Marqueteiro do Papa deve ter feito o cálculo certeiro: nada
mais progressista do que um líder católico defendendo o Islamismo
Depois que Dilma Rousseff tomou posse defendendo a
Petrobras, qualquer piada está liberada — inclusive as que envolvem Maomé. Os
facínoras do Estado Islâmico e da al-Qaeda não têm ideia do nível de escárnio a
que os brasileiros estão submetidos cotidianamente. O PT monta o maior sistema
de pilhagem já visto na República e a presidente conclama o país a um pacto
contra a corrupção. Entenderam o que é achincalhe, queridos sanguinários de
Alá?
A sorte dos picaretas do Ocidente e do Oriente é que a
opinião pública continua dormindo seu sono das mil e uma noites. Para se ter
uma ideia, o mundo culto está discutindo há mais de uma semana a legitimidade
de um massacre. Isto é em si uma piada — mas não ria, porque vão te acusar de
sacrilégio. O pensamento morreu. Você não vale mais o quanto pensa, vale a
bandeira que levanta. Então, não perca tempo: repita também, como um brado no
Ipiranga, que o Islã é legal e matar os outros não é legal. Pronto, você está
no altar do jardim de infância global.
Daqui para frente, o mundo terá que ser legendado, para
facilitar a compreensão. Chico Caruso já deu a senha no GLOBO: uma charge de
Maomé com as inscrições “este não é Maomé” e “isto é um desenho de humor”.
Perde um pouco a graça, porque os heroicos defensores de Charlie, do Islamismo,
do humanismo e do bom-mocismo ficam sem bateria para esgrimir seu óbvio
fulgurante. Mas reduz a ameaça — dos terroristas e, principalmente, dos
pernósticos.
Talvez uma das figuras mais representativas deste momento
esquisito seja o Papa Francisco. Sua Santidade tem provavelmente uma espécie de
João Santana ao pé do ouvido, para soprar-lhe as últimas tendências do mercado.
Foi assim que o líder máximo da Igreja Católica mergulhou na causa gay. Vamos
tentar legendar. A defesa dos direitos dos gays não é só importante, é urgente.
Trata-se de derrubar um muro de hipocrisia que faz muita gente sofrer à toa.
Mas e o Papa com isso?
Bem, Francisco também pode achar que é uma causa urgente. Só
que ele lidera uma Igreja cuja doutrina não aceita o homossexualismo. Não
aceita nem a camisinha! No Catolicismo, o sexo tem que ter fins reprodutivos.
Quando a Igreja Católica aceitará uma família gay, com dois pais ou duas mães?
Talvez semana que vem — desde que ela destrua alguns de seus pilares e erga
outros em seus lugares, ou seja, que refunde a si mesma. Só que, em geral, isso
não é uma questão de dias, mas de séculos. Ou seja, o Papa bonzinho está
jogando para a arquibancada.
Mas a plateia ama. Lembra até um pouco Lula, o Papa
brasileiro, quando assumiu o governo mantendo as diretrizes econômicas do
antecessor (porque não é bobo) e gritando contra os juros altos. Inaugurou o
primeiro governo de oposição da História, e não saiu mais de lá.
Depois do atentado em Paris, a reunião no departamento de
marketing do Vaticano deve ter fervido. Francisco tinha ali várias causas
bondosas para escolher. Demorou um pouco, mas saiu a decisão: o Papa defendeu o
Islã contra as ofensas dos chargistas franceses — uma posição candidamente
desastrosa. O marqueteiro de Francisco deve ter feito o cálculo certeiro: nada
mais surpreendente, exótico e progressista do que um líder católico defendendo
o Islamismo. E ainda soltou a pérola: “Liberdade de expressão tem limite”.
Não, Francisco. Não tem. Seria como declarar que democracia
tem limite. O que deve ser limitado — e já é, pela lei — é a expressão
criminosa ou lesiva, não a liberdade. Está vendo como é dura a vida do
populista? Esse negócio de ficar levantando bandeiras não é fácil, a gente
acaba se atrapalhando mesmo.
Nesse aspecto, o PT é muito mais profissional. Eles não
inventam. São os heróis da resistência contra a ditadura e a direita, e fim de
papo. Essa tecla única já lhes rendeu 12 anos de paraíso parasitário. Depois de
avançar no Banco do Brasil e compor a obra-prima do mensalão (que,
incrivelmente, não os tirou do poder), depenaram a Petrobras sem perder o
rebolado: a culpa é da oposição neoliberal que quer privatizar o que é nosso.
Contando, ninguém acredita. Nem com legenda.
A indústria da demagogia não para de crescer. Acenda um
cigarro na praia e aguarde a reprovação do vizinho. Ele aprendeu que o
tabagismo é contra a cidadania. E a sua fumaça a céu aberto pode ensejar um
brado civilizatório, dependendo da direção do vento. A Lei Seca é outro fenômeno.
Seria bem mais eficiente se fosse móvel e caçasse as condutas suspeitas (dos
que a evitam facilmente pelo Twitter). Mas fica ali naquela blitz teatral,
travando a cidade e constrangendo uma maioria de não-alcoolizados — detidos e
investigados como num Estado policial. É um abuso, mas o cidadão resolveu achar
que é a sua única chance de sobrevivência.
O mais curioso é identificar, na turma do “Je suis Charlie”,
várias das vozes que simpatizaram com a boçalidade dos black blocs. Violência é
violência — mas o véu da demagogia a tudo abençoa. Os plantonistas da bondade
bem que podiam sair do armário e bradar: “Je suis demagogô”.