Depois da partida de sexta-feira, em que o Brasil venceu a
Colômbia e perdeu Neymar, a equipe da presidente Dilma Rousseff programou para
daí a três dias um bate-papo entre ela e internautas sobre um único e óbvio
assunto: a Copa. Tanto se tratava de uma jogada eleitoral que a primeira ideia
foi usar a página que o PT administra na rede social em nome da candidata. Aí,
abandonando-se ao cinismo, resolveram dar um tom “institucional” à marquetagem,
transferindo a conversa para a página oficial da Presidência da República.
Foi tudo confeccionado para parecer uma interlocução natural
entre a dirigente do País e cidadãos-torcedores, na véspera da penúltima das
sete etapas que a seleção precisa superar para chegar ao hexa. Mas a manobra
apenas serviu de escada para Dilma subir o tom dos ataques aos seus críticos,
apropriar-se do bom andamento do Campeonato, como se fosse mais uma das
incontáveis realizações fictícias do seu governo, e forçar uma identificação,
para brasileiro ver, com o craque excluído das finais. “Dilmar” não se limitou
a soltar o verbo fácil e ensaiado dos elogios ao ídolo “guerreiro” e da
comunhão com a sua dor ao ser atingido, que “feriu o coração de todos os brasileiros”.
Mandando às favas o senso de ridículo que manda o respeito
que se lhe atribua, colocou na internet uma foto em que aparece apoiando o
braço esquerdo sobre o punho do direito, numa simulação patética do “É tóis”.
Trata-se do divertido gesto que Neymar inventou para ilustrar a sua versão do
dito “É nóis”, que se tornou uma das marcas desse jovem sempre criativo dentro
e fora das quatro linhas. Bem que a presidente, ela mesma, avisou há pouco mais
de um ano: “Podemos fazer o diabo quando é hora de eleição”. Infernal, festejou
a “belezura” que enxerga no torneio apenas para distribuir caneladas, chamando
os adversários, grosseiramente, de “urubus”.
Ela os culpa pelo “indevido pessimismo” que antecedeu a
Copa. Indevido por quê? A imprensa - a ré que ela se guardou de nominar - deu
margem, sim, a fundamentadas dúvidas sobre o preparo do País para acolher o
mais popular evento esportivo do mundo, ao descobrir, divulgar e debater os
muitos malfeitos (em todos os sentidos do termo) que precederam a competição.
Não fez mais do que o seu dever. Se isso ressoou no Planalto como
oposicionismo, nada mais adequado, também. “Jornalismo é oposição”, dizia o
genial Millôr Fernandes (1923-2012). “O resto é armazém de secos e molhados.”
Se, afinal, tudo acabou bem - descontado o viaduto que desabou em Belo
Horizonte, matando dois -, tanto melhor. Mas não foi por obra e graça da
presidente.
Esperta, Sua Excelência. Em dado momento do chat, para
desdenhar das críticas, ela equiparou as previsões pessimistas em relação à Copa
às que cercam, com mais razão ainda, o desempenho da economia este ano. A taxa
do PIB em 12 meses mal supera 1%. Ninguém com a cabeça minimamente no lugar
aposta numa metamorfose que redima os desastres da política econômica. Mas - e
aí reside a esperteza dilmista - o resultado final do ano só será conhecido em
começos de 2015. A essa altura, a presidente ou terá sido reeleita ou terá
deixado o Planalto. Em qualquer hipótese, não haverá quem perca o seu tempo lhe
cobrando o despropósito de agora.
Bem pensadas as coisas, o empenho da candidata em tirar
proveito eleitoral da festa esportiva, para não falar do que fará se a seleção
for campeã, parece ignorar dois fatos básicos. De um lado, se é verdade que
aumentou a adesão popular à realização do evento no Brasil - ajudando a
presidente a subir três pontos na mais recente pesquisa -, é verdade também
que, na casa de 63%, o apoio à Copa seria notável nos Estados Unidos, digamos,
mas está aquém do que se poderia esperar no país do futebol, na pátria em chuteiras.
De outro lado, não há relação previsível entre o desfecho do Campeonato e o da
disputa nas urnas. O Brasil pode ganhar, e Dilma perder. Ou vice-versa. Seja lá
o que se possa supor a respeito está confinado ao rarefeito espaço das
probabilidades.
Oitenta e quatro dias separam a final do próximo domingo e a
votação no primeiro domingo de outubro. Esses são, metaforicamente, os 90
minutos decisivos.