A disputa pelo poder não é brincadeira de crianças. Os
personagens que se envolvem nela querem, a todo custo, alcançar seus objetivos
de domínio e, para isso, não medem esforços e não se limitam por qualquer rigor
ético na consecução de seus planos. Os outros, aqueles que apenas observam tudo
de fora, ingênuos que são, analisam as coisas apenas pela formalidade da lei ou
pelos objetivos declarados pelos políticos. Dessa forma, não conseguem perceber
a movimentação sorrateira que acontece, normalmente sem pressa, com o intuito
de tomar as mais altas instâncias da nação de assalto. Quando esses objetivos
ficam claros, muitas vezes já é tarde e resta apenas o lamento e a murmuração.
É preciso sempre considerar que quando há grupos encrustados
nos escalões do poder de um país que, sabidamente, pretendem implantar uma
ditadura, todo cuidado é pouco, até mesmo com as linhas normativas que pareçam
mais irrelevantes, das leis que aparentam ser mais sem importância. Pois foi
assim que, em uma norma que trata meramente de organização de ministérios, que
abriu-se o caminho para, mais tarde, quando parecesse propício para os grupos
ideológicos envolvidos no governo, usar dela para desferir sobre a nação um
golpe dos mais sujos e malignos que se tem notícia na história dos países
democráticos.
Na Lei Federal 10.683 de 2003 fora dada à Secretaria-Geral
da Presidência da República a incumbência de articular as relações entre a
sociedade civil e o gabinete do governo federal. Nada de mais, em princípio.
Porém, quando a sede pelo domínio é grande, qualquer brecha pode ser vista como
uma chance de implementar os sonhos totalitários mais alucinantes. E foi assim
que a Presidente da República fez ao promulgar o Decreto 8.243/14. Lançando mão
de uma sutil abertura, dada por uma lei de mais de 10 anos antes, tenta impor
sobre o país uma forma de governo que, se colocada em prática, apesar de se
apresentar com a desculpa de ampliar as instâncias democráticas, na verdade as
solapará de vez.
Por este decreto, a presidente criou um sistema de
participação civil nos órgãos e entidades da administração pública federal que
coloca nas mãos das ONG’s e representantes das minorias organizadas a direção a
ser dada a todas as esferas da administração do país. Isso significa, nada
menos, que serão os grupos organizados, quase todos em consonância ideológica
com o atual staff no poder, quando não submetidos diretamente a ele, que
definirão os rumos da administração federal. Melhor dizendo, serão os
movimentos organizados de orientação esquerdista que passarão a mandar na
máquina pública brasileira.
Alguém ainda tem dúvida disso? Veja como o próprio decreto
se refere aos pretensos representantes da sociedade: movimentos sociais, redes
e organizações. Ora, são esses que representam a sociedade civil? São eles, por
acaso, que falam em nome do cidadão ordinário (ops! essa palavra também está
proibida no Brasil), aquele que trabalha todo dia e não tem tempo para ficar
fungando no cangote do governo? O homem comum não participa de movimento social
algum, pois não tem sequer tempo para isso. Movimentos sociais (como já eram
conhecidos os sovietes na URSS), existem, simplesmente, para tornar a obra de
socialização do país mais fácil.
Serão, sim, essas pessoas, que há anos ficam babando em
volta das delícias da mesa do planalto, que, na prática, terão participação
efetiva nas entidades federais. Isso porque o cidadão comum, por seu lado
preocupado com os problemas imediatos do seu cotidiano, sem organização e sem
financiadores, simplesmente ficará observando os representantes das minorias
forjadas mandar e desmandar em todos os nível da administração federal.
E analisando bem, esse decreto, além de uma monstruosidade
ética, é também uma aberração jurídica!
Para quem não sabe, um decreto existe ou para a execução
atos específicos, como uma despropriação, por exemplo, ou para regulamentar
leis. No caso presente, ele vem com a desculpa que está regulamentando uma lei,
porém, de fato, apenas a está usando como pretexto para obrigar o país a
engolir uma forma de governo que obedece aos desejos de uma turma que sonha com
um Brasil cada vez mais vermelho. Diante disso, fica evidente que o decreto
citado é uma mentira, pois a lei 10.683/03 não requer esse tipo de
regulamentação. Ela apenas afirma que a Secretaria-Geral tem como atribuição
“costurar” as relações entre a sociedade civil e o governo. O Decreto, por seu
lado, cria a forma de participação da sociedade civil no governo, o que extrapola
em muito o que está na lei. Apenas por isso, ele já pode ser considerado
ilegal. Se o decreto presidencial quisesse regulamentar a lei de 2003, deveria
tratar sobre o trabalho da Secretaria-Geral da Presidência, não da participação
civil na administração pública. Se faz assim, é porque é uma norma canalha
mesmo, que aposta na desatenção e na ignorância das pessoas para espalhar seus
efeitos.
Mas ele contém outro problema jurídico sério: mesmo sendo um
decreto, que tem como principal função regulamentar, não faz isso de maneira
satisfatória, pois, apesar de prever a participação dos grupos representativos
da sociedade civil, não determina quem são esses grupos, como serão eleitos,
como serão conduzidos à participação e o que farão exatamente. Nada disso o
decreto prevê, tornando-o, portanto, como norma regulamentadora, inútil. Isso
significa que ele, na verdade, precisaria de outras regulamentações que
explicassem melhor como essas situações seriam resolvidas. Então, uma nova
forma de ato administrativo seria necessário ser criada: o decreto do decreto,
a regulamentação de um ato regulamentador.
Porém, permanecendo como está, se não for derrubado como ato
ilegal, o decreto presidencial abrirá as portas para que os movimentos
organizados invadam o governo federal a seu bel-prazer, sem regras, sem
barreiras, mas conforme o conluio com os governantes lhes permitir.
Na verdade, esse ato da Presidência da República é um
cancro, um tumor inserido no seio da nação, com o objetivo único de destruir
suas células já enfraquecidas, levando-a até a morte. O que virá depois disso,
eles sabem muito bem e desejam com todas suas forças.