As impressionantes afirmações do ex-secretário nacional de
Justiça Romeu Tuma Junior sobre a fábrica de dossiês dos petistas contra os
adversários, o assassinato do prefeito Celso Daniel, o mensalão e o passado do
ex-presidente Lula
A Secretaria Nacional de Justiça é um posto estratégico no
organograma de poder em Brasília. Os arquivos do órgão guardam informações
confidenciais de outros países, listas de contas bancárias de investigados e
documentos protegidos por rigorosos acordos internacionais. Cercado por
poderosos interesses, esse universo de informações confere ao seu controlador
acesso aos mais restritos gabinetes de ministros e a responsabilidade sobre
assuntos caros ao próprio presidente da República. Durante três anos, o
delegado de polícia Romeu Tuma Junior conviveu diariamente com as pressões de
comandar essa estrutura, cuja mais delicada tarefa era coordenar as equipes
para rastrear e recuperar no exterior dinheiro desviado por políticos e
empresários corruptos. Pela natureza de suas atividades, Tuma ouviu
confidências e teve contato com alguns dos segredos mais bem guardados do país,
mas também experimentou um outro lado do poder - um lado sem escrúpulos, sem
lei, no qual o governo é usado para proteger os amigos e triturar aqueles que
são considerados inimigos. Entre 2007 e 2010, período em que comandou a
secretaria, o delegado testemunhou o funcionamento desse aparelho clandestino
que usava as engrenagens oficiais do Estado paia fustigar os adversários.
As revelações de Tuma sobre esse lado escuro do governo
estão reunidas no livro Assassinato de Reputações - Um Crime de Estado
(Topbooks: 557 páginas; 69,90 reais), que chega às livrarias nesta semana.
Lançado no momento em que o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, enfrenta
acusações de ter usado a estrutura da pasta para vazar detalhes de uma
investigação que comprometeria líderes da oposição, o livro mostra que esse
procedimento, mais que uma coincidência, é um método dos petistas para
perseguir e difamar desafetos do governo. Segundo o ex-secretário, a máquina de
moer reputações seguia um padrão. O Ministério da Justiça recebia um documento
apócrifo, um dossiê ou um informe qualquer sobre a existência de conta secreta
no exterior em nome do inimigo a ser destruído. A ordem era abrir imediatamente
uma investigação oficial. Depois, alguém dava uma dica sobre o caso a um
jornalista. A divulgação se encarregava de cumprir o resto da missão. Instado a
se explicar, o ministério confirmava que, de fato, a investigação existia, mas
dizia que ela era sigilosa e ele não poderia fornecer os detalhes. O “investigado”,
é claro, negava tudo. Em situações assim, culpados e inocentes sempre agem da
mesma forma. O estrago, porém, já estará feito.
No livro, o autor apresenta documentos inéditos de alguns
casos emblemáticos desse modus operandi que ele reuniu para comprovar a
existência de uma “fábrica de dossiês” no coração do Ministério da Justiça. Uma
das primeiras vítimas dessa engrenagem foi o governador de Goiás. Marconi
Perillo (PSDB). Senador à época dos fatos, Perillo entrou na mira do petismo
quando revelou à imprensa que tinha avisado Lula da existência do mensalão. O
autor conta que em 2010 o então ministro da Justiça Luiz Paulo Barreto entregou
em suas mãos um dossiê apócrifo sobre contas no exterior do tucano. As ordens
eram expressas: Tuma deveria abrir uma investigação formal. O trabalho contra
Perillo, revela o autor, havia sido encomendado por Gilberto Carvalho, então
chefe de gabinete do presidente Lula. Contrariado, Tuma Junior refutou a “missão”
e ainda denunciou o caso ao Senado. Esse ato, diz o livro, foi o primeiro passo
do autor para o cadafalso no governo, mas não impediu novas investidas. A
fábrica de dossiês voltou então a sua artilharia contra o então senador Tasso
Jereissati (PSDB), severo opositor de Lula no Congresso. A fórmula era a mesma.
Tuma Junior relata que foi chamado ao Congresso para uma conversa com o então
senador Aloizio Mercadante (PT). No encontro, recebeu dele um pen drive e um
pedido para que investigasse Jereissati. O autor abriu o dispositivo e
constatou que se tratava de outro dossiê apócrifo. O livro conta que até o
Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional
(DRCI), também chefiado por Tuma Junior, chegou a ser usado clandestinamente na
tentativa de obter informações desabonadoras sobre despesas sigilosas da
ex-primeira-dama Ruth Cardoso.
