O politicamente correto possui, também, consequências
econômicas, atingindo empresas, agricultores, empregos e renda
O politicamente correto tornou-se uma praga a corroer
valores, embora o faça em nome de supostos valores mais elevados. Procura-se
atingir a liberdade de escolha, em nome da saúde ou de qualquer outro suposto
valor, tomado a esmo, como se assim a sociedade fosse capaz de se organizar
“melhor”. O “bem” e o “melhor” ganham, então, o seu significado dos que se
dizem seus "representantes", como se esses fossem a concretização de
um valor maior.
A liberdade de autodefesa dos cidadãos é anulada em função
de uma regulamentação sustentada por poucos, que nem se dão ao trabalho de
justificar o desrespeito ao resultado do referendo sobre o desarmamento. Os
habitantes do país ficam à mercê de criminosos e ao sabor de estatísticas
incorretas, como se os “crimes” tivessem sido reduzidos graças a essa nova
regulamentação. Por que não acatar um referendo ou fazer um novo, dando aos
cidadãos o direito de decidirem por si mesmos?
A liberdade de escolha, de fumar e de beber, está sendo
progressivamente restringida, sendo que a primeira delas é uma espécie de
cavalo de batalha, que, se bem-sucedida, terá consequências ainda maiores em
outros campos da liberdade individual. Atividades economicamente lícitas e
reconhecidas constitucionalmente começam a ser tidas por “transgressoras”, como
se fosse um ato de transgressão seguir as leis deste país. O moralismo do
politicamente correto toma o lugar da lei. Se for para mudar a lei, façam-se
leis com tais objetivos, ou melhor, os cidadãos brasileiros deveriam ser
consultados sobre o que pensam mediante consultas populares.
Em vez disso, temos uma pletora de atos administrativos ou
outros que interferem na liberdade de cada um. A tutela do Estado chega a tal
ponto que os indivíduos, anestesiados, vêm a considerá-la como moralmente
justificada. Ocorre uma renúncia à liberdade em função de um bem tido por
maior, quando o maior perigo aí reside, a saber, tomar um valor qualquer como
se fosse maior do que ao da liberdade.
O politicamente correto possui, também, consequências
econômicas, atingindo empresas, agricultores, empregos e renda. Pior ainda, o
seu moralismo invade o domínio da economia de mercado, propiciando atos ilícitos,
que se aproveitam, precisamente, de regulamentações abusivas. Ou seja, há toda
uma cultura da transgressão que vem associada à restrição da liberdade de
escolha.
O contrabando, a pirataria e a sonegação de impostos
impactam diretamente os empregos formais, atingindo inteiras cadeias produtivas
e setores econômicos. A ilegalidade cobra o seu preço, embora, muitas vezes, o
cidadão comum nem se dê conta cabalmente do que está fazendo. Compra um
eletrônico falsificado, um cigarro que não segue padrões mínimos de qualidade e
uma bebida que não obedece a critérios básicos de sanidade. A arma que é
proibida para o cidadão é comprada livremente por meliantes e traficantes em
qualquer cidade brasileira. Se os estados forem fronteiriços a alguns países
latino-americanos, tanto mais fácil se armar, fumar, beber ou comprar qualquer
bugiganga.
Para se ter uma ideia da enormidade do problema, 80% dos
óculos são pirateados, 32% dos cigarros são contrabandeados (ocasionando, só
este produto, uma evasão fiscal de R$ 4,5 bilhões em 2014), remédios são
falsificados atentando contra a saúde da população, softwares são livremente
reproduzidos, filmes pirateados e assim por diante. A lista é imensa e, no
entanto, ela não consta de nenhuma agenda política nem econômica. Sempre há uma
“justificativa” e alguém disposto a justificar o injustificável.
O crime advindo do contrabando acarreta prejuízos enormes. A
economia é profundamente afetada. Empregos são perdidos. A diminuição de
impostos cai. Em alguns casos, o efeito chega a ser paradoxal, pois aumenta-se
a tributação formal, tendo como efeito o crescimento da economia informal, com
a consequente redução de impostos. O fumo é um bom exemplo disso.
A ilegalidade cobra o seu preço. Aumentam os atos ilícitos
dos mais diferentes tipos. Drogas são comercializadas livremente, armas são
vendidas e o cidadão comum, aquele que paga efetivamente impostos, fica à mercê
de uma situação que o ultrapassa. Deve contentar-se com os discursos do
politicamente correto, como se assim o país estivesse evoluindo e se tornando
“progressista”. As palavras perdem o seu significado e se tornam objetos de
mera retórica ideológica.
“Argumentos” politicamente corretos parecem não faltar: a
“saúde” dos cidadãos, a sua “condição social”, a sua “segurança”, a sua “baixa
educação” e outros do mesmo tipo. As pessoas parecem não se dar conta de que a
saúde é uma escolha individual, a autodefesa um direito, a condição social algo
que deve ser objeto de investimento e não de acomodação, da mesma maneira que a
educação é — e deveria ser — objeto primeiro de melhoria nacional. Em vez
disso, temos uma acomodação complacente.
Soluções existem. Basta que a blindagem do politicamente
correto seja enfraquecida. O governo não é um fim em si mesmo, mas somente um
instrumento dos cidadãos que deveriam ser reinstituídos de sua capacidade
autônoma de livre decisão. Cabe ao Estado oferecer essas condições. Dentre
elas, poderíamos listar, entre outras, uma política de tributação que equilibre
a oferta e a procura, não propiciando o surgimento mesmo do contrabando.
Setores econômicos com alta tributação podem ser, assim, asfixiados.
Acrescente-se uma política eficaz de controle de fronteiras,
impedindo verdadeiramente o contrabando dos mais diferentes produtos. Se
estados limítrofes como o Paraguai possuem problemas sociais graves que podem
favorecer atividades de contrabando, um investimento brasileiro na formalização
de sua economia e em politicas sociais poderia ser um excelente instrumento. O
mesmo valeria em relação a outros países. Por seu tamanho e importância, o
Brasil está destinado a assumir tal posição. Sua política externa deveria
seguir essa sua vocação.