segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Denis Lerrer Rosenfield: Perguntas impertinentes

Marina Silva já está colocada como alternativa efetiva de poder. Suas ideias, porém, têm se caracterizado por extrema generalidade, como se a prática de governar não exigisse atitudes concretas e bem orientadas. Ela oscila entre um liberalismo do ponto de vista da política econômico-financeira e posições de convicção anticapitalista, atentando contra o direito de propriedade, passando por hesitações entre posturas conservadores ou ditas progressistas em relação aos costumes.

Apesar disso, vem usufruindo extrema complacência de certos setores de jornalistas e formadores de opinião, como se fosse uma desconhecida que apenas agora deveria apresentar suas ideias. Outros ainda falam de sua inexperiência, quando há toda uma experiência dela envolvida, realizada quando de sua passagem pelo Ministério do Meio Ambiente (2003-2008) e como senadora (1994-2002). É aí precisamente que devermos buscar suas ideias, que contrastam com atitude recente, como quando disse, sem ruborizar, no Jornal Nacional que nunca foi contra os transgênicos. Basta consultar os jornais da época para expor a falsidade de tal afirmação.

Se for coerente com suas ideias, há vários setores econômicos que serão prejudicados: agricultura, pecuária, agronegócio, mineração, construção civil, shopping centers, hotelaria em zonas rurais e litorâneas, estradas e rodovias, hidrelétricas e empresas de energia em geral, empresas de transgênicos, de tabaco e sua cadeia de agricultura familiar de cultivo, armas e munições e bebidas alcoólicas em geral. O impacto econômico dessas ideias pode ser grande, em todo distinto de suas posições “liberais”. Seria um liberalismo sustentado pela relativização do direito de propriedade! Vejamos alguns desses pontos.

Movimentos sociais - Marina Silva é egressa desses movimentos, que apoia, compartilhando os mesmos princípios. Sua posição, neste quesito, é anticapitalista. Sustentou no passado as invasões do MST, sendo firme partidária do que essa organização política entende como “reforma agrária”. Isso significa que, caso vença a eleição, voltam à pauta a questão dos índices de produtividade, como já foi anunciado em seu programa de governo, e a desapropriação de imóveis rurais, praticamente parada nestes anos de governo Dilma. Note-se que no atual governo a ênfase foi corretamente posta na qualificação dos assentamentos da reforma agrária e em soluções negociadas de conflitos. Ainda no tocante aos movimentos sociais, considera a candidata apoiar o MTST, cuja política é voltada para o “acúmulo de forças” na luta contra o capitalismo, como reconhece seu líder, na sua cruzada contra a economia de mercado e o direito de propriedade? As invasões de propriedades urbanas seriam “justificadas”?

Código Florestal - Marina foi e continua sendo fervorosa adversária do novo código. Tudo fez, com apoio de ONGs nacionais e internacionais, para que não fosse aprovado. Consumada a aprovação, considera-o um retrocesso que deveria ser corrigido. Logo, se eleita presidente, passaria a rever a nova legislação, apregoando uma volta ao passado, com todas as suas restrições e limitações? As ONGs, então, voltariam com toda a força, resgatando o poder que tiveram quando ela esteve à frente do Ministério do Meio Ambiente? Convém lembrar que seus auxiliares mais diretos e influentes foram recrutados em ONGs, nacionais e internacionais. A situação, caso eleita, se repetirá?

Questão indígena - Marina Silva é firme partidária da atual política indigenista conduzida pela Funai, com forte viés anticapitalista e profundo desrespeito ao direito de propriedade. Esse órgão não hesita em ir contra o Estado Democrático de Direito, tampouco segue a jurisprudência estabelecida pelo Supremo Tribunal Federal quando do julgamento do caso da Raposa-Serra do Sol. Marina presidente só faria, então, intensificar essa orientação, com a multiplicação de invasões no País e a expropriação de terras? (Desapropriações indígenas não pagam pela terra nua, só pelas benfeitorias.) É favorável a que a Funai permaneça como está, uma espécie de Estado dentro do Estado?

Energia - A candidata já se manifestou inúmeras vezes contra a construção de usinas hidrelétricas na Amazônia, vitais para o desenvolvimento do País. Belo Monte tornou-se um símbolo desses confrontos. Qual a sua posição agora? Deve esse empreendimento parar, obedecendo às injunções de movimentos sociais e ONGs ambientalistas e indigenistas? Outras usinas seriam construídas na região?

Ciência e transgenia - Quando ministra do Meio Ambiente, a candidata foi inimiga dos transgênicos, advogando por sua não produção e comercialização, até se opondo à pesquisa, na CTNBio. Frise-se: contra a pesquisa, independentemente de sua comercialização. Sua posição era claramente contra a ciência. E tudo o que se refere à transgenia foi demonizado. Defendia-se dizendo ser favorável ao princípio da precaução, quando se tratava de nada mais que uma justificativa baseada no princípio da inação. Se foi favorável a algo, consistiu na multiplicação de trâmites burocráticos que terminariam tornando inviável qualquer investimento.


Campanha - Na campanha política de Marina, assim como no estatuto de sua Rede, há uma interdição ao apoio financeiro de empresas de tabaco, armas e munições e bebidas alcoólicas. Logo, se eleita, tudo faria para restringir legal e comercialmente (via impostos) a atividade de empresas desses setores? Convém lembrar que são setores com ampla cadeia produtiva, de forma que o impacto sobre eles se disseminaria para vasta gama de outros setores, da produção à comercialização. Ademais, são atividades econômicas legais, constitucionalmente reconhecidas. O que, então, têm de “sujo”, como se as doações pudessem manchar sua candidatura?