Assassinato de Reputações é um livro cujas revelações não
podem simplesmente ser varridas para debaixo do tapete. Seu autor afirma
relatar apenas fatos e situações vividas por ele próprio. E é rigoroso. Não se
vale de depoimentos de terceiros nem passa adiante boatos ou insinuações. “Eu
conto aquilo que vi”, disse Tuma Junior a VEJA. Ele viu muita coisa. Seu livro
traz documentos que deixam o governo Lula em péssima luz. Alguns deles mostram
que o governo agiu para engavetar uma investigação que identificara uma suposta
conta do mensalâo no exterior. O ex-secretário revela que todos os ministros do
Supremo tribunal Federal foram grampeados ilegalmente pela Polícia Federal e
pela Abin em 2007. Um dos capítulos é dedicado ao ainda misterioso assassinato
do prefeito petista Celso Daniel, em 2002. Tuma Junior reproduz um diálogo
entre ele e Gilberto Carvalho no qual o ministro confessa que entregava o
dinheiro desviado da prefeitura de Santo André nas mãos do mensaleiro José
Dirceu. O autor se convenceu de que Celso Daniel foi mono em uma operação de
queima de arquivo.
Idealizado inicialmente para desconstruir a campanha de
difamação de que o autor foi vítima (Tuma foi demitido do governo sob a
acusação de manter relações com contrabandistas), o livro, escrito em parceria
com o jornalista Cláudio Tognolli, professor de duas universidades em São
Paulo, pescou mais fundo das memórias do autor: “Entrevistei Tuma Junior seis
dias por semana durante dois anos. Ele queria uma obra baseada na revelação de
fatos, queria que a publicação do livro o levasse ao Congresso para depor nas
comissões, onde ele poderia mostrar documentos que não tiveram lugar no livro
na sua inteireza”. Fica a sugestão.
“HAVIA UMA FÁBRICA DE DOSSIÊS NO GOVERNO”
Por que Assassinato de Reputações?
Durante todo o tempo em que estive na Secretaria Nacional de
Justiça, recebi ordens para produzir e esquentar dossiês contra uma lista
inteira de adversários do governo. O PT do Lula age assim. Persegue seus
inimigos da maneira mais sórdida. Mas sempre me recusei. Tentaram me usar para
esquentar um dossiê contra o governador de Goiás, Marconi Perillo, só porque
ele avisou o Lula da existência do mensalão. Depois, quiseram incriminar o
ex-senador Tasso Jereissati servindo-se do meu departamento para forjar uma
investigação sobre contas no exterior. Havia uma fábrica de dossiês no governo.
Sempre refutei essa prática e mandei apurar a origem de todos os dossiês
fajutos que chegaram até mim. Por causa disso, virei vítima dessa mesma máquina
de difamação. Assassinaram minha reputação. Mas eu sempre digo: não se vira uma
página em branco na vida. Meu bem mais valioso é a minha honra.
De onde vinham as ordens para atacar os adversários do PT?
Do Palácio do Planalto, da Casa Civil, do próprio Ministério
da Justiça... No livro, conto tudo isso em detalhes, com nomes, datas e
documentos. Recebi dossiês de parlamentares, de ministros e assessores petistas
que hoje são figuras importantes no atual governo. Conto isso para revelar o
motivo de terem me tirado da função, por meio de ataque cerrado à minha
reputação, o que foi feito de forma sórdida.Tudo apenas porque não concordei
com o modus operandi petista e mandei apurar o que de irregular e ilegal
encontrei.
O senhor queria denunciar a fábrica de dossiês do PT ou
atingir o próprio partido quando escreveu o livro?
Tem muita gente do PT que eu respeito. Não escrevi este
livro para atacar o PT.O maior problema do PT está nas facções do partido.
Muitas vezes por disputas internas é que surgem os dossiês. As disputas são
legítimas, mas fazer dossiê é incompatível com qualquer prática republicana.
Levantar falso testemunho contra alguém é uma prática violenta que enoja. O
pior é que as coisas continuam exatamente iguais. Se você trocar os personagens
do livro, vai ver que os fatos continuam ocorrendo da mesma forma. É só olhar o
que está acontecendo com o Cade nesse escândalo do metrô de São Paulo.
O Cade era um dos instrumentos da fábrica de dossiês?
