A economia está fazendo água — e, desde o tempo das
cavernas, é quando ela bate na linha da cintura que o homem começa a nadar. O
pibinho vai descendo a níveis siberianos, a inflação mesmo maquiada rompe a
fronteira dos 7%, o dragão domestico pelo Plano Real soluça nas cercanias dos
dois dígitos. O rombo nas contas públicas é de assustar esquerdista grego, os
juros sobrevoam a estratosfera, o desemprego cresce, a alta do dólar escancara
a desconfiança mundial no Brasil.
O que Dilma faz para escapar do afogamento nessas cataratas
de más notícias? Conversa mais com Joaquim Levy, para afinar-se com o ministro
da Fazenda emparedado pela idiotia do PT, pela gula da base alugada, por
“movimentos sociais” estacionados no século 19, pela sede dos ministros que bebem verbas? Nada
disso. Em vez de socorrer-se do economista criticado não pelos defeitos, mas
pelas virtudes que tem, a doutora em nada pede conselhos a Lula e encomenda
ideias a João Santana.
O edifício lulopetista
está sitiado por rachaduras internas e fraturas expostas nos alicerces.
A bancada fiel a Dilma na Câmara é insuficiente para eleger um vereador de
grotão. No Senado, os contratos com o grupo de Renan Calheiros são tão
confiáveis quanto os prazos do PAC. O “núcleo íntimo do Planalto” é mais uma
reedição piorada dos Três Patetas.
Sem porta-vozes capazes de andar e mascar chicletes ao mesmo
tempo nem interlocutores, sem interlocutores com paciência para decifrar a
mulher que fala dimês, que faz o neurônio solitário? Livra-se do cerco dos
áulicos que a bajulam desde que virou a favorita do chefe? Tenta aprender com
quem sabe? Nada disso. Encomenda ideias ao padrinho e pede conselhos ao
marqueteiro do reino.
A pesquisa divulgada neste fevereiro pelo Datafolha
reafirmou a trágica contemporaneidade da lição ministrada por Mário de Andrade,
há quase 90 anos, pela boca do personagem Macunaíma: “Muita saúva e pouca
saúde, os males do Brasil são”. Para os entrevistados, o segundo maior problema
do país é a corrupção amamentada pelo Planalto. Na liderança do ranking
continua o sistema de atendimento à saúde que Lula, cliente VIP do Sírio
Libanês, qualificou de “perto da perfeição”.
Perto da perfeição chegaram, isto sim, os bandidos de
estimação cevados desde o dia da posse pelo chefe-supremo de todas as
bandalheiras. As saúvas perderam a compostura em Santo André, perderam o juízo
no Mensalão, perderam a vergonha no Petrolão. Em parceria com Dilma, Lula
transformou o Brasil Maravilha num viveiro de quadrilhas impunes. Todas
roubaram muito. Nenhuma roubou tanto quanto a desbaratada pela Operação Lava
Jato, devassada por procuradores federais e exemplarmente enquadrada pelo juíz
Sérgio Moro.
As investigações estão chegando aos peixes graúdos. José
Dirceu (codinome Bob) e Antônio Palocci, por exemplo, acabam de entrar em cena.
É iminente a subida ao palco do astro principal. Se não fosse tão indigente o
material aproveitável na cabeça baldia de Lula, se Dilma ao menos suspeitasse
da própria mediocridade, se Santana soubesse rir de si próprio, os três
estariam imersos numa demorada releitura da pesquisa. O Datafolha traduziu em
algarismos e índices o retrato dramaticamente revelador esboçado pelas urnas de
outubro.
A presidente se reelegeu a bordo das tapeações de mágicos de
picadeiro, nas falácias dos coronéis com topete implantado, nas vigarices e
violências colecionadas pelas diversas ramificações que compõem o Grande Clube
dos Cafajestes no Poder. Em pouco mais de um mês, o coro dos contentes ficou
afônico, os truques deixaram de funcionar, a taxa de popularidade de Dilma foi
devastada pelo raquitismo.
A rainha de João Santana está nua. Dilma é considerada falsa
por 47% dos brasileiros, desonesta por 54% e indecisa por 50%. Para 52%, a
presidente sabia da corrupção na Petrobras e deixou que ela ocorresse.
Confrontada com tantas estatísticas pressagas, o que faz a chefe de governo?
Tenta tomar distância dos delinquentes irrecuperáveis? Esquece no guarda-roupa as
fantasias esfarrapadas?
Nada disso. Chama para encontros a sós os comparsas de
sempre e gasta horas em sussurros com equilibristas manetas, contadores de
lorotas de botequim, vigaristas incapazes de renovar o estoque de embustes. O
Brasil está mudando. Os velhacos só ficam mais velhos. Lula declara guerra à
misteriosa entidade que batizou de “eles”, Dilma diz que a ladroagem na
Petrobras é coisa de imperialistas americanos, João Santana delira com pátrias
educadoras.
Nenhuma farsa dura para sempre. Em parceria, Lula e Dilma
enganaram milhões de paspalhos com o país autos0suficiente em petróleo que
importa um oceano de barris por ano, com as colossais jazidas do pré-sal que
continuam nos abismos do Atlântico, com a nação que apesar da erradicação dos miseráveis
tem andrajos hasteados em todas as esquinas, fora o resto. A terra dos abúlicos
está farta de tanto cinismo.
O palanque ambulante está desgovernado. Dilma é só um poste
instalado no Planalto para fazer o que o mestre mandar. Os mais de 51 milhões de
brasileiros que votaram contra o PT riscaram um ponto de não-retorno. Dilma já
completou mais de um mês sem abrir a boca e alguns anos sem dizer coisa com
coisa. Lula é o único campeão das urnas que jamais venceu uma eleição
majoritária no primeiro turno.
É também o único líder de massas que desde a vaia no
Maracanã no Pan-2007 só se apresenta para plateias amestradas.Se for
candidato em 2018, vai descobrir que os entrevistadores já não poupam
espertalhões. Terá de explicar-se sobre o Caso Rose. Terá de escapar da
montanha de provas que o vinculam às safadezas na Petrobras. Se disser que nada
viu e nada sabe, será desmoralizado pela gargalhada nacional.
É inútil berrar refrões grisalhos contra o imperialismo
ianque, a direita golpista, a oposição conservadora. Ladrões não desfraldam
bandeiras; abrem contas em paraísos fiscais. Por tudo isso, impeachment
tornou-se palavra de uso corrente. Taxistas e feirantes conhecem a pronúncia e
o significado. Só assusta os gigolôs da “governabilidade”. Em regimes democráticos,
nunca foi problema. É solução.
Dilma, Lula e Santana não deveriam perder tempo trocando
ideias que não têm. A trindade nada santa faria um favor a si própria se saísse
à caça de álibis que até agora não há.