diálogo" é possível quando não se pretende exercer a necessária
pressão diplomática sobre Maduro, que reprime manifestantes usando gangues
criminosas e encarcera dissidentes sem o devido processo legal?
Portanto, a constituição de uma comissão na Unasul para a
Venezuela tem o único objetivo de deixar Maduro à vontade, sem ser constrangido
a recuar e a ouvir as reivindicações da oposição - que basicamente protesta
contra a destruição da Venezuela pelo "socialismo do século 21".
Percebendo o truque, os oposicionistas venezuelanos trataram
de enviar uma carta à Unasul em que pedem aos países-membros que observem os
acontecimentos no país "com objetividade" e que a entidade "não
seja usada como um instrumento de propaganda". Mas é justamente disso que
se trata: se tudo ocorrer conforme o script bolivariano, a Unasul vai respaldar
o governo Maduro, revestindo-o de legitimidade - o que, por conseguinte,
transforma a oposição em golpista.
Ao tratar de forma leviana este grave momento, em respeito a
interesses que nada têm a ver com a preservação da ordem democrática na região,
o Brasil torna-se corresponsável pela consolidação de um regime delinquente.