Conto isso no livro em detalhes. Desde 2008, o PT queria que
eu vazasse os documentos enviados pela Suíça para atingir os tucanos na eleição
municipal. O ministro da Justiça, Tarso Genro, me pressionava pessoalmente para
deixar isso vazar para a imprensa. Deputados petistas também queriam ver os
dados na mídia. Não dei os nomes no livro porque quero ver se eles vão ter
coragem de negar.
O senhor é afirmativo quando fala do caso Celso Daniel. Diz
que militantes do partido estão envolvidos no crime.
Aquilo foi um crime de encomenda. Não tenho nenhuma dúvida.
Os empresários que pagavam propina ao PT em Santo André não queriam matar, mas
assumiram claramente esse risco. Era para ser um sequestro, mas virou
homicídio.
Por que o senhor sabe tanto sobre a morte de Celso Daniel?
Eu era o delegado da área onde o crime aconteceu. Fui o
primeiro a chegar ao local quando o corpo foi encontrado. Tanto que fui eu que
reconheci oficialmente que era o Celso Daniel e mandei abrir a investigação
para apurar a morte. Só que, naquela época, nem o PSDB nem o PT quiseram
prolongar o caso por causa das eleições. Fui afastado das investigações, mas
apurei tudo. Eu encontrei o carro e fotografei os cabelos que, depois, os
peritos disseram que eram pelos de cachorro. Mas eu sei que não eram. Só que
nunca quiseram apurar a fundo. Ponho no livro o que descobri e não foi
considerado.
O ministro Gilberto Carvalho disse ao senhor que havia um
esquema de cobrança de propina na prefeitura?
Foi num momento de emoção, quando eu estava sob fogo cruzado
na imprensa e fui falar com o Gilberto Carvalho. Desabafei, chorei e ele
começou a chorar comigo. Aí ele falou: “Veja, Tuma, quanto fui injustiçado no
caso Celso Daniel. Quando saiu aquela história de que havia desvios na
prefeitura, eu, na maior boa-fé, procurei a família dele para levar um
conforto. Fui dizer que o Celso nunca desviou um centavo para o bolso dele, e
que todo recurso que arrecadávamos eu levava para o Zé Dirceu, pois era para
ajudar o partido nas eleições”. Fiquei paralisado quando isso aconteceu. Pensei
comigo: estou ouvindo uma confissão mesmo?
Com que convicção o senhor afirma que todos os ministros do
STF foram grampeados?
Minha convicção está em tudo o que vivi e descobri
conversando com alguns personagens dentro do governo na época. Eu não tenho
dúvida de que os ministros foram grampeados. Se isso for investigado a fundo,
com seriedade, será provado facilmente.
O senhor também diz no livro que descobriu a conta do
mensalão no exterior.
Eu descobri a conta do mensalão nas Ilhas Cayman, mas o
governo e a Polícia Federal não quiseram investigar. Quando entrei no DRCI,
encontrei engavetado um pedido de cooperação internacional do governo
brasileiro às Ilhas Cayman para apurar a existência de uma conta do José Dirceu
no Caribe. Nesse pedido, o governo solicitava informações sobre a conta não
para investigar o mensalão, mas para provar que o Dirceu tinha sido vítima de
calúnia, porque a VEJA tinha publicado uma lista do Daniel Dantas com contas
dos petistas no exterior. O que o governo não esperava é que Cayman respondesse
confirmando a possibilidade de existência da conta. Quer dizer: a autoridade de
Cayman fala que está disposta a cooperar e aí o governo brasileiro recua? É um
absurdo.
Quem engavetou a investigação?
Eu levei o processo para o Tarso Genro e disse: olha, tem de
apurar isso. Mas, quando veio essa resposta de Cayman, os caras pararam tudo.
Isso foi para a gaveta da Polícia Federal e do ministro Tarso Genro. Estou
esperando até hoje o retorno. Eu tenho certeza de que era a conta do mensalão.
Eu publico no livro o documento para dizer isto: o governo não deixou investigar
isso em 2007.
No livro, o senhor escreve que um dos réus confirmou que
essa era a conta do mensalão.
Não posso revelar o nome, mas, quando ele soube, disse-me: “Você
matou na mosca. Ainda bem que você não estava investigando isso”. Seis meses
depois da minha demissão, esse personagem me disse que eu tinha caído por
mandar investigar a conta do mensalão, a conta que pagava as viagens para
Portugal. Eu falei para ele: os caras vão mandar me matar.
