O resultado da eleição em São Paulo confirma: se a economia
brasileira não derrapar feio até lá – e nada indica que isso acontecerá –,
Dilma Rousseff deverá ser reeleita em 2014. Nesse caso, o Brasil será governado
pelo PT por 16 anos, no mínimo. Getúlio Vargas, com ditadura e tudo, só
conseguiu ficar 15 anos seguidos. E não tinha Valério, Delúbio e companhia no
Palácio. A ditadura Vargas era o Estado Novo. A democracia petista é o Estado Velho
– e doente.
Poderia ser pior. Lula e Dilma mantiveram as instituições
funcionando (até aqui), não tentaram nenhuma guinada autoritária explícita (só
as dissimuladas, como o mensalão), cumpriram contratos e não caíram na tentação
dos calotes, como seus parceiros argentinos. Isso não é pouco. Ou melhor: é
pouco, mas é essencial. Pior se o país tivesse caído nas mãos de
franco-atiradores como Brizola, Ciro Gomes e outros inspirados por ideólogos da
salvação, como Roberto Mangabeira Unger.
Em 2000, o PT discutia se valia a pena embarcar na quarta
candidatura presidencial de Lula. O filho do Brasil ainda não tinha nascido.
Quem existia era o bastardo, o perdedor, que a cada quatro anos repetia seu
disco de reclamações contra tudo e era descartado pelo eleitorado. Lula
trabalhara bravamente para desacreditar o Plano Real, que seu partido tentou
sabotar no Congresso Nacional. Depois de sua terceira derrota como
presidenciável, boa parte do PT queria outro candidato em 2002 – o nome do
ex-governador Cristovam Buarque era o mais cotado.
Aí o Brasil foi abalroado pela crise da Rússia, que agravou
a anterior, no Sudeste Asiático. José Dirceu teve a ideia de aparecer com o
projeto Lulinha Paz e Amor. Em lugar do barbudo rancoroso – espécie de João
Pedro Stédile urbano –, Lula apareceria como um conciliador, jogando fora suas
próprias bandeiras de ruptura.
Foi um sucesso. A eleição foi ganha, e o perdedor ranzinza,
que ninguém aguentava mais (nem o próprio PT), virou messias. Com a economia
nacional arrumada e o início de um período sem tormentas externas, os
brasileiros passaram a acreditar que a vida melhorava porque Lula era pobre e
tinha consciência social. O PT ganhou na loteria – e está até hoje
administrando o prêmio.
Prêmio que, vale lembrar, é colossal. O governo popular
bateu seguidamente seus próprios recordes de arrecadação, com uma carga
tributária entre as maiores do mundo. O país gigante deu a Lula e Dilma uma
fortuna para administrar, e eles cumpriram sua missão: gastaram pesado com a
máquina – que emprega os companheiros e os aliados dos companheiros (até
terceiro grau ou onde a vista alcançar). Derramaram as bolsas gratuitas pelo
território inteiro, enriqueceram a floresta de convênios picaretas com os
ministérios (como se viu no Esporte, no Turismo e no Trabalho), que servem para
a manutenção de uma infinidade de boquinhas com altos dividendos eleitorais.
Torraram dinheiro grosso com a propaganda do governo dos coitados.
Esse é o Estado Velho do PT, que o Brasil resolveu
eternizar. Um Estado que não precisa se preocupar em planejar nada, porque o
país não lhe cobra isso. Infraestrutura? A receita é a mesma: usina-dinossauro
de Belo Monte, trem-bala imaginário, e o futuro empurrado com a barriga e o
marketing. Não há ninguém trabalhando para modernizar um dos países mais
burocratizados do mundo, ninguém gastando neurônios com um planejamento
tributário decente, ninguém projetando a organização das metrópoles caóticas –
que dependem do governo federal para os grandes projetos viários, mas que
receberão a Copa do Mundo cheias de remendos e disfarces.
O prefeito eleito Fernando Haddad achou engraçado se dizer o
segundo poste de Lula (Dilma é o primeiro) e perguntar quem será o próximo. Não
há dúvida: haverá um próximo, ou mais de um, para continuar torrando o prêmio
lotérico do messias. O crime é tão perfeito que os postes já estão resolvendo
sair do armário.
A defesa de Dirceu pediu ao STF a redução de sua pena,
considerando o alto “valor social” do réu que combateu a ditadura. Antes de
discutir se esse valor social será cotado em reais ou em dólares, seria o caso
de perguntar ao ex-sequestrado e seus amigos: qual o valor do resgate do Estado
sequestrado por eles?