O tempo e a decadência, com a mudança da capital, fizeram
com que os políticos se voltassem, sensatamente, para os problemas locais.
Surge uma nova geração focada nas questões do nosso cotidiano. O ideal seria
que se formasse aqui gente com visão nacional e, ao mesmo tempo, capaz de agir
localmente. As peripécias de nossa história nos levaram a longos períodos de
dominação, ora populista ora de um grupo orientado para o enriquecimento
pessoal.
Tantas voltas demos que estamos num segundo turno entre a
continuidade de um governo marcada por escândalos e um candidato que associa
política e religião de uma forma que me assusta. Respeito a religiosidade em
todos os seus níveis, mas o partido ligado à Igreja Universal chegar ao governo
é inquietante.
Todas aquelas luzes que contemplei quando menino, todo
aquele investimento emocional na metrópole dos sonhos desdobra-se hoje na
possibilidade de ser governado por um núcleo religioso que também é um núcleos
de negócios.
Na disputa proporcional, a votação de Jair Bolsonaro e Jean
Wyllys indica que a questão dos direitos gays está na ordem do dia. Se
consideramos os números, vemos uma nítida vantagem de Bolsonaro. Será que
determinadas táticas não o estão fortalecendo?
Conheço Bolsonaro há muito tempo. No primeiro mandato, ele
fazia discursos pedindo minha prisão, porque fui sequestrador. Um dia disse
para a ele: “Antes de ir para a tribuna pedir minha prisão, avisa, pois eles
podem te levar a sério, e isso me dá alguns minutos de vantagem para a fuga”.
Nunca mais pediu minha prisão, e convivemos, pacificamente,
na Câmara. Bolsonaro tem se movido com desenvoltura na sua cruzada. Ele capta
as oportunidades no ar, argumenta pesadamente e, às vezes, briga com a própria
imprensa. Bolsonaro vislumbrou esse caminho, assim como o pastor Marcos Feliciano,
e o percorre sabendo que sairá com mais votos de cada episódio. Isto significa
que os direitos dos gays devem ser congelados, para que Bolsonaro e Feliciano
não cresçam? Sugiro apenas que se reveja a tática, procure-se um terreno mais
seguro, ampliem-se as alianças.
Uma vez que o tema tem tanta importância na votação dos
deputados no Rio, não custa nada lembrar que vale para o movimento gay o
aprendizado de todas as lutas minoritárias de que participei: por mais justa
que seja a causa, é preciso a forma hábil de conduzi-la. O confronto direto com
Bolsonaro e Marcos Feliciano é tudo o que eles querem. Bolsonaro está pensando
até em ser presidente da República, com a ajuda, é claro, dos seus próprios
adversários.
Para o Senado, o Rio escolheu Romário. O ideal seria um
senador do passado, que pensasse no Rio mas também questionasse a política
externa tão equivocada do governo. Mas as circunstâncias colocaram em cena um
craque do futebol brasileiro e Cesar Maia, que combina uma visão de mundo com
uma compreensão local. No entanto, já está muito desgastado para aspirar, no
momento, a um cargo majoritário. Já que Romário foi eleito por grande maioria,
o ideal seria, ao invés de insistir no seu despreparo, colaborar para que
enfrente bem nossos problemas.
Dois milhões de pessoas não votaram no Rio. Juntas
representam mais que o segundo colocado. O mesmo se passou no Brasil: 38
milhões de ausentes, votos nulos ou brancos. Grande parte do país rejeitou o
processo eleitoral. Não temos outro caminho exceto votar bem, recolher os cacos
ao fim de cada eleição, e sonhar com o dia em que essa Argentina, em termos
numéricos, volte a se integrar ao Brasil, uma vez que a perdemos nas sucessivas
eleições do curto período democrático.
Um tema central para isso é a recuperação da credibilidade.
Não creio que os políticos possam se transfigurar com uma vitória da oposição.
Nem que venham a ser amados num futuro próximo.
Parte da degradação política brasileira vem do próprio Planalto, dos métodos de conquista do Congresso pelo Mensalão, pela drenagem contínua dos recursos da Petrobras, pela ocupação da máquina do Estado e pela tolerância com a corrupção em tantos níveis. Ventos novos soprando de Brasília podem dar em nossas praias. Depois de tanto inspirar o país, o Rio pode receber uma inspiração nacional. É a esperança que resta no horizonte.
Parte da degradação política brasileira vem do próprio Planalto, dos métodos de conquista do Congresso pelo Mensalão, pela drenagem contínua dos recursos da Petrobras, pela ocupação da máquina do Estado e pela tolerância com a corrupção em tantos níveis. Ventos novos soprando de Brasília podem dar em nossas praias. Depois de tanto inspirar o país, o Rio pode receber uma inspiração nacional. É a esperança que resta no horizonte.