Como surgiu a ideia de fazer o livro?
Quando a imprensa publicou todos aqueles fatos inverídicos
sobre o meu envolvimento com uma suposta máfia chinesa, busquei toda as
instâncias para me defender, mas não consegui contar a minha versão. Fui
defenestrado do governo por fatos baseados numa investigação arquivada na qual
eu não tinha sido denunciado nem processado. Quando aconteceu tudo aquilo
comigo na Secretaria Nacional de Justiça, percebi que não teria espaço para me
defender em nenhuma instância, muito menos no governo ou na própria Justiça.
Conversando com dois jornalistas, meus conhecidos e amigos, resolvi escrever o
livro para contar a minha história sobre os fatos que vi em três anos de
governo, para explicar por que isso aconteceu comigo, por que tentaram me
defenestrar, por que acabaram tentando assassinar a minha reputação.
É uma espécie de vingança pessoal?
De forma alguma. Quem ler o livro vai perceber que o que
escrevo são fatos. Eu precisava explicar por que cheguei ao governo, por que
havia a confiança do presidente Lula em mim. Só dá para fazer isso contando as
histórias que vivi com as pessoas, os fatos, e como a minha reputação foi
construída para depois ser destruída. O livro é uma prestação de contas às
pessoas que me querem bem, que sempre me honraram com sua confiança. É a forma
que encontrei de tornar pública a minha história para aqueles que têm o
interesse de conhecer esse retrato da minha vida profissional. Para que eles
possam compreender o motivo pelo qual virei alvo do governo do PT.
As pessoas podem interpretar como vingança ou ressentimento,
não?
É lógico que tem a mágoa. Eu vi meu pai, o senador Romeu
Tuma, morrer por causa do que fizeram comigo no governo. Mas isso é diferente
de vingança. Eu descrevo fatos no livro, conto a minha história, exponho a
minha vida e até corro riscos. Vingança não se faz assim. Eu não seria burro de
praticar uma vingança dessa forma. As colocações podem ser fortes, mas é o meu
jeito. Não tem nada ali que seja leviandade. São fatos verdadeiros.
Por que o senhor decidiu fazer essas revelações só agora?
De tudo que vivi em três anos de governo, não há nada
relatado no livro que eu não tenha denunciado imediatamente aos órgãos
adequados. O livro só vai ser publicado agora porque demorei a escrever e porque
precisei me aposentar da carreira de Estado para ter liberdade de tornar
públicos os fatos sem ser acusado de oportunismo político ou eleitoral. Eu sei
que neste momento vão querer me atacar, dizer que estou a serviço de interesses
escusos. Mas não sou de me prestar a servir ninguém. Quem me conhece sabe que
falo o que penso e presto contas do que faço.
O senhor afirma no livro que o ex-presidente Lula foi
informante da ditadura. É uma acusação muito grave.
Não considero uma acusação. Quero deixar isso bem claro. O
que conto no livro é o que vivi no Dops. Eu era investigador subordinado ao meu
pai e vivi tudo isso. Eu e o Lula vivemos juntos esse momento. Ninguém me
contou. Eu vi o Lula dormir no sofá da sala do meu pai. Presenciei tudo. Conto
esses fatos agora até para demonstrar que a confiança que o presidente tinha em
mim no governo, quando me nomeou secretário nacional de Justiça, não vinha do
nada. Era de muito tempo. O Lula era informante do meu pai no Dops (veja o
quadro ao lado).
O senhor tem provas disso?
Não excluo a possibilidade de algum relatório do Dops da
época registrar informações atribuídas a um certo informante de codinome Barba.
Era esse o codinome dele. Os relatos do Lula motivaram inúmeras operações e
fundamentaram vários relatórios de inteligência para evitar confusões maiores
com os movimentos na época. Ademais, o livro por si só é uma prova. Existe na
área policial prova documental e prova testemunhal. Eu sou uma testemunha viva.
Não tem nada contado no livro que eu não tenha vivido. Ninguém me contou
aquilo. Eu vivi e agora estou relatando. E digo mais: como informante do meu
pai no Dops, o Lula prestou um grande serviço naquele período. Eu quero deixar
isso muito claro. Graças às informações que o Lula prestava ao meu pai, muitos
relatórios foram produzidos, muitas operações foram realizadas.
Uma afirmação dessas certamente vai gerar protestos e
processos.
É uma forma de interpretação, mas eu não acho. Acho que o Lula prestou um grande serviço ao país. Por se portar dessa forma, ele chegou aonde chegou. Sabe essa violência nas manifestações de hoje com black blocs? Se fosse no tempo do Dops com o Lula, não se criava. O Lula combinava tudo com o Tumão (Romeu Tuma, ex-chefe do Dops e ex-senador). Quando fazia as manifestações dos metalúrgicos, era tudo tranquilo. O Lula conseguia manter a manifestação sob o controle dele.
É uma forma de interpretação, mas eu não acho. Acho que o Lula prestou um grande serviço ao país. Por se portar dessa forma, ele chegou aonde chegou. Sabe essa violência nas manifestações de hoje com black blocs? Se fosse no tempo do Dops com o Lula, não se criava. O Lula combinava tudo com o Tumão (Romeu Tuma, ex-chefe do Dops e ex-senador). Quando fazia as manifestações dos metalúrgicos, era tudo tranquilo. O Lula conseguia manter a manifestação sob o controle dele.
Além do senhor e do próprio Lula, quem mais sabe dessa
história?
Meu pai está morto. Então, só eu e ele. Talvez alguma pessoa próxima a ele saiba. Digo e repito isso em público, pessoalmente e até no Estádio do Pacaembu. Quero que o Lula se sente na minha frente e diga que é mentira. Tenho fotos com ele desde a época do Dops. Ele e o meu pai tinham uma relação muito sigilosa. Se isso vazasse, os dois estariam mortos.
Meu pai está morto. Então, só eu e ele. Talvez alguma pessoa próxima a ele saiba. Digo e repito isso em público, pessoalmente e até no Estádio do Pacaembu. Quero que o Lula se sente na minha frente e diga que é mentira. Tenho fotos com ele desde a época do Dops. Ele e o meu pai tinham uma relação muito sigilosa. Se isso vazasse, os dois estariam mortos.
O CARTEL DOS TRENS
“Desde 2008 o PT queria que eu vazasse isso para atingir os
tucanos na eleição municipal, e eu me negava por dois motivos: primeiro, por
discordar do modus operandi; e, segundo, porque eu dizia que se aquilo vazasse
nunca se chegaria ao final da investigação, à verdade dos fatos e a todos os
envolvidos. O tempo mostrou que eu tinha razão, mas o PT nunca desistiu da
tática. O ministro da Justiça, Tarso Genro, estava me pressionando
pessoalmente, vinha à minha orelha como um grilo falante. Aliás, vinham também
os deputados petistas, esperneantes, e com noções jurídicas e éticas muito
vagas, estrilando que era para deixar sair essa história toda na mídia.”
RUTH CARDOSO
“O PT usava o meu laboratório para fazer dossiês. A
ex-ministra Erenice Guerra foi inocentada, em 2012, desse tipo de acusação. Mas
eu sustento, com o nome que herdei do meu pai: havia, sim, uma fábrica de
dossiês em via de ser normatizada, que inviabilizei com a mudança do
laboratório para a estrutura da secretaria. Estavam usando o meu laboratório
para fazer um dossiê contra a finada Ruth Cardoso, mulher do ex-presidente FHC,
e obviamente contra o governo de seu marido.”
DOSSIÊ TASSO JEREISSATI
“Em janeiro de 2009, fui chamado à liderança do governo no
Senado, onde encontrei o senador Aloizio Mercadante e um deputado federal, para
tratar de projeto de interesse do governo e do ministério. Lá me entregaram um
pen drive com “seriíssimas denúncias” contra um adversário do governo. Pensei: “Outro
dossiê para destruir um novo “alvo” do governo”. Dessa feita, o alvo era o
ex-governador do Ceará Tasso Jereissati, naquele momento um dos senadores
líderes da oposição. A exigência era que eu plantasse uma investigação em cima
do Jereissati. Disseram-me que naquele pen drive havia um dossiê”.
FULMINE O PERILLO
“Um dos mais escandalosos pedidos para fulminar alguém me
foi feito pelo ex-ministro da Justiça Luiz Paulo Barreto. Um dia, ele me chamou
ao seu gabinete e. um tanto lívido, disse: “Isso aqui veio de cima, lá do
Planalto, do Gilberto Carvalho, secretário particular do presidente Lula. Ele
quer que você atenda a um pedido do Lula e mande para o DRCI investigar isso
aqui”. O “isso aqui” do ministro da Justiça era um envelope numa pastinha que
ele me entregou, com um dossiê contra Marconi Perillo.”
GRAMPO STF
“Segue a verdade do caso: não só Gilmar Mendes foi grampeado
como também todos os outros ministros do STF. O grampo foi feito com uma maleta
francesa, empregada para rastrear celulares em presídios.
Todos os ministros do Supremo foram monitorados, quer
através de escuta dos telefones móveis com a utilização da maleta móvel, quer
por via da implantação física, em seus computadores, de aparelhos de escuta ambiental.Todo
o aparato foi tocado com a participação de arapongas, que prestavam serviços de
segurança e limpeza aos próprios gabinetes dos ministros e estavam vinculados
aos agentes que operavam a Satiagraha.”
MENSALÂO
“Em maio de 2006, VEJA publicou que José Dirceu, entre
outros, teria conta em paraíso fiscal das Ilhas Cayman. Eu, como secretário
Nacional de Justiça, já investigava casos engavetados, relativos ao
Opportunity. Mas, nesse esforço, recebo um retorno diverso: Daniel Dantas
aparecia como denunciante, e não como réu. Embora tivesse cargo executivo no
governo petista, eu suspeitava da existência de tal conta. E mais: que essa
conta era a lavanderia do mensalão no exterior. (...) Mandei cópia para o
ministro Tarso Genro apurar isso, e espero a resposta até hoje... Será que fui
defenestrado por ter chegado à conta caribenha do mensalâo?”
O CASO CELSO DANIEL
“‘Ministro, vou dizer ao senhor o que aconteceu no caso
Celso Daniel até onde pude apurar. A priori, seus amigos de Santo André não
queriam matá-lo, mas assumiram claramente esse risco. Planejaram e mandaram
executar o sequestro de Celso Daniel para lhe dar um susto. Sentiram-se
ameaçados pela voracidade do partido.’ O todo-poderoso Gilberto Carvalho começa
a chorar junto comigo, sua voz trôpega atropela minha fala e as próprias
sílabas: ‘Eu te entendo. Veja, Tuma, quanto fui injustiçado no caso Celso
Daniel. Não aceito essa injustiça até hoje. Imagina você que eu era o
braço-direito do Celso, seu homem de confiança. Quando saiu aquela história de
que havia desvios na prefeitura, eu, na maior boa-fé, procurei a família dele
para levar um conforto. Fui dizer a eles que o Celso nunca desviou um centavo
para o bolso dele, e que todo o recurso que arrecadávamos eu levava para o Zé
Dirceu, pois era para ajudar o partido nas eleições’.”
Informações úteis
O sindicalismo de resultados de Lula desembocou no
pragmatismo político que o levou à Presidência da República e na
governabilidade pela compra de apoio no Congresso com o uso de diversos tipos
de moeda. A tilintante resultou na condenação e prisão de seu ministro-chefe da
Casa Civil, do presidente e do tesoureiro de seu partido, o PT, que cumprem
pena pelo escândalo do mensalão na penitenciária da Papuda, em Brasília. Lula
escapou do mesmo destino por conveniência dos políticos de oposição e pelo
silêncio, entre outros, de José Dirceu e do publicitário Marcos Valério, cujas
visitas à Granja do Torto, embora registradas na agenda presidencial, ainda não
vieram a público. O uso de outras moedas, por exemplo o relativismo moral que
deu sobrevida a inimigos históricos que ele chamava de corruptos, como Paulo
Maluf e José Sarney, teve um custo menor - pequenas retiradas do imenso tesouro
de popularidade de Lula. Mesmo sabendo que Lula subordina a seus objetivos
todas as demais considerações, são de estarrecer, se tomadas pelo valor de
face, as afirmações de Romeu Tuma Junior, ex-secretário nacional de Justiça.
Tuminha diz que Lula foi informante do Dops, órgão que seu pai, Romeu Tuma,
dirigia em São Paulo e no qual ele próprio trabalhava. Importante: ele não acusa
Lula de ter traído sua causa ou seus companheiros. Diz que Lula dava
informações que ajudavam a evitar choques violentos com a polícia. Isso é
prática comum hoje e, como diz Tuminha, se os black blocs fizessem o que Lula
fez, haveria menos violência. Seria de alto interesse histórico um encontro
público entre Lula e Tuminha para compararem as lembranças pessoais que cada um
tem daqueles tempos duros.