O governo Dilma acabou. É caso único na história republicana
brasileira. Vitorioso nas urnas, duas semanas depois do pleito já dava sinais
de exaustão. De um lado, a forma como obteve a vitória (usando da calúnia e da
difamação) enfraqueceu a petista; de outro, o péssimo cenário econômico e as
gravíssimas acusações de corrupção emparedaram o governo. Esperava-se que Dilma
aproveitasse os louros da vitória para recompor a base política e organizasse
um ministério sintonizado com o que tinha prometido na campanha eleitoral. Não
foi o que aconteceu. Acabou se sujeitando ao fisiologismo descarado e montou um
ministério medíocre, entre os piores já vistos em Pindorama.
A presidente imaginou (ingenuamente) que a vitória obtida
nas urnas era mérito seu. Pobre Dilma. Especialmente no segundo turno, quem
venceu foi Lula. Sem a participação direta do ex-presidente, ela teria sido
derrotada. Vale sempre lembrar que, em vários comícios da campanha, a candidata
foi “representada” por Lula. Mas ela entendeu que a vitória daria uma espécie
de salvo-conduto para organizar a seu bel-prazer o Ministério e as articulações
políticas com o Congresso Nacional. Ledo engano. Em um mês de governo, já
gastou o crédito dado a qualquer presidente em início de mandato.
Isolada no Palácio do Planalto, a presidente perdeu a
capacidade de iniciativa política. E pior: se cercou de auxiliares ruins,
beirando o pusilânime. Nenhum governo sério pode ter na coordenação política
Aloizio Mercadante. Na primeira presidência Dilma, ele ocupou três ministérios
distintos e não deixou sequer uma simples marca administrativa. Foi um gestor
de soma zero. Lula, espertamente, nunca o designou para nenhuma função
executiva. Conhece profundamente as limitações do ex-senador e sabe o potencial
desagregador do petista. Não satisfeita com a ruinosa escolha, Dilma nomeou
para a coordenação política o inexpressivo e desconhecido Pepe Vargas. Não é a
primeira vez que a presidente mete os pés pelas mãos ao formar sua equipe
política. É inesquecível a dupla Gleisi Hoffmann e Ideli Salvatti, mas naquele
momento a conjuntura política e o cenário econômico eram distintos.
Assolada pelo petrolão — que pode colocar em risco o seu
mandato —, Dilma passou um mês escondida dos brasileiros. Compareceu à posse —
que era o mínimo que se poderia esperar dela —, discursou e sumiu. Reapareceu
na ridícula reunião ministerial, discursou sobre um país imaginário, brigou com
um funcionário e só. Poderia ter aproveitado o tempo para articular a sua base
de sustentação no Congresso. Mas não. Delegou aos auxiliares a atribuição
presidencial. Ela dá a impressão de que não gosta da sua função, que não tem
qualquer prazer no exercício da presidência e que estaria somente cumprindo uma
missão (mas para quem?).
Como seria de se esperar, foi duplamente derrotada na
eleição paras as mesas diretoras da Câmara e do Senado. Na Câmara foi mais que
derrotada, foi humilhada. Seu candidato teve quase que o mesmo número de Júlio
Delgado e metade dos votos do vencedor. Em outras palavras, ficou a sensação de
que o governo tem seguros apenas 25% dos votos dos deputados. Se fosse no final
da gestão, seria ruim mas até compreensível. Porém, a nova presidência mal
começou. Mais da metade dos parlamentares forma uma maioria gelatinosa, sem forma
e que pode a qualquer momento, dependendo da situação política, se voltar
contra Dilma.
No Senado, a vitória com Renan Calheiros pode ter vida
curta. Ainda no ano passado foi revelada uma lista de parlamentares envolvidos
com o doleiro Alberto Yousseff e dela fazia parte o senador por Alagoas. Caso
se confirme, veremos novamente o filme de 2007: ele deverá renunciar à
presidência para, ao menos, garantir o seu mandato. E naquela Casa — agora com
uma participação mais qualificada da oposição — também a maioria dos senadores
vai, primeiro, pensar em garantir o seu futuro político e depois em defender o
governo.
Dessa forma, Dilma corre perigo. Sem uma segura base
parlamentar, tendo, especialmente na Câmara, um presidente que não reza pela
sua cartilha; e com uma pífia coordenação política, poderá ter a curto prazo
sérios problemas. De forma mais direta: vai ter de engolir uma CPI sobre a
Petrobras. E com o que conhecemos até hoje da Operação Lava-Jato, o seu mandato
pode ser abreviado — caso, evidentemente, se confirmem as denúncias envolvendo
a empresa, políticos, empreiteiras e o Palácio do Planalto.
Lula se mantém em silêncio. Estranho, muito estranho. Por
quê? Ele, que sempre falou sobre tudo, mesmo quando não perguntado, agora está
homiziado em São Bernardo do Campo. Medo? Teria vergonha da compra da refinaria
de “Passadilma”? E o projeto mais desastroso da história do Brasil, a refinaria
de “Abreu e Lulla”? Como explicar que tenha custado dez vezes mais do que foi
orçada? Conseguiria responder sobre a amizade com Paulo Roberto Costa, mais
conhecido como “Paulinho do Lula”? O silêncio é uma forma de confissão? Afinal,
foi durante a sua presidência que foram gestados estes escândalos.
Teremos um 2015 agitado, o que é muito bom. Nunca um governo
na História da República esteve tão maculado pela corrupção, nunca. O que o
Brasil quer saber é se a oposição estará à altura da sua tarefa histórica. Se
não cometerá os mesmo erros de 2005, no auge da crise do mensalão, quando não
soube ler a conjuntura e abriu caminho para a consolidação do que o ministro
Celso de Mello, em um dos votos no julgamento do mensalão, chamou de “projeto
criminoso de poder.”