Dia 28 de fevereiro deveria ser feriado nacional, com direito
a hasteamento da bandeira, execução do hino e celebração de culto ecumênico em
praça pública. A comemoração impediria que os governantes de plantão se
esquecessem da maior vitória da sociedade brasileira na segunda metade do
século 20. Fato que mudou a vida dos brasileiros e se tornou conquista tão
importante que, ao maltratá-la ou descurar de preservá-la, a autoridade corre o
risco de receber o devido troco nas urnas.
Trata-se do tiro de morte na hiperinflação, que muitos
comemoram em 1º de julho, data em que entraram em circulação as primeiras notas
e moedas do real. Mas foi no último dia de fevereiro de 1994, há 20 anos,
portanto, que o Brasil começou a deixar para trás longo e desafortunado período
de inflação acelerada. Naquela data, foi publicada a Medida Provisória nº 434,
instituindo a unidade real de valor (URV), moeda virtual que não circulava, mas
servia como padrão do valor monetário.
Uma equipe de então jovens, mas já experientes economistas,
criou a passagem para a moeda definitiva. Mas foi a maioria da população quem
fez o milagre. A inflação andava perto dos 40% ao mês e vários planos
econômicos tinham fracassado, desgastando a crença na capacidade do governo de
cuidar do monstro alimentado durante décadas com rações de correção monetária e
gastos públicos sem medida.
Mas o que precisa ser homenageado, não apenas na
sexta-feira, mas todos os dias, é a capacidade do brasileiro de aprender. A
população já tinha entendido que a inflação só é boa para os próprios
governantes e para quem tem dinheiro, que pode ganhar com aplicações
financeiras.
Para o comum dos brasileiros, a inflação é imposto perverso,
que retira poder de compra dos salários sem dar nada em troca. Para o
administrador público, não há perdas, só ganhos. Afinal, os impostos acompanham
a corrida dos preços e basta atrasar dois ou três meses a correção dos salários
para “gerar” boa reserva e, com ela, inaugurar obras que rendem votos.
Não foi só isso que o cidadão aprendeu. No dia seguinte à
publicação da MP 434, já havia vendedores ambulantes explicando aos menos
atentos que a URV era o dólar e, por isso, valeria sempre 1, mas seriam
necessários mais cruzeiros reais para comprá-la, se ela estivesse à venda.
Naquela dia, a URV era “cotada” a CR$ 647,50, e, em julho, quando foi
transformada em real, CR$ 2.750.
Desde então, o brasileiro adicionou a moeda aos símbolos
nacionais que realmente preza, como o hino e a bandeira. O orgulho nacional não
tolera que estrangeiros falem mal do Brasil. Já ao hino e à bandeira nem a
brasileiro é permitido outro sentimento que não seja a paixão irrefreável. Do
valor da moeda temos aprendido a não abrir mão e é bom que os governantes se
lembrem de que, nesse caso, a famosa falta de memória do povo não vigora.
A conquista de uma moeda decente e sua preservação não é,
portanto, obra de um governo ou partido. É patrimônio da sociedade. Daí o preço
eleitoral a pagar por quem descurar da austeridade com o gasto público e da
política monetária adequada ao combate sem trégua do aumento de preços. É isso
que, à falta da decretação do feriado da URV, precisa ser lembrado todos os
dias aos que pensam em colocar o efêmero sucesso nas urnas à frente das prioridades
do